31/01/2013

Tratado dos actos humanos 18


Art. 2 ― Se a vontade pode ser movida pelo apetite sensitivo.


(Infra, q. 10, a . 3, q. 77, a . 1, De Verit., q. 22, a . 9, ad 6).





O segundo discute-se assim. ― Parece que a vontade não pode ser movida pelo apetite sensitivo.



1. ― Pois, o motor e o agente são preeminentes ao paciente, como diz Agostinho 1. Ora, o apetite sensitivo é inferior à vontade, apetite intelectivo, assim como o sensitivo o é ao intelecto. Logo, o apetite sensitivo não move o intelectivo.

2. Demais. ― Nenhuma virtude particular pode produzir efeito universal. Ora, o apetite sensitivo, resultante da apreensão particular do sentido, é uma virtude particular. Logo, não pode causar o movimento da vontade, que é universal, como resultante da apreensão universal do intelecto.

3. Demais. ― Como está provado em Aristóteles 2, o motor não é movido pelo que ele põe em movimento, de maneira que a moção seja recíproca. Ora, a vontade move o apetite sensitivo, enquanto este obedece à razão. Logo, o apetite sensitivo não move a vontade.

Mas, em contrário, diz a Escritura (Tg 1, 14): Mas cada um é tentado pela sua própria concupiscência, que o abstrai e alicia. Ora, ninguém seria arrastado pela concupiscência que tem a sua sede no apetite sensitivo sem a vontade ser movida por esse apetite. Logo, o apetite sensitivo move a vontade.

Como já se disse 3, o apreendido sob a ideia de bom e de conveniente, move, como objecto, a vontade. Ora, uma coisa pode parecer boa e conveniente em dois pontos de vista, conforme se atenda ao que ou a quem é proposta, pois, conveniência supõe relação e portanto depende de um e outro extremo. E daí, vem que o gosto, diversamente disposto, não aceita, do mesmo modo, algo como conveniente e não conveniente. Donde o dito do Filósofo: cada um julga do fim, segundo suas disposições naturais 4.

Ora, é manifesto que, pela paixão do apetite sensitivo, o homem é imutado para alguma disposição. Donde, quando levado por uma paixão, parece-lhe conveniente o que lhe não pareceria se dela estivesse isento, assim, o que parece bom ao irado não o parece ao calmo. Deste modo, pois, quanto ao objecto, o apetite sensitivo move a vontade.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Nada impede que seja mais débil, em certo ponto de vista, o que em si, é preeminente. Assim, a vontade em si, é preeminente ao apetite sensitivo, mas este tem sobre-eminência quando a paixão domina e submete.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― Os actos e as eleições do homem dizem respeito ao particular. Donde, por isso mesmo é uma virtude particular, o apetite sensitivo tem grande poder para dispor o homem de tal maneira que este aprecie o particular, de tal modo ou de tal outro.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― Como diz o Filósofo 5, a razão, na qual está a vontade, move, pelo seu império, o irascível e o concupiscível, não, certo, por principado despótico, como é o servo movido pelo senhor, mas por principado real ou político, como os homens livres são regidos pelo governador, os quais contudo podem resistir. Donde, o irascível e o concupiscível podem resistir à vontade e assim nada impede que esta seja por vezes movida por eles.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:
1. VII Super Gen. ad litt., cap. XVI.
2. VIII Physic., lect. X.
3. Q. 9, a. 1.
4. III Ethic., lect. XIII.
5. I Polit., lect. III.

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