Art. 3 — Se o firmamento divide umas, de outras águas.
O
terceiro discute-se assim. — Parece que o firmamento não divide umas, de outras
águas.
1.
— Pois, cada corpo tem, especificamente, o seu lugar natural. Ora, água é da
mesma espécie que água, como diz o Filósofo. Logo, não se podem distinguir,
localmente, umas, de outras águas.
2.
Demais. — Se se disser que essas águas da parte superior do firmamento são de
outra espécie que as da parte inferior, digo em contrário o seguinte. — Seres
especificamente diversos não precisam de outro que os distingam. Se, pois, as
águas superiores e inferiores diferem especificamente, o firmamento não as
distingue umas, de outras águas.
3.
Demais. — Só pode distinguir umas, de outras águas o que é tocado delas por
ambos os lados; como a parede levantada no meio de um rio. Ora, é manifesto, as
águas inferiores não atingem o firmamento. Logo, este não divide umas, de
outras águas.
Mas,
em contrário, diz a Escritura: Faça-se o firmamento no meio das águas, e separe
umas águas das outras águas.
Quem considerasse superficialmente a letra do Génesis, poderia ter tal
imaginação, segundo a posição de certos filósofos antigos, que ensinavam ser a
água um corpo infinito, princípio de todos os outros corpos. E que essa
imensidade das águas podia estar expressa na denominação de abismo, quando a
Escritura diz: As trevas cobriram a face do abismo. E também ensinavam que esse
céu sensível, que vemos, não contém abaixo de si todos os seres corporais, mas
é o corpo infinito das águas superiores ao céu. E assim, poder-se-ia dizer que
o firmamento do céu divide as águas exteriores das interiores, i. é, de todos
os corpos contidos abaixo do céu, cujo princípio ensinavam ser a água.
Como
porém se demonstra por verdadeiras razões a falsidade dessa doutrina, não
podemos considerá-la como expressiva do sentido da Escritura. Mas devemos
atender a que Moisés, falando a um povo rude, e condescendendo com a ignorância
deles, propôs-lhes só o manifestamente aparente aos sentidos. Pois todos, por
mais rudes que sejam, depreendem pelos sentidos que a terra e a água são corpos.
Mas já nem todos percebem que o ar é corpo; a ponto de até certos filósofos
dizerem que o ar não é nada, chamando vácuo ao que está cheio de ar. Por isso,
Moisés faz menção expressa da água e da terra, sem nomear o ar, para não propor
nada de ignoto a gente rude. Mas, para exprimir a verdade aos capazes, dá lugar
para se compreender o que seja o ar, denominando-o como anexo à água, quando
diz que as trevas cobriam a face do abismo; dando assim a entender que sobre a
face das águas há um corpo diáfano, sujeito da luz e das trevas.
Quer,
pois, entendamos, por firmamento, o céu onde estão as estrelas, ou o espaço
nebuloso do ar, com propriedade se diz que o firmamento divide umas, de outras
águas, sendo estas ou a matéria informe, ou todos os corpos diáfanos, incluídos
nessa comum denominação. Pois, o céu sidéreo distingue os corpos inferiores
diáfanos dos superiores; ao passo que o ar nebuloso distingue a parte superior
do ar, onde se geram as chuvas e outras impressões, da inferior, conexa com as
águas e compreendida nesta denominação.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Se por firmamento se entende o céu sidéreo, as
águas superiores não são da mesma espécie que as inferiores. Se porém se
entende o ar nebuloso, então ambas as águas são da mesma espécie;
deputando-se-lhes dois lugares, embora não pela mesma razão; pois, o lugar
superior é o da geração delas e o inferior, do repouso.
RESPOSTA
À SEGUNDA. — Se se admitem as águas como especificamente diversas, diz-se que o
firmamento as divide, não como causa da divisão, mas como limite de umas e
outras.
Resposta
à terceira. — Moisés, por causa da invisibilidade do ar e de corpos
semelhantes, compreendeu todos os corpos dessa natureza na denominação de água.
Por onde, é manifesto que há águas de ambos os lados do firmamento, como quer
que se compreenda este.
Nota: Revisão da tradução para português por ama
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.