Art. 6 ― Se a alma humana é corruptível.
(II Sent. disto XIX, a. 1; IV, dist. q. 1, a. 1; II
Cont. Gent., cap.LXXIX sqq.; Quodl. X, q. 3, a. 2; Qu. De Anima, a. 14;
Compend. Theol., cap. LXXXIV).
O
sexto discute-se assim. ― Parece que a alma humana é corruptível.
1.
― Pois, seres que têm princípio e processão semelhantes também têm fim
semelhante. Ora, o princípio da geração dos homens é semelhante ao dos asnos,
pois ambos foram feitos da terra; e também é semelhante, em ambos a processão
da vida, pois, como diz a Escritura (Ecle 3, 19), todos respiram da
mesma sorte, e o homem não tem nada a mais que o bruto. Logo, como no mesmo
passo da Escritura se conclui, por isso uma é a morte dos homens e dos brutos,
e de uns e outros é igual à condição. Mas, a alma dos brutos é corruptível.
Logo, também o é a alma humana.
2.
Demais. ― Tudo o que provém do nada é redutível ao nada, porque o fim deve
corresponder ao princípio. Mas, como diz a Escritura (Sb 2, 2),
somos nascidos do nada; o que é verdade, não só do corpo, mas também da alma.
Logo, como ainda no mesmo passo se conclui, depois desta vida seremos como se
nunca tivéramos sido, mesmo em relação à alma.
3.
Demais. ― Não há ser que não tenha a sua operação própria. Ora, a operação
própria da alma, inteligir por meio do fantasma, não acontece sem o corpo.
Pois, a alma não intelige nada sem fantasma e este não existe sem o corpo, como
diz Aristóteles. Logo, a alma não pode subsistir uma vez destruído o corpo.
Mas,
em contrário, diz Dionísio, que as almas humanas têm da bondade divina o serem
intelectuais e o terem a vida substancial inconsumível.
É necessário admitir-se que a alma humana, a que chamamos princípio
intelectivo, é incorruptível. Pois, um ser pode corromper-se de duplo modo: por
si ou por acidente. Ora, é impossível a um ser subsistente ser gerado ou
corrompido por acidente, ou seja, porque nele houve alguma parte gerada ou
corrupta. Pois, a todo o ente lhe convém o ser gerado ou corrompido do mesmo
modo pelo qual lhe convém o ser, que pela geração se adquire e pela corrupção
se perde. Donde, o que tiver o ser por si só por si pode gerar-se ou
corromper-se. Os seres porém não subsistentes, como os acidentes e as formas
materiais, dizem-se feitos e corruptos pela geração e corrupção dos compostos.
Ora, já se demonstrou antes (a. 3), que as almas dos brutos não são
por si subsistentes, mas apenas a alma humana. Por isso, aquelas se corrompem,
uma vez corruptos os seus corpos; porém esta só por si poderia corromper-se.
Ora, isto é absolutamente impossível, não só a esta, mas a qualquer ser subsistente
que seja só forma. Pois, é manifesto, o que convém, em si, a um ser, é
inseparável deste. Ora, o ser em si, convém à forma, que é um acto. Donde, a
matéria adquire o ser atual na medida em que adquire a forma e corrompe-se na
medida em que lhe sucede separar-se dela. Ao passo que, sendo impossível à
forma separar-se de si mesma, impossível é também que a forma subsistente perca
o ser.
Dado,
porém, que a alma seja composta de matéria e forma, como certos dizem, ainda
assim é necessário admiti-la como incorruptível. Pois, só se encontra corrupção
onde se encontra a contrariedade; porque as gerações e as corrupções são
passagens de uns para outros contrários. Por isso os corpos celestes, sem
matéria sujeita à contrariedade, são incorruptíveis. Ora, na alma intelectiva pode
haver nenhuma contrariedade. Pois, ela é receptiva ao modo do seu ser e as
coisas por ela recebidas são-no sem contrariedade; pois que as noções dos
contrários não são contrárias no intelecto, mas há uma só ciência dos
contrários. Logo, é impossível que a alma intelectiva seja corruptível.
Também
se pode tirar uma prova desta doutrina do facto de cada ente desejar ser
naturalmente, ao seu modo. Ora, o desejo, nos seres que conhecem, segue-se ao
conhecimento. E, ao passo que o sentido não conhece o ser senão num determinado
lugar e tempo, o intelecto apreende-o absolutamente e referente a qualquer
tempo. Por isso, todo o ser que tem intelecto deseja existir sempre. Ora, o
desejo natural não pode ser vão. Logo, toda substância intelectual é
incorruptível.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ― Salomão aplica essa razão à pessoa dos incipientes,
como se exprime noutra parte. E quanto a dizer-se que o homem e os outros
animais têm o princípio da geração semelhante, isso é verdade quanto ao corpo,
pois, todos os animais foram feitos da terra, semelhantemente. Não, porém,
quanto à alma; pois, ao passo que a dos brutos é produzida por uma virtude
corpórea, a alma humana é-o por Deus. E, para o exprimir, a Escritura (Gn
1) diz dos outros animais: Produza a terra animais viventes. Mas do
homem: inspirou no seu rosto um assopro de vida. Donde, conclui Salomão (Ecl
12, 7): E o pó se torne na sua terra de onde era, e o espírito volte para
Deus que o deu. Do mesmo modo, a processão da vida é semelhante quanto ao
corpo; e a isso se referem os passos (Ecl 3, 19): Todos respiram da
mesma sorte e (Sb 2, 2) a respiração nos nossos narizes é um fumo.
Mas não é semelhante a essa a processão da alma, pois, o homem intelige e os
brutos não. Por isso é falso o dito: O homem não tem nada de mais do que o
bruto. Donde, a morte é semelhante quanto ao corpo mas não quanto à alma.
RESPOSTA
À SEGUNDA. ― Assim como se diz que um ser pode ser criado, não pela potência
passiva, mas só pela potência activa do Criador que, do nada, pode produzir uma
coisa; assim também dizer que um ser é redutível ao nada não importa, na
criatura, a potência para o não ser, mas sim a potência do Criador não
influindo o ser. Ora, chama-se corruptível ao ente em que existe a potência
para o não ser.
RESPOSTA
À TERCEIRA. ― Inteligir, por meio do fantasma é, propriamente, operação da
alma, enquanto unida ao corpo. Separada deste, porém, terá outro modo de
inteligir, semelhante ao das outras substâncias separadas, como a seguir melhor
se verá (q. 89, a. 1).
Nota:
Revisão da tradução para português por ama
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