O
terceiro discute-se assim. — Parece que os anjos não foram criados em graça.
1.
— Pois, Agostinho diz: A natureza angélica foi primeiro criada informe e era
chamada céu; porém, depois, recebeu forma e se chamou luz. Ora, esta formação
se realizou pela graça. Logo, os anjos não foram criados em graça.
2.
Demais. — A graça inclina a criatura racional para Deus. Se, portanto, o anjo
tivesse sido criado em graça, nenhum se teria desviado de Deus.
3.
Demais. — A graça é um meio-termo entre a natureza e a glória. Ora, os anjos
não foram bem-aventurados desde a sua criação. Logo, também não foram criados
em graça, mas primeiro só tiveram a natureza; depois alcançaram a graça e, por
último, foram beatificados.
Mas,
em contrário, diz Agostinho: Quem estabeleceu os anjos na sua vontade boa,
senão aquele que os criou com a sua vontade, i. é, com o casto amor a que eles
aderem, constituindo-os simultaneamente em a sua natureza e repartindo-lhes a
graça?
São diversas as opiniões nesta matéria. Embora uns dissessem que os anjos
foram criados com os seus dons naturais somente; e outros, que o foram em
graça, contudo, como mais provável e consentâneo aos ditos dos santos, deve-se
admitir que foram criados em graça santificante. Assim, pois, vemos que todas
as coisas criadas no decurso do tempo, por obra da divina providência, e produzidos
pela operação de Deus, foram produzidas na primeira condição delas mediante
certas razões seminais, como diz Agostinho; assim as árvores, os animais, e
seres semelhantes. Ora, é manifesto que a graça santificante está para a
beatitude, como a razão seminal, em a natureza, para o efeito natural; por
onde, a graça é chamada na Escritura, a semente de Deus. Como pois, segundo a
opinião de Agostinho, se ensina que imediatamente, desde a primeira criação da
criatura corpórea, foram-lhe infundidos as razões seminais de todos os efeitos
naturais; assim também, imediatamente, desde o princípio, os anjos foram
criados em graça.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Essa informidade do anjo pode-se compreender
por comparação com a formação da glória e, então, a informidade precedeu
temporalmente a formação; ou por comparação com a formação da graça e, assim,
aquela precedeu a esta não temporal, mas naturalmente, como também Agostinho o
ensina a respeito da formação corporal.
RESPOSTA
À SEGUNDA. — Toda forma inclina o seu sujeito ao modo da natureza deste. Ora, o
modo natural da natureza intelectual é que se conduza ao que quer, livremente.
Por onde, a inclinação da graça não impõe necessidade, mas quem tem a graça
pode não usar dela e pecar.
RESPOSTA
À TERCEIRA. — Embora a graça seja o meio-termo entre a natureza e a glória, na
ordem da natureza; todavia, na ordem do tempo, não deviam simultaneamente
existir, em a natureza criada, a glória e a natureza, pois a glória é o fim da
operação da própria natureza, ajudada pela graça. A graça, porém, não se
comporta como fim da operação, porque não resulta das obras, mas é o princípio
de bem operar. E portanto, era conveniente dar a graça imediatamente, com a
natureza.
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