20/12/2012

Tratado da bem-aventurança 16


Questão 2: Em que consiste a bem-aventurança do homem.

Art. 8 — Se a bem-aventurança do homem consiste em algum bem criado.


(I. q. 12, a . 1, IV Cont. Gent., cap. LIV, Compend. Theol., part. I cap. CVIII, part. II. cap. IX, De Regim. Princip., lib. I cap. VIII, In Psalm., XXXII)

O oitavo discute-se assim. — Parece que a bem-aventurança do homem consiste em algum bem criado.


1. — Pois, como diz Dionísio, a divina sabedoria une os extremos das naturezas primárias aos princípios das secundárias, donde, pode-se concluir, o que é sumo em a natureza inferior deve atingir o que, na superior, é infinito. Ora, o sumo bem do homem é a bem-aventurança. Sendo, pois o anjo, na ordem da natureza, superior ao homem, como já vimos, resulta que a bem-aventurança deste consiste em atingi-lo, de certo modo.

2. Demais. — O fim último de uma coisa está na sua perfeição, por isso a parte é para o fim, que é o todo. Ora, a universidade total das criaturas, chamada mundo maior, está para o homem, chamado mundo menor, como o perfeito para o imperfeito. Logo, a bem-aventurança do homem consiste na universidade total das criaturas.

3. Demais. — O homem torna-se feliz quando satisfaz o seu desejo natural. Ora, este não se estende a um bem maior que o que ele pode apreender. Não sendo ele pois capaz de um bem que exceda os limites de toda criatura, resulta que pode tornar-se feliz por meio de algum bem criado, no qual então consiste a sua bem-aventurança.
Mas, em contrário, diz Agostinho: como a alma é a vida do corpo, assim, a vida feliz do homem é Deus, de quem diz a Escritura: Bem-aventurado o povo que tem ao Senhor por seu Deus.

É impossível a bem-aventurança do homem consistir em algum bem criado. Pois esta é o bem perfeito que repousa totalmente o apetite, do contrário, se algo ainda restasse a apetecer ele não seria o fim último. Ora, o objecto da vontade, que é o apetite humano, é o bem universal, como o do intelecto é a verdade universal. Donde resulta claro, que nada pode satisfazer a vontade do homem senão o bem universal. Ora, disto nenhum bem criado é capaz, mas só Deus, porque toda criatura tem a bondade participada. Donde, só Deus pode satisfazer a vontade do homem, conforme a Escritura (Sl 102, 5): O que enche de bens o teu desejo. Logo, só em Deus consiste a bem-aventurança dele.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — O que é superior no homem atingir, por certo, o que é infinito na criatura Angélica, por certa semelhança, mas nem por isso aí repousa como no fim último, mas prossegue até à própria fonte universal do bem, objecto universal da bem-aventurança de todos os felizes, pois é o bem infinito e perfeito.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Se um todo não é o último fim, mas se ordena a outro fim ulterior, então o último fim da parte não é o todo mesmo, mas algum outro. Ora, a universalidade das criaturas, para a qual o homem está como a parte para o todo, não é o último fim, mas ordena-se para Deus, que o é. Donde, o bem do universo não é o último fim do homem, mas o próprio Deus.

RESPOSTA À TERCEIRA. — O bem criado não é inferior ao que é o bem, intrínseco e inerente à capacidade do homem, porém é-o ao bem infinito objecto dessa capacidade. Ora, o bem participado pelo anjo e por todo o universo é um bem infinito e limitado.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.

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