14/03/2013

Tratado dos actos humanos 60


Questão 17: Dos actos ordenados pela vontade.

Art. 5 ― Se o acto da vontade é ordenado.




(I Ethic., lect. XX).

O quinto discute-se assim. ― Parece que o acto da vontade não é ordenado.



1. ― Pois, como diz Agostinho, a alma ordena a si mesma o querer, mas não a faz querer 1. Ora, querer é acto da vontade. Logo, este não é ordenado.

2. Demais. ― Ordenar convém a quem compreende a ordem. Ora, à vontade não compete compreendê-la, pois a vontade difere do intelecto, que compreende. Logo, o acto da vontade não é ordenado.

3. Demais. ― Se um acto da vontade é ordenado, pela mesma razão todos hão-de sê-lo. Ora, se todos o forem, há-de proceder-se ao infinito necessariamente, porque o acto da vontade precede o da razão que ordena, como já se disse 2, e se esse acto da vontade for, por sua vez, ordenado, a ordem, que lhe corresponde, há-de preceder outro acto da razão e assim ao infinito. Ora, é impossível esse processo ao infinito. Logo, o acto da vontade não é imperado.

Mas, em contrário. ― Tudo o que está em nosso poder está sujeito à nossa ordem. Ora, os actos da vontade por excelência caem sob nosso poder, pois todos os nossos actos se consideram como estando em nosso poder, enquanto voluntários. Logo, os actos da vontade são ordenados por nós.

Como já se disse 3, a ordem não é senão o acto da razão que manda, com certa moção, que alguma coisa seja feita. Ora, é manifesto que a razão pode ordenar o acto da vontade. Pois, assim como pode julgar que é bom querer uma coisa, assim pode ordenar, mandando-nos querer. Donde é claro que o acto da vontade pode ser ordenado.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Como Agostinho diz no mesmo passo, a alma já quer quando a si mesma se ordena, perfeitamente, que queira. E só por ordenar imperfeitamente é que às vezes ordena e não quer. Ora, a ordem imperfeita vem de que a razão é movida, por motivos diversos, a ordenar ou não, e por isso flutua entre esses dois termos e não ordena perfeitamente.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― Assim como cada um dos membros corpóreos age não só para si, mas para todo o corpo ― p. ex., os olhos vêm para todo ele, — o mesmo se dá com as potências da alma. Pois, o intelecto intelige, não só para si, mas para todas as potências, e para todas, e não só para si, a vontade quer. Portanto, o homem ordena-se a si mesmo o acto da vontade, por ser susceptível de compreender e querer.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― Sendo a ordem um acto da razão, ordenado é o acto que a ela está sujeito. Ora, o acto primeiro da vontade não procede de ordem da razão, mas do instinto da natureza, ou de uma coisa superior, como se disse antes 4. E portanto não é necessário proceder ao infinito.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.

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Notas:
1. VIII Confess., cap. IX.
2. Q. 17, a. 1.
3. Q. 17, a. 1.
4. Q. 9 a. 4.

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