Não abandones a tua leitura espiritual.
A leitura tem feito muitos santos.
(S. josemaria, Caminho 116)
Está aconselhada a leitura espiritual diária de mais ou menos 15 minutos. Além da leitura do novo testamento, (seguiu-se o esquema usado por P. M. Martinez em “NOVO TESTAMENTO” Editorial A. O. - Braga) devem usar-se textos devidamente aprovados. Não deve ser leitura apressada, para “cumprir horário”, mas com vagar, meditando, para que o que lemos seja alimento para a nossa alma.
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Evangelho: Mt 20, 1-16
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Evangelho: Mt 20, 1-16
1 «O Reino dos Céus é semelhante a um pai de
família que, ao romper da manhã, saiu a contratar operários para a sua vinha.2
Tendo ajustado com os operários um denário por dia, mandou-os para a sua vinha.3
Tendo saído cerca da terceira hora, viu outros, que estavam na praça ociosos, 4
e disse-lhes: “Ide vós também para a minha vinha, e dar-vos-ei o que for
justo”. 5 Eles foram. Saiu outra vez cerca da hora sexta e da nona,
e fez o mesmo.6 Cerca da undécima, saiu, e encontrou outros que
estavam sem fazer nada, e disse-lhes: “Porque estais aqui todo o dia sem
trabalhar?”. 7 Eles responderam: “Porque ninguém nos contratou”. Ele
disse-lhes: “Ide vós também para a minha vinha”. 8 «No fim da tarde,
o senhor da vinha disse ao seu feitor: “Chama os operários e paga-lhes o
salário, começando pelos últimos até aos primeiros”. 9 Tendo chegado
os que tinham ido à hora undécima, recebeu cada qual um denário. 10
Chegando também os primeiros, julgaram que haviam de receber mais; porém, também
eles receberam um denário cada um. 11 Mas, ao receberem, murmuravam
contra o pai de família, 12 dizendo: “Estes últimos trabalharam
somente uma hora, e os igualaste connosco, que suportamos o peso do dia e o
calor”. 13 Porém, ele, respondendo a um deles, disse: “Amigo, eu não
te faço injustiça. Não ajustaste comigo um denário? 14 Toma o que é
teu, e vai-te. Eu quero dar também a este último tanto como a ti. 15
Ou não me é lícito fazer dos meus bens o que quero? Porventura o teu olho é mau
porque eu sou bom?”. 16 Assim os últimos serão os primeiros, e os
primeiros serão os últimos».17 Ao subir Jesus para Jerusalém, tomou
à parte os doze discípulos, e disse-lhes pelo caminho: 18 «Eis que
subimos a Jerusalém, e o Filho do Homem será entregue aos príncipes dos
sacerdotes e aos escribas, e O condenarão à morte, 19 e O entregarão
aos gentios para ser escarnecido, açoitado e crucificado, e ao terceiro dia
ressuscitará». 20 Então, aproximou-se d'Ele a mãe dos filhos de
Zebedeu com seus filhos, prostrando-se, para Lhe fazer um pedido. 21
Ele disse-lhe: «Que queres?». Ela respondeu: «Ordena que estes meus dois filhos
se sentem no Teu reino, um à Tua direita e outro à Tua esquerda». 22
Jesus disse: «Não sabeis o que pedis. Podeis beber o cálice que Eu hei-de
beber?». Eles responderam-Lhe: «Podemos». 23 Disse-lhes:
«Efectivamente haveis de beber o Meu cálice, mas, quanto a sentar-se à Minha
direita ou à Minha esquerda, não pertence a Mim concedê-lo; será para aqueles
para quem está reservado por Meu Pai». 24 Os outros dez, ouvindo
isto, indignaram-se contra os dois irmãos.25 Mas Jesus chamou-os e
disse-lhes: «Vós sabeis que os príncipes das nações as subjugam e que os grandes
as governam com autoridade. 26 Não seja assim entre vós, mas todo
aquele que quiser ser entre vós o maior, seja vosso servo, 27 e quem
quiser ser entre vós o primeiro, seja vosso escravo. 28 Assim como o
Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a Sua vida para
resgate de todos».29 Ao saírem
de Jericó, seguiu-O muita gente. 30 Eis que dois cegos, que estavam
sentados à beira da estrada, ouviram dizer que Jesus passava e começaram a
gritar: «Senhor, Filho de David, tem piedade de nós!».3 1 O povo
repreendia-os para que se calassem. Eles, porém, cada vez gritavam mais:
«Senhor, Filho de David, tem piedade de nós!». 32 Jesus parou,
chamou-os e disse-lhes: «Que quereis que Eu vos faça?». 33 «Senhor,
responderam eles, queremos que se abram os nossos olhos!». 34 Jesus,
compadecido, tocou-lhes nos olhos, e no mesmo instante recuperaram a vista e O
seguiram.
Ioannes
Paulus PP. II
Evangelium vitae
aos
Presbíteros e Diáconos
aos
Religiosos e Religiosas
aos
Fiéis leigos e a todas as Pessoas de Boa Vontade
sobre
o Valor e a Inviolabilidade
da
Vida Humana
…/9
Face
ao progressivo enfraquecimento, nas consciências e na sociedade, da percepção
da absoluta e grave ilicitude moral da eliminação directa de qualquer vida
humana inocente, sobretudo no seu início e no seu termo, o Magistério da Igreja
intensificou as suas intervenções em defesa da sacralidade e inviolabilidade da
vida humana. Ao Magistério pontifício, particularmente insistente, sempre se
uniu o Magistério episcopal, com numerosos e amplos documentos doutrinais e pastorais
emanados quer pelas Conferências Episcopais, quer pelos Bispos individualmente.
Não faltou sequer, forte e incisiva na sua brevidade, a intervenção do Concílio Vaticano II. 50
Portanto,
com a autoridade que Cristo conferiu a Pedro e aos seus Sucessores, em comunhão
com os Bispos da Igreja Católica, confirmo que a morte directa e voluntária de
um ser humano inocente é sempre gravemente imoral. Esta doutrina, fundada naquela
lei não-escrita que todo o homem, pela luz da razão, encontra no próprio
coração (cf. Rm 2, 14-15), é confirmada pela Sagrada Escritura,
transmitida pela Tradição da Igreja e ensinada pelo Magistério ordinário e universal.
51
A
decisão deliberada de privar um ser humano inocente da sua vida é sempre má do
ponto de vista moral, e nunca pode ser lícita nem como fim, nem como meio para
um fim bom. É, de facto, uma grave desobediência à lei moral, antes ao próprio
Deus, autor e garante desta; contradiz as virtudes fundamentais da justiça e da
caridade. «Nada nem ninguém pode autorizar que se dê a morte a um ser humano
inocente seja ele feto ou embrião, criança ou adulto, velho, doente incurável
ou agonizante. E também a ninguém é permitido requerer este gesto homicida para
si ou para outrem confiado à sua responsabilidade, nem sequer consenti-lo
explícita ou implicitamente. Não há autoridade alguma que o possa legitimamente
impor ou permitir». 52
No
referente ao direito à vida, cada ser humano inocente é absolutamente igual a
todos os demais. Esta igualdade é a base de todo o relacionamento social
autêntico, o qual, para o ser verdadeiramente, não pode deixar de se fundar
sobre a verdade e a justiça, reconhecendo e tutelando cada homem e cada mulher
como pessoa, e não como coisa de que se possa dispor. Diante da norma moral que
proíbe a eliminação directa de um ser humano inocente, «não existem
privilégios, nem excepções para ninguém. Ser o dono do mundo ou o último
"miserável" sobre a face da terra, não faz diferença alguma: perante
as exigências morais, todos somos absolutamente iguais». 53
«Vossos olhos contemplaram-me ainda em
embrião» (Sal 139 138, 16): o crime abominável do aborto
58.
De entre todos os crimes que o homem pode realizar contra a vida, o aborto
provocado, apresenta características que o tornam particularmente grave e
abjurável. O Concílio Vaticano II
define-o, juntamente com o infanticídio, «crime abominável». 54
Mas
hoje, a percepção da sua gravidade vai-se obscurecendo progressivamente em
muitas consciências. A aceitação do aborto na mentalidade, nos costumes e na
própria lei, é sinal eloquente de uma perigosíssima crise do sentido moral que
se torna cada vez mais incapaz de distinguir o bem do mal, mesmo quando está em
jogo o direito fundamental à vida. Diante de tão grave situação, impõe-se mais
que nunca a coragem de olhar frontalmente a verdade e chamar as coisas pelo seu
nome, sem ceder a compromissos com o que nos é mais cómodo, nem à tentação de
auto-engano. A propósito disto, ressoa categórica a censura do Profeta: «Ai dos
que ao mal chamam bem, e ao bem, mal, que têm as trevas por luz e a luz por
trevas» (Is 5, 20). Precisamente no caso do aborto, verifica-se a
difusão de uma terminologia ambígua, como «interrupção da gravidez», que tende
a esconder a verdadeira natureza dele e a atenuar a sua gravidade na opinião
pública. Talvez este fenómeno linguístico seja já, em si mesmo, sintoma de um
mal-estar das consciências. Mas nenhuma palavra basta para alterar a realidade
das coisas: o aborto provocado é a morte deliberada e directa,
independentemente da forma como venha realizada, de um ser humano na fase
inicial da sua existência, que vai da concepção ao nascimento.
A
gravidade moral do aborto provocado aparece em toda a sua verdade, quando se
reconhece que se trata de um homicídio e, particularmente, quando se consideram
as circunstâncias específicas que o qualificam. A pessoa eliminada é um ser
humano que começa a desabrochar para a vida, isto é, o que de mais inocente, em
absoluto, se possa imaginar: nunca poderia ser considerado um agressor, menos
ainda um injusto agressor! É frágil, inerme, e numa medida tal que o deixa
privado inclusive daquela forma mínima de defesa constituída pela força
suplicante dos gemidos e do choro do recém-nascido. Está totalmente entregue à
protecção e aos cuidados daquela que o traz no seio. E todavia, às vezes, é
precisamente ela, a mãe, quem decide e pede a sua eliminação, ou até a provoca.
É
verdade que, muitas vezes, a opção de abortar reveste para a mãe um carácter
dramático e doloroso: a decisão de se desfazer do fruto concebido não é tomada
por razões puramente egoístas ou de comodidade, mas porque se quereriam
salvaguardar alguns bens importantes como a própria saúde ou um nível de vida
digno para os outros membros da família. Às vezes, temem-se para o nascituro
condições de existência tais que levam a pensar que seria melhor para ele não
nascer. Mas estas e outras razões semelhantes, por mais graves e dramáticas que
sejam, nunca podem justificar a supressão deliberada de um ser humano inocente.
59.
A decidirem a morte da criança ainda não nascida, a par da mãe, aparecem, com
frequência, outras pessoas. Antes de mais, o pai da criança pode ser culpado,
não apenas quando claramente constrange a mulher ao aborto, mas também quando
favorece indirectamente tal decisão ao deixá-la sozinha com os problemas de uma
gravidez: 55 desse modo, a
família fica mortalmente ferida e profanada na sua natureza de comunidade de
amor e na sua vocação para ser «santuário da vida». Nem se podem calar as
solicitações que, às vezes, provêm do âmbito familiar mais alargado e dos
amigos. A mulher, não raro, é sujeita a pressões tão fortes que se sente
psicologicamente constrangida a ceder ao aborto: não há dúvida que, neste caso,
a responsabilidade moral pesa particularmente sobre aqueles que, directa ou
indirectamente, a forçaram a abortar. Responsáveis são também os médicos e
restantes profissionais da saúde, sempre que põem ao serviço da morte a
competência adquirida para promover a vida.
Mas
a responsabilidade cai ainda sobre os legisladores que promoveram e aprovaram
leis abortistas, e sobre os administradores das estruturas clínicas onde se
praticam os abortos, na medida em que a sua execução deles dependa. Uma responsabilidade
geral, mas não menos grave, cabe a todos aqueles que favoreceram a difusão de
uma mentalidade de permissivismo sexual e de menosprezo pela maternidade, como
também àqueles que deveriam ter assegurado — e não o fizeram — válidas
políticas familiares e sociais de apoio às famílias, especialmente às mais
numerosas ou com particulares dificuldades económicas e educativas. Não se pode
subestimar, enfim, a vasta rede de cumplicidades, nela incluindo instituições
internacionais, fundações e associações, que se batem sistematicamente pela
legalização e difusão do aborto no mundo. Neste sentido, o aborto ultrapassa a
responsabilidade dos indivíduos e o dano que lhes é causado, para assumir uma
dimensão fortemente social: é uma ferida gravíssima infligida à sociedade e à
sua cultura por aqueles que deveriam ser os seus construtores e defensores.
Como escrevi na Carta às Famílias, «encontramo-nos defronte a uma enorme ameaça
contra a vida, não apenas dos simples indivíduos, mas também de toda a civilização».
56 Achamo-nos perante algo que
bem se pode definir uma «estrutura de pecado » contra a vida humana ainda não
nascida.
60.
Alguns tentam justificar o aborto, defendendo que o fruto da concepção, pelo
menos até um certo número de dias, não pode ainda ser considerado uma vida
humana pessoal. Na realidade, porém, «a partir do momento em que o óvulo é
fecundado, inaugura-se uma nova vida que não é a do pai nem a da mãe, mas sim a
de um novo ser humano que se desenvolve por conta própria. Nunca mais se tornaria
humana, se não o fosse já desde então. A esta evidência de sempre (...) a
ciência genética moderna fornece preciosas confirmações. Demonstrou que, desde
o primeiro instante, se encontra fixado o programa daquilo que será este ser
vivo: uma pessoa, esta pessoa individual, com as suas notas características já
bem determinadas. Desde a fecundação, tem início a aventura de uma vida humana,
cujas grandes capacidades, já presentes cada uma delas, apenas exigem tempo
para se organizar e encontrar prontas a agir». 57
Não podendo a presença de uma alma espiritual ser assinalada através da
observação de qualquer dado experimental, são as próprias conclusões da ciência
sobre o embrião humano a fornecer «uma indicação valiosa para discernir
racionalmente uma presença pessoal já a partir desta primeira aparição de uma
vida humana: como poderia um indivíduo humano não ser uma pessoa humana?». 58
Aliás,
o valor em jogo é tal que, sob o perfil moral, bastaria a simples probabilidade
de encontrar-se em presença de uma pessoa para se justificar a mais categórica
proibição de qualquer intervenção tendente a eliminar o embrião humano. Por
isso mesmo, independentemente dos debates científicos e mesmo das afirmações
filosóficas com os quais o Magistério não se empenhou expressamente, a Igreja
sempre ensinou — e ensina — que tem de ser garantido ao fruto da geração
humana, desde o primeiro instante da sua existência, o respeito incondicional
que é moralmente devido ao ser humano na sua totalidade e unidade corporal e
espiritual: «O ser humano deve ser respeitado e tratado como uma pessoa desde a
sua concepção e, por isso, desde esse mesmo momento, devem-lhe ser reconhecidos
os direitos da pessoa, entre os quais e primeiro de todos, o direito inviolável
de cada ser humano inocente à vida». 59
61.
Os textos da Sagrada Escritura, que nunca falam do aborto voluntário e, por
conseguinte, também não apresentam condenações directas e específicas do mesmo,
mostram pelo ser humano no seio materno uma consideração tal que exige, como lógica
consequência, que se estenda também a ele o mandamento de Deus: «não matarás».
A
vida humana é sagrada e inviolável em cada momento da sua existência, inclusive
na fase inicial que precede o nascimento. Desde o seio materno, o homem
pertence a Deus que tudo perscruta e conhece, que o forma e plasma com suas
mãos, que o vê quando ainda é um pequeno embrião informe, e que nele entrevê o
adulto de amanhã, cujos dias estão todos contados e cuja vocação está já
escrita no «livro da vida» (cf. Sal 139 138, 1.13-16). Quando está
ainda no seio materno — como testemunham numerosos textos bíblicos 60 — já o homem é objecto muito pessoal da
amorosa e paterna providência de Deus.
A
Tradição cristã — como justamente se realça na Declaração sobre esta matéria,
emanada pela Congregação para a Doutrina
da Fé 61 — é clara e unânime,
desde as suas origens até aos nossos dias, em classificar o aborto como
desordem moral particularmente grave. A comunidade cristã, desde o seu primeiro
confronto com o mundo greco-romano onde se praticava amplamente o aborto e o
infanticídio, opôs-se radicalmente, com a sua doutrina e a sua praxe, aos costumes
generalizados naquela sociedade, como o demonstra a já citada Didaké. 62 Entre os escritores eclesiásticos da área
linguística grega, Atenágoras recorda que os cristãos consideram homicidas as
mulheres que recorrem a produtos abortivos, porque os filhos, apesar de estarem
ainda no seio da mãe, «são já objecto dos cuidados da Providência divina». 63
Entre os latinos, Tertuliano afirma: «É um homicídio premeditado impedir de
nascer; pouco importa que se suprima a alma já nascida ou que se faça
desaparecer durante o tempo até ao nascer. É já um homem aquele que o será». 64
Ao
longo da sua história já bimilenária, esta mesma doutrina foi constantemente
ensinada pelos Padres da Igreja, pelos seus Pastores e Doutores. Mesmo as
discussões de carácter científico e filosófico acerca do momento preciso da
infusão da alma espiritual não incluíram nunca a mínima hesitação quanto à
condenação moral do aborto.
62.
O Magistério pontifício mais recente reafirmou, com grande vigor, esta doutrina
comum. Em particular Pio XI, na Encíclica
Casti connubii rejeitou as alegadas justificações do aborto; 65 Pio XII excluiu todo o aborto directo,
isto é, qualquer acto que vise directamente destruir a vida humana ainda não
nascida, «quer tal destruição seja pretendida como fim ou apenas como meio para
o fim»; 66 João XXIII corroborou
que a vida humana é sagrada, porque «desde o seu despontar empenha directamente
a acção criadora de Deus». 67 O Concílio Vaticano II, como já foi
recordado, condenou o aborto com grande severidade: «A vida deve, pois, ser
salvaguardada com extrema solicitude, desde o primeiro momento da concepção; o
aborto e o infanticídio são crimes abomináveis». 68
A
disciplina canónica da Igreja, desde os primeiros séculos, puniu com sanções
penais aqueles que se manchavam com a culpa do aborto, e tal praxe, com penas
mais ou menos graves, foi confirmada nos sucessivos períodos históricos. O Código de Direito Canónico de 1917, para
o aborto, prescrevia a pena de excomunhão. 69
Também a legislação canónica, há pouco renovada, continua nesta linha quando
determina que «quem procurar o aborto, seguindo-se o efeito, incorre em
excomunhão latae sententiae», 70
isto é, automática. A excomunhão recai sobre todos aqueles que cometem este
crime com conhecimento da pena, incluindo também cúmplices sem cujo contributo
o aborto não se teria realizado: 71
com uma sanção assim reiterada, a Igreja aponta este crime como um dos mais
graves e perigosos, incitando, deste modo, quem o comete a ingressar
diligentemente pela estrada da conversão. Na Igreja, de facto, a finalidade da
pena de excomunhão é tornar plenamente consciente da gravidade de um
determinado pecado e, consequentemente, favorecer a adequada conversão e
penitência.
Frente
a semelhante unanimidade na tradição doutrinal e disciplinar da Igreja, Paulo
VI pôde declarar que tal ensinamento não conheceu mudança e é imutável. 72 Portanto, com a autoridade que Cristo conferiu
a Pedro e aos seus Sucessores, em comunhão com os Bispos — que de várias e
repetidas formas condenaram o aborto e que, na consulta referida anteriormente,
apesar de dispersos pelo mundo, afirmaram unânime consenso sobre esta doutrina
— declaro que o aborto directo, isto é, querido como fim ou como meio,
constitui sempre uma desordem moral grave, enquanto morte deliberada de um ser
humano inocente. Tal doutrina está fundada sobre a lei natural e sobre a
Palavra de Deus escrita, é transmitida pela Tradição da Igreja e ensinada pelo
Magistério ordinário e universal. 73
Nenhuma
circunstância, nenhum fim, nenhuma lei no mundo poderá jamais tornar lícito um
acto que é intrinsecamente ilícito, porque contrário à Lei de Deus, inscrita no
coração de cada homem, reconhecível pela própria razão, e proclamada pela
Igreja.
63.
A avaliação moral do aborto deve aplicar-se também às recentes formas de
intervenção sobre embriões humanos, que, não obstante visarem objectivos em si
legítimos, implicam inevitavelmente a sua morte. É o caso da experimentação
sobre embriões, em crescente expansão no campo da pesquisa biomédica e
legalmente admitida em alguns países. Se «devem ser consideradas lícitas as
intervenções no embrião humano, sob a condição de que respeitem a vida e a
integridade do embrião, não comportem para ele riscos desproporcionados, e
sejam orientadas para a sua cura, para a melhoria das suas condições de saúde
ou para a sua sobrevivência individual», 74
impõe-se, pelo contrário, afirmar que o uso de embriões ou de fetos humanos
como objecto de experimentação constitui um crime contra a sua dignidade de
seres humanos, que têm direito ao mesmo respeito devido à criança já nascida e
a qualquer pessoa. 75
A
mesma condenação moral vale para o sistema que desfruta os embriões e os fetos
humanos ainda vivos — às vezes «produzidos» propositadamente para este fim
através da fecundação in vitro — seja como «material biológico» à disposição,
seja como fornecedores de órgãos ou de tecidos para transplante no tratamento
de algumas doenças. Na realidade, o assassínio de criaturas humanas inocentes,
ainda que com vantagem para outras, constitui um acto absolutamente
inaceitável.
Especial
atenção há-de ser reservada à avaliação moral das técnicas de diagnose
pré-natal, que permitem individuar precocemente eventuais anomalias do
nascituro. Com efeito, devido à complexidade dessas técnicas, a avaliação em
causa deve fazer-se mais cuidadosa e articuladamente. Quando estão isentas de
riscos desproporcionados para a criança e para a mãe, e se destinam a tornar
possível uma terapia precoce ou ainda a favorecer uma serena e consciente aceitação
do nascituro, estas técnicas são moralmente lícitas. Mas, dado que as
possibilidades de cura antes do nascimento são hoje ainda reduzidas, acontece
bastantes vezes que essas técnicas são postas ao serviço de uma mentalidade
eugenista que aceita o aborto selectivo, para impedir o nascimento de crianças
afectadas por tipos vários de anomalias. Semelhante mentalidade é ignominiosa e
absolutamente reprovável, porque pretende medir o valor de uma vida humana apenas
segundo parâmetros de «normalidade» e de bem-estar físico, abrindo assim a
estrada à legitimação do infanticídio e da eutanásia.
Na
realidade, porém, a própria coragem e serenidade com que muitos irmãos nossos,
afectados por graves deficiências, conduzem a sua existência quando são aceites
e amados por nós, constituem um testemunho particularmente eficaz dos valores
autênticos que qualificam a vida e a tornam, mesmo em condições difíceis,
preciosa para o próprio e para os outros. A Igreja sente-se solidária com os
cônjuges que, com grande ansiedade e sofrimento, aceitam acolher os seus filhos
gravemente deficientes, tal como se sente grata a todas as famílias que, pela
adopção, acolhem os que são abandonados pelos seus pais por causa de limitações
ou doenças.
«Só Eu é que dou a vida e dou a morte»
(Dt 32, 39): o drama da eutanásia
Nota:
Revisão da tradução para português por ama
_________________________________________
Notas:
(em italiano)
50 Cf Cost. past. sulla Chiesa nel mondo contemporaneo Gaudium et spes, 27.
51 Cf Conc. Ecum. Vat. II, Cost. dogm. sulla Chiesa Lumen gentium, 25.
52 Congregazione per la Dottrina della Fede, Dich. sull'eutanasia Iura et
bona (5 maggio 1980), II: AAS 72 (1980), 546.
53 Giovanni Paolo II, Lett. Enc. Veritatis splendor (6 agosto 1993), 96:
AAS 85 (1993), 1209.
54 Cost. past. sulla Chiesa nel mondo contemporaneo Gaudium et spes, 51:
"Abortus necnon infanticidium nefanda sunt crimina".
55 Cf Giovanni Paolo II, Lett. ap. Mulieris dignitatem (15 agosto 1988),
14: AAS 80 (1988), 1686.
56 Lettera alle Famiglie Gratissimam sane (2 febbraio 1994), 21: AAS 86
(1994), 920.
57 Congregazione per la Dottrina della Fede, Dichiarazione sull'aborto
procurato (18 novembre 1974), 12-13: AAS 66 (1974), 738.
58 Congregazione per la Dottrina della Fede, Istr. circa il rispetto della
vita umana nascente e la dignità della procreazione Donum vitae (22 febbraio
1987), I, 1: AAS 80 (1988), 78-79.
59 Ibid., l. c., 79.
60 Così il profeta Geremia: "Mi fu rivolta la parola del Signore:
"Prima di formarti nel grembo materno, ti conoscevo, prima che tu uscissi
alla luce, ti avevo consacrato; ti ho stabilito profeta delle nazioni""
(1, 4-5). Il Salmista, per parte sua, così si rivolge al Signore: "Su di
te mi appoggiai fin dal grembo materno, dal seno di mia madre tu sei il mio
sostegno" (Sal 71[70], 6; cf Is 46, 3; Gb 10, 8-12; Sal 22[21], 10-11).
Anche l'evangelista Luca - nello stupendo episodio dell'incontro delle due
madri, Elisabetta e Maria, e dei due figli, Giovanni Battista e Gesù, ancora
nascosti nel grembo materno (cf 1, 39-45) - sottolinea come il bambino avverte
l'arrivo del Bambino ed esulta di gioia.
61 Cf Dichiarazione sull'aborto procurato (18 novembre 1974): AAS 66
(1974), 740-747.
62 "Non farai perire il bambino con l'aborto, né l'ucciderai dopo che
è nato": V, 2, Patres Apostolici, ed. F. X. FUNK, I, 17.
63 Apologia per i cristiani, 35: PG 6, 969.
64 Apologeticum, IX, 8: CSEL 69, 24.
65 Cf Lett. enc. Casti connubii (31 dicembre 1930), II: AAS 22 (1930),
562-592.
66 Discorso all'Unione medico-biologica "S. Luca" (12 novembre
1944): Discorsi e radiomessaggi VI (1944-1945), 191; cf Discorso all'Unione
Cattolica Italiana delle Ostetriche (29 ottobre 1951), II: AAS 43 (1951), 838.
67 Lett. enc. Mater et Magistra (15 maggio 1961), 3: AAS 53 (1961), 447.
68 Cost. past. sulla Chiesa nel mondo contemporaneo Gaudium et spes, 51.
69 Cf Can. 2350, § 1.
70 Codice di Diritto Canonico, can. 1398; cf pure Codice dei canoni delle
Chiese Orientali, can. 1450, §2.
71 Cf Ibid., can. 1329; parimenti Codice dei Canoni delle Chiese Orientali,
can. 1417.
72 Cf Discorso ai Giuristi Cattolici Italiani (9 dicembre 1972): AAS 64
(1972), 777; Lett. enc. Humanae vitae (25 luglio 1968), 14: AAS 60 (1968), 490.
73 Cf Conc. Ecum. Vat. II, Cost. dogm. sulla Chiesa Lumen gentium, 25.
74 Congregazione per la Dottrina della Fede, Istr. circa il rispetto della
vita umana nascente e la dignità della procreazione Donum vitae (22 febbraio
1987), I, 3: AAS 80 (1988), 80.
75 Carta dei diritti della
famiglia (22 ottobre 1983), art. 4b, Tipografia Poliglotta Vaticana, 1983.
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