Questão 28: Dos efeitos do amor.
Em
seguida devemos tratar dos efeitos do amor. E sobre esta questão seis artigos
se discutem:
Art.
1 ― Se a união é efeito do amor.
Art.
2 ― Se o amor causa a mútua inerência, i. é, se faz com que o amante esteja no
amado e reciprocamente.
Art.
3 ― Se o êxtase é um efeito do amor.
Art.
4 ― Se o zelo é efeito do amor.
Art.
5 – Se o amor é paixão lesiva.
Art.
6 ― Se o amante faz tudo por amor.
Art. 1 ― Se a união é
efeito do amor.
(I, q. 20, a . 1, ad 3, supra,
q. 25, a . 2, ad 2, III Sent., dist. XXVII, q. 1, a . 1, De
Div. Nom., cap. IV, lect. XII).
O
primeiro discute-se assim. ― Parece que a união não é efeito do amor.
1. ― Pois, a ausência repugna à união. Ora, o amor é compatível com a ausência, conforme o amor é compatível com a ausência, conforme se vê no Apóstolo (Gl 4, 18): Sede pois zelosos do bem sempre, referindo-se a si mesmo, como explica a Glosa, e não só quando eu estou presente convosco. Logo, a união não é um efeito do amor.
2.
Demais. ― Toda união ou é essencial, como quando a forma se une à matéria, o
acidente ao sujeito, à parte ao todo ou a outra parte para constituir o todo,
ou é em virtude de uma semelhança genérica, específica ou acidental. Ora, o
amor não causa a união essencial, de contrário nunca haveria amor por coisas
divididas na essência. Mas também não causa a união baseada na semelhança,
antes, é por esta causado, como já se disse 1. Logo, a união não é
efeito do amor.
3.
Demais. ― O sentido em acto torna-se o sensível em acto e o intelecto em acto
torna-se o objecto inteligido em acto. Ora, o amante em acto não se torna o objecto
amado em acto. Logo, a união é mais efeito do conhecimento que do amor.
Mas,
em contrário, diz Dionísio, que qualquer amor é uma virtude unitiva 2.
É dupla forma a união do amante com o amado. Uma real, quando este está
presencialmente naquele, outra porém pelo afecto. E esta deve ser considerada
relativamente à apreensão precedente, pois o movimento apetitivo é consequente
à apreensão. Ora, sendo o amor de duas espécies ― o de concupiscência e o de
amizade, um e outro procede de uma certa apreensão de unidade entre o amado e o
amante. Pois quem ama alguma coisa, quase desejando-a, apreende-a como
necessário ao seu bem-estar. Semelhantemente, quem ama alguém por amor de
amizade quer-lhe o bem que quer a si mesmo, e por isso o apreende como outro
eu, enquanto lhe quer o bem, do referido modo. E daí vem o dizer-se que o amigo
é um outro eu, e Agostinho: Bem disse aquele que considerou o amigo como metade
da sua alma 3.
Donde,
a primeira união o amor a causa efectivamente, porque leva a desejar e buscar a
presença do amado, como algo que lhe convém e lhe pertence. A segunda união causa-a
formalmente, pois que o amor em si mesmo consiste nessa união ou nexo. Por isso
Agostinho diz, que o amor é um quase laço que une ou tende a unir dois seres ―
o amante e o amado, ― referindo-se une à união do afecto, sem a qual não há
amor, e tende a unir, à união real.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. ― A objecção colhe quanto à união real que,
certo, implica a deleitação como causa, enquanto o desejo importa na ausência
real do amado, o objecto do amor pode lhe estar tanto ausente como presente.
RESPOSTA
À SEGUNDA. ― A união mantém tríplice relação com o amor. ― Uma o causa e esta é
substancial, no amor pelo qual nos amamos a nós mesmos, é porém união de
semelhança, no amor pelo qual amamos os outros seres, como já se disse 4.
― Há outra união porém, na qual consiste essencialmente o amor e esta funda-se na
coaptação do afecto, e se assimila à união substancial, enquanto o amante tem
relação com o amado como se fosse consigo mesmo, pelo amor de amizade, e como
se fosse algo de si, pelo amor de concupiscência. Há por fim outra união,
efeito do amor, e esta é a real, que o amante busca no ser amado e que se funda
na conveniência do amor. Por isso segundo o Filósofo, Aristófanes disse que os
amantes desejam constituir um único ser 5. Mas, como isto causaria a
corrupção de ambos ou de um dos dois, buscam a união conveniente e própria, que
os leva à convivência, à mútua conversação e a modos semelhantes de união.
RESPOSTA
À TERCEIRA. ― O conhecimento completa-se pela união do conhecido com o
conhecente, por semelhança. O amor porém faz com que a própria coisa amada se
una de certo modo com o amante, conforme já dissemos. Donde, o amor é mais
unitivo que o conhecimento.
Nota:
Revisão da tradução portuguesa por ama.
____________________
Notas:
1.
Q. 27, a. 3.
2.
IV De divin. Nom., lect. IX,
XII.
3. IV Confess., cap. VI.
4. Q. 27, a. 3.
5. II Polit., lect. III.
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