O
título da obra de S. Teresa de Jesus, conhecida como Caminho de perfeição, está
cheio de aberturas sugestivas a uma imensa riqueza de conteúdos humanos,
culturais e espirituais. Enquanto usa a metáfora do caminho, remete para a concepção da vida humana como uma viagem, que dá unidade à diversidade de
episódios e de experiências e decorre entre progressos e retrocessos, sucessos
e fracassos, perdas e ganhos, conquistas e derrotas, ditas e desditas. Vista
como metáfora da existência humana vivida ou por viver, o caminho aparece como
narrativa com sentido.
Está,
por isso, muito representada nas literaturas clássicas. Na Odisseia de Homero,
fazemos o caminho interior do ser humano que, através de motivos míticos,
regressa às origens, às raízes, à identidade, à consciência das suas
capacidades mas também da radical finitude. A Odisseia é um périplo através dos
sentimentos humanos mais profundos: perigos e sofrimentos que espreitam a cada
esquina da vida, fidelidade inabalável, refinada hospitalidade, visão da presença
e intervenção do divino na história humana, o frequente diálogo com o divino
através da invocação dos deuses, a procura dramática da liberdade e dos valores
humanos.
Na
Eneida, o caminho épico do herói Eneias é o fio condutor dos combates e da dor,
dos encontros e desencontros, das contrariedades e da glória do ser humano na
procura da realização pessoal.
A
epopeia dos Lusíadas ou a descoberta do caminho marítimo para a Índia é a
história de um povo, dos seus momentos mais dramáticos, das partidas e
chegadas, das pelejas e memórias, dos medos e amores, da esperança…, narrada
nas peripécias de uma viagem; é a aventura à procura de sentido para a vida.
A Peregrinação de Fernão Mendes Pinto sugere o
que o caminho supõe de busca do absoluto, de provas ou provações e de aquisição
de conhecimentos.
O
peregrino, expondo-se a perigos e sacrifícios e enfrentando medos e obstáculos,
significava as dificuldades da vida e exorcizava-as. Caminhar ajudava a
tornar-se «outro». Narrar a vida no interior de uma viagem era contemplar a
vida como narrativa, desafiando a identificação entre o «decurso» ou «discurso»
da vida e o da memória escrita.
armindo dos santos vaz, ocd, Semana de
Espiritualidade 2012, Avessadas, © SNPC | 11.10.12
Card.
gianfranco ravasi, Presidente do
Pontifício Conselho para a Cultura, In L'Osservatore Romano (26.7.2012), © SNPC
(trad.) | 11.10.12
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