Questão
86: Do que o nosso intelecto conhece nas coisas materiais.

Art. 4 — Se o nosso
intelecto conhece os futuros.
(Supra, q. 57, a. 3; IIª IIae,
q. 95, a. 1; q. 172, a. 1; I Sent., dist. XXXVIII, a. 5, ad; II, dist. VII, q.
2, a. 2; III Cont. Gent., cap. CLIV; De Verit. Q. 8, a. 12; De
Malo, q. 16, a. 7; Compend. Theol., cap. CXXXIII; In Isai., cap. III).
O
quarto discute-se assim. ― Parece que o nosso intelecto conhece as coisas
futuras.
1.
― Pois, o nosso intelecto conhece pelas espécies inteligíveis, que abstrai das
condições particulares de lugar e tempo; e por isso elas se referem
indiferentemente a todos os tempos. Ora, ele pode conhecer o presente. Logo,
também as coisas futuras.
2.
Demais. ― O homem, mesmo quando privado dos sentidos, pode conhecer certos
futuros, como é patente nos adormecidos e nos frenéticos. Ora, essa privação
dos sentidos dá maior vigor à inteligência. Logo, o intelecto, por si mesmo,
pode conhecer as coisas futuras.
3.
Demais. ― O conhecimento intelectivo do homem é mais eficaz do que qualquer
conhecimento dos brutos. Ora, certos animais preveem certos futuros; assim, as
gralhas pequenas, frequentemente crocitando, anunciam a chuva que em breve
virá. Logo, com maioria de razão, o intelecto humano pode conhecer as coisas
futuras.
Mas,
em contrário, diz a Escritura (Ecle 8, 6-7): É muita a aflição do
homem, porque ignora as coisas passadas, e por nenhum mensageiro pode saber as
futuras.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ― A objeção procede, quanto ao conhecimento por
meio das noções universais das coisas; pelas quais os futuros podem ser
conhecidos segundo a dependência do efeito em relação à causa.
RESPOSTA
À SEGUNDA. ― Como diz Agostinho, a alma recebe uma certa colaboração do acaso
de modo que, por sua natureza pode conhecer os futuros. Assim, quando se retrai
dos sentidos corpóreos e, de certo modo, volta-se para si mesma, torna-se
participante do conhecimento dos futuros. Tal opinião seria racional se
admitíssemos que a alma adquire o conhecimento das causas pela participação das
ideias, como ensinavam os Platónicos; porque então, ela conheceria, por
natureza, as causas universais de todos os efeitos, mas ficaria impedida pelo
corpo; de modo que, uma vez separada dos sentidos, conheceria os futuros. Ora,
este modo de conhecer não é conatural ao nosso intelecto, que tira dos sentidos
os elementos do seu conhecimento. Donde, não é por natureza que a alma, quando
separada dos sentidos, conhece os futuros; mas é, antes, pela impressão de
certas causas superiores espirituais e corporais. ― Espirituais, como quando,
pelo ministério dos anjos, com a virtude divina, o intelecto humano é iluminado
e os fantasmas são ordenados ao conhecimento de certos futuros. Ou também
quando, por operação dos demônios produz-se uma comoção na fantasia, designando
de antemão certos futuros, que os demônios conhecem, como já se disse antes (q.
57, a. 3). Ora, essas impressões das causas espirituais a alma pode
naturalmente recebê-las, sobretudo quando separada dos sentidos; porque, então,
se torna mais próxima das substâncias espirituais e mais livre das agitações
exteriores. ― Mas também o facto pode sedar pela impressão das causas
superiores corporais; pois, é manifesto que os corpos superiores causam
impressão nos inferiores. Donde, como as virtudes sensitivas são actos dos
órgãos corpóreos, é consequente que a impressão dos corpos celestes cause, de
certo modo, imutação na fantasia. E por isso, sendo os corpos celestes causa de
muitos futuros, produzem-se na imaginação sinais de certos deles. E tais sinais
são percebidos mais de noite, pelos que dormem, do que de dia, pelos que estão
acordados; porque, como diz Aristóteles, as coisas transmitidas de dia
dissipam-se facilmente; ao passo que o ar da noite é tranquilo porque as noites
são mais silenciosas. E despertam o sentido, no corpo, por causa do sono; pois,
os pequenos movimentos interiores são sentidos mais pelos adormecidos do que
pelos acordados. Ora, esses movimentos produzem os fantasmas, pelos quais são
previstos os futuros.
RESPOSTA
À TERCEIRA. ― Os brutos nada têm, acima da fantasia, que ordene os fantasmas,
como os homens, que têm a razão; e por isso, a fantasia dos brutos é consequente,
totalmente, à impressão celeste. Donde, pelos movimentos deles podem-se
conhecer certos futuros, como a chuva e outros, mais do que pelo movimento dos
homens, que se movem pelo conselho da razão. E por isso diz o Filósofo: há
certos homens imprudentíssimos que são previdentes em sumo grau; porque a
inteligência deles não é trabalhada de cuidados; mas, deserta e vazia de tudo
é, quando movida, como que levada pelo motor.
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