16/06/2012

Tratado dos anjos 73

Questão 64: Da pena dos demónios.


Art. 3 — Se há dor nos demónios.

 

O terceiro discute-se assim. — Parece que não há dor nos demónios.

 

1. — Pois, a dor e a alegria, opondo-se mutuamente, não podem simultaneamente existir no mesmo ser. Ora, nos demónios há alegria; porquanto Agostinho diz: O diabo tem poder sobre aqueles que desprezam os preceitos de Deus, e se alegram com esse tão infeliz poder. Logo, neles não há dor.

 

2. Demais. — A dor é a causa do temor; pois, tememos o futuro daquilo que sofremos, quando é presente. Ora, nos demónios não há temor, conforme a Escritura: Foi feito para que não temesse a nada. Logo, neles não há dor.

 

3. Demais. — Doer-se do mal é bom. Ora, os demónios não podem fazer o bem. Logo, não podem ter dor, ao menos pelo mal da culpa, o relativo ao verme da consciência.

 

Mas, em contrário, o pecado do demónio é mais grave que o do homem. Ora, este é punido pela dor, por causa do deleite no pecado, segundo a Escritura: Quanto ela se tem glorificado e vivido em deleites, tanto lhe daí de tormento e pranto. Logo, com maioria de razão, o diabo, que se glorificou maximamente, é punido pelo pranto da dor.

 O temor, a dor, a alegria e outras paixões, como tais, não podem existir nos demónios; pois, como tais, pertencem propriamente ao apetite sensitivo, virtude que se exerce pelo órgão corpóreo. Mas, enquanto designam actos simples da vontade, podem existir neles; sendo necessário então dizer que neles há dor. Pois esta, significando acto simples da vontade, não é senão o recalcitrar desta quanto ao que é ou ao que não é. Ora, é claro, os demónios querem não ser muitas coisas que são, e fossem muitas que não são; assim, invejosos, querem que fossem danados os que se salvam. Donde, é forçoso admitir que neles há dor; e, precipuamente, porque é da natureza da pena repugnar à vontade. Ora, eles estão privados da beatitude, que naturalmente desejam; e, em muitos deles, é reprimida a vontade iníqua.

 

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — A dor e a alegria, relativamente ao mesmo objeto, são opostos; não são porém, relativamente a objetos diversos. Donde, nada impede que alguém simultaneamente se doa de uma coisa e goze com outra; e sobretudo enquanto a dor e a alegria supõem actos simples da vontade, pois não só em relação a coisas diversas, mas também em relação a uma mesma coisa, pode haver algo que queremos e algo que não.

 

RESPOSTA À SEGUNDA. — Assim como, nos demónios, há a dor do presente, assim há o temor do futuro. E a expressão — Foi feito para que não temesse a nada — entende-se do temor de Deus, que coíbe o pecado. Pois está escrito algures, que os demónios crêem e estremecem.

 

RESPOSTA À TERCEIRA. — O doer-se do mal da culpa, em si mesma, atesta a bondade da vontade, à qual esse mal se opõe. Doer-se porém do mal da pena, ou do mal da culpa, por causa da pena, atesta a bondade da natureza, à qual o mal da pena se opõe. Por isso Agostinho diz, que a dor do bem perdido, no suplício, é testemunho da natureza boa. Logo, o demónio, de vontade perversa e obstinada, não se dói do mal da culpa.


Nota: Revisão da tradução para português por ama

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