Não abandones a tua leitura espiritual.
A leitura tem feito muitos santos.
(S. josemaria, Caminho 116)
Está aconselhada a leitura espiritual diária de mais ou menos 15 minutos. Além da leitura do novo testamento, (seguiu-se o esquema usado por P. M. Martinez em “NOVO TESTAMENTO” Editorial A. O. - Braga) devem usar-se textos devidamente aprovados. Não deve ser leitura apressada, para “cumprir horário”, mas com vagar, meditando, para que o que lemos seja alimento para a nossa alma.
Para ver, clicar SFF.
Evangelho: Jo 8, 21-41
21
Jesus disse-lhes mais: «Eu retiro-Me: vós Me buscareis, e morrereis no vosso
pecado. Para onde Eu vou, vós não podeis ir». 22 Diziam, pois, os judeus: «Será
que Ele Se mate a Si mesmo, pois diz: Para onde Eu vou, vós não podeis ir?». 23
Ele disse-lhes: «Vós sois cá de baixo, Eu sou lá de cima. Vós sois deste mundo,
Eu não sou deste mundo. 24 Por isso Eu vos disse que morreríeis nos vossos
pecados; sim, se não crerdes que “Eu sou”, morrereis nos vossos pecados». 25
Disseram-Lhe então eles: «Quem és Tu?». Jesus respondeu-lhes: «É exactamente
isso que Eu vos estou a dizer. 26 Muitas coisas tenho a dizer e a julgar a
vosso respeito, mas O que Me enviou é verdadeiro e o que ouvi d'Ele é o que
digo ao mundo». 27 Eles não compreenderam que Jesus lhes falava do Pai.28 Jesus
disse-lhes mais: «Quando tiverdes levantado o Filho do Homem, então conhecereis
que “Eu sou” e que nada faço por Mim mesmo, mas que, como o Pai Me ensinou,
assim falo. 29 O que Me enviou está comigo, não Me deixou só, porque Eu faço
sempre aquilo que é do Seu agrado». 30 Dizendo estas coisas, muitos acreditaram
n'Ele. 31 Jesus disse então aos judeus que creram n'Ele: «Se vós permanecerdes
na Minha palavra sereis verdadeiramente Meus discípulos, 32 conhecereis a
verdade e a verdade vos fará livres». 33 Eles responderam-Lhe: «Nós somos descendentes
de Abraão e nunca fomos escravosde ninguém; como dizes Tu: Sereis livres?». 34
Jesus respondeu-lhes: «Em verdade, em verdade vos digo que todo aquele que
comete pecado é escravo do pecado. 35 Ora o escravo não fica para sempre na
casa, mas o filho é que fica nela para sempre. 36 Por isso, se o Filho vos
livrar, sereis verdadeiramente livres. 37 Bem sei que sois descendentes de
Abraão, mas procurais matar-Me porque a Minha palavra não penetra em vós. 38 Eu
digo o que vi em Meu Pai; e vós fazeis o que ouvistes do vosso pai». 39 Eles
replicaram: «O nosso pai é Abraão». Jesus disse-lhes: «Se sois filhos de
Abraão, fazei as obras de Abraão. 40 Mas agora procurais matar-Me, a Mim, que
vos disse a verdade que ouvi de Deus. Abraão nunca fez isto. 41 Vós fazeis as
obras do vosso pai». Eles disseram-Lhe: «Nós não somos filhos da prostituição,
temos um pai que é Deus».
Ioannes Paulus PP. II
Redemptoris Mater
sobre
a Bem Aventurada
Virgem
Maria
na
vida da Igreja que está a caminho
/…4
21.
Sob este ponto de vista, é particularmente eloquente aquele texto do Evangelho
de São João, que nos apresenta Maria nas bodas de Caná. Maria aparece aí como
Mãe de Jesus, que estava nos princípios da sua vida pública:
"Celebravam-se umas bodas em Caná de Galileia; e encontrava-se lá a mãe de
Jesus. Foi também convidado para as bodas Jesus, com os seus discípulos (Jo
2, 1-2). Do texto resultaria que Jesus e os seus discípulos foram
convidados juntamente com Maria, quiçá por motivo da presença dela nessa festa:
o Filho parece ter sido convidado em atenção à Mãe. É conhecida a sequência dos
factos relacionados com esse convite: aquele "início dos milagres"
feitos por Jesus - a água transformada em vinho - que leva o Evangelista a
dizer: Jesus "manifestou a sua glória e os seus discípulos acreditaram
nele" (Jo 2, 11).
Maria
está presente em Caná de Galileia como Mãe de Jesus e contribui, de modo
significativo, para aquele "início dos milagres", que revelam o poder
messiânico do seu Filho. "Ora, vindo a faltar o vinho, a Mãe de Jesus
disse-lhe: "não têm mais vinho". E Jesus respondeu-lhe: "Que
importa isso, a mim e a ti, ó mulher? Ainda não chegou a minha hora""
(Jo 2, 3-4). No Evangelho de São João aquela "hora" significa
o momento estabelecido pelo Pai, em que o Filho levará a cabo a sua obra e
há-de ser glorificado (cf. Jo 7, 30; 8, 20; 12, 23. 27; 13, 1; 17, 1; 19,
27). Muito embora a resposta de Jesus à sua Mãe tenha as aparências de
uma recusa (sobretudo se, mais do que na interrogação, se reparar naquela
afirmação firme: "Ainda não chegou a minha hora"), mesmo assim Maria
dirige-se aos que serviam e diz-lhes: "Fazei aquilo que ele vos
disser" (Jo 2, 5). Então Jesus ordena a esses servos que encham
as talhas de água; e a água transforma-se em vinho, melhor do que aquele que
fora servido anteriormente aos convidados do banquete nupcial.
Que
entendimento profundo terá havido entre Jesus e a sua Mãe? Como se poderá
explorar o mistério da sua íntima união espiritual? De qualquer modo, o facto é
eloquente. Naquele evento é bem certo que já se delineia bastante claramente a
nova dimensão, o sentido novo da maternidade de Maria. Esta tem um significado
que não está encerrado exclusivamente nas palavras de Jesus e nos diversos episódios
referidos pelos Sinópticos (Lc 11, 27-28 e Lc 8, 19-21; Mt 12, 46-50; Mc
3, 31-35). Nestes textos Jesus tem o intuito, sobretudo, de contrapor a
maternidade que resulta do próprio facto do nascimento, àquilo que esta
"maternidade" (assim como a "fraternidade") deve ser na
dimensão do Reino de Deus, na irradiação salvífica da paternidade do mesmo
Deus. No texto de São João, ao contrário, a partir da descrição dos factos de
Caná, esboça-se aquilo em que se manifesta concretamente esta maternidade nova,
segundo o espírito e não somente segundo a carne, ou seja, a solicitude de
Maria pelos homens, o seu ir ao encontro deles, na vasta gama das suas
carências e necessidades. Em Caná da Galileia torna-se patente só um aspecto
concreto da indigência humana, pequeno aparentemente e de pouca importância
("Não têm mais vinho"). Mas é algo que tem um valor simbólico: aquele
ir ao encontro das necessidades do homem significa, ao mesmo tempo,
introduzi-las no âmbito da missão messiânica e do poder salvífico de Cristo.
Dá-se, portanto, uma mediação: Maria põe-se de permeio entre o seu Filho e os
homens na realidade das suas privações, das suas indigências e dos seus
sofrimentos. Põe-se de "permeio", isto é, faz de mediadora, não como
uma estranha, mas na sua posição de mãe, consciente de que como tal pode - ou
antes, "tem o direito de" - fazer presente ao Filho as necessidades
dos homens. A sua mediação, portanto, tem um carácter de intercessão: Maria
"intercede" pelos homens. E não é tudo: como Mãe deseja também que se
manifeste o poder messiânico do Filho, ou seja, o seu poder salvífico que se
destina a socorrer as desventuras humanas, a libertar o homem do mal que, sob
diversas formas e em diversas proporções, faz sentir o peso na sua vida.
Precisamente como o profeta Isaías tinha predito acerca do Messias, no famoso
texto a que Jesus se refere na presença dos seus conterrâneos de Nazaré:
"Para anunciar aos pobres a boa-nova me enviou, para proclamar aos prisioneiros
a libertação e aos cegos a vista..." (cf. Lc 4, 18).
Outro
elemento essencial desta função maternal de Maria pode ser captado nas palavras
dirigidas aos que serviam à mesa: "Fazei aquilo que ele vos disser".
A Mãe de Cristo apresenta-se diante dos homens como porta-voz da vontade do
Filho, como quem indica aquelas exigências que devem ser satisfeitas, para que
possa manifestar-se o poder salvífico do Messias. Em Caná, graças à intercessão
de Maria e à obediência dos servos, Jesus dá início à "sua hora". Em
Caná, Maria aparece como quem acredita em Jesus: a sua fé provoca da parte dele
o primeiro "milagre" e contribui para suscitar a fé dos discípulos.
22.
Podemos dizer, por conseguinte, que nesta página do Evangelho de São João
encontramos como que um primeiro assomo da verdade acerca da solicitude maternal
de Maria. Esta verdade teve a sua expressão também no magistério do recente
Concílio. É importante notar que a função maternal de Maria é por ele ilustrada
na sua relação com a mediação de Cristo. Com efeito, podemos aí ler: "A
função maternal de Maria para com os homens, de modo algum obscurece ou diminui
esta única mediação de Cristo; manifesta antes a sua eficácia", porque
"um só é o mediador entre Deus e os homens, o homem Cristo Jesus" (1
Tim 2, 5). Esta função maternal de Maria promana, segundo o beneplácito
de Deus, "da superabundância dos méritos de Cristo, funda-se na sua
mediação e dela depende inteiramente, aurindo aí toda a sua eficácia". 44 É precisamente neste sentido que o evento
de Caná da Galileia nos oferece como que um pré-anúncio da mediação de Maria,
toda ela orientada para Cristo e propendente para a revelação do seu poder
salvífico.
Do
texto joanino transparece que se trata de uma mediação materna. Como proclama o
Concílio: Maria "foi para nós mãe na ordem da graça". Esta maternidade
na ordem da graça resultou da sua própria maternidade divina: porque sendo ela,
por disposição da divina Providência, mãe-nutrícia do Redentor, foi associada à
sua obra, de maneira única, como "amiga generosa" e humilde
"serva do Senhor", que "cooperou... na obra do Salvador com a
obediência e com a sua fé, esperança e caridade ardente, para restaurar nas
almas a vida sobrenatural". 45
"E esta maternidade de Maria na economia da graça perdura sem
interrupção... até à consumação perpétua de todos os eleitos". 46
23.
Se esta passagem do Evangelho de São João, sobre os factos de Caná, apresenta a
maternidade desvelada de Maria no início da actividade messiânica de Cristo, há
uma outra passagem do mesmo Evangelho que confirma esta maternidade na economia
salvífica da graça no seu momento culminante, isto é, quando se realiza o
sacrifício de Cristo na Cruz, o seu mistério pascal. A descrição de São João é
concisa: "Estavam junto à Cruz de Jesus sua mãe, a irmã de sua mãe, Maria,
mulher de Clopá, e Maria de Magdala. Jesus, então, vendo a mãe e perto dela o
discípulo que amava, disse à mãe: "Mulher, eis o teu filho!". Depois,
disse ao discípulo: "Eis a tua mãe!". E a partir daquele momento, o
discípulo levou-a para a sua casa" (Jo 19-, 25-27).
Neste
episódio reconhece-se, sem dúvida, uma expressão do desvelo singular do Filho
para com a Mãe, que Ele ia deixar no meio de tanto sofrimento. Todavia, quanto
ao sentido deste desvelo, o "testamento da Cruz" de Cristo diz algo
mais. Jesus põe em relevo um vínculo novo entre Mãe e Filho, do qual confirma
solenemente toda a verdade e realidade. Pode dizer-se que, se a maternidade de
Maria em relação aos homens já tinha aflorado e se tinha delineado em
precedência, agora é claramente precisada e estabelecida: ela emerge da maturação
definitiva do mistério pascal do Redentor. A Mãe de Cristo, encontrando-se na
irradiação directa deste mistério que abrange o homem - todos e cada um dos
homens - é dada ao homem - a todos e cada um dos homens - como mãe. Este homem
aos pés da Cruz é João, "o discípulo que ele amava". 47 Porém não é ele como um só homem. A
Tradição e o Concílio não hesitam em chamar a Maria "Mãe de Cristo e Mãe
dos homens": ela está, efectivamente, associada na descendência de Adão
com todos os homens..., mais ainda, é verdadeiramente mãe dos membros (de
Cristo)..., porque cooperou com o seu amor para o nascimento dos fiéis na
Igreja". 48
Esta
"nova maternidade de Maria", portanto, gerada pela fé, é fruto do
"novo" amor, que nela amadureceu definitivamente aos pés da Cruz,
mediante a sua participação no amor redentor do Filho.
24.
Encontramo-nos assim no próprio centro do cumprimento da promessa, contida no
Proto-Evangelho: a "descendência da mulher esmagará a cabeça da
serpente" (cf. Gén 3, 15). Jesus Cristo, de facto, com a sua
morte redentora vence o mal do pecado e da morte nas suas próprias raízes. É
significativo que, dirigindo-se à Mãe do alto da Cruz, Ele lhe chame
"mulher", ao dizer-lhe: "Mulher, eis o teu filho". Com o
mesmo termo, de resto, se tinha dirigido também a ela em Caná (cf. Jo 2,
4). Como duvidar de que, especialmente agora, no alto do Gólgota, esta
frase atinja em profundidade no mistério de Maria, pondo em realce o
"lugar" singular que ela tem em toda a economia da salvação? Como
ensina o Concílio, com Maria, "excelsa Filha de Sião, passada a longa
espera da promessa, completam-se os tempos e instaura-se uma nova economia,
quando o Filho de Deus assumiu dela a natureza humana, para libertar o homem do
pecado, por meio dos mistérios da sua carne". 49
As
palavras que Jesus pronuncia do alto da Cruz significam que a maternidade da
sua Geratriz tem uma "nova" continuação na Igreja e mediante a
Igreja, simbolizada e representada por São João. Deste modo, aquela que, como
"a cheia de graça", foi introduzida no mistério de Cristo para ser
sua Mãe, isto é, a Santa Geratriz de Deus, por meio da Igreja permanece naquele
mistério como "a mulher" indicada pelo Livro do Génesis (cf. 3,
15), no princípio, e pelo Apocalipse (cf. 12, 1), no final da
história da salvação. Segundo o eterno desígnio da Providência, a maternidade
divina de Maria deve estender-se à Igreja, como estão a indicar certas
afirmações da Tradição, segundo as quais a maternidade de Maria para com a
Igreja é o reflexo e o prolongamento da sua maternidade para com o Filho de
Deus. 50
O
próprio momento do nascimento da Igreja e da sua plena manifestação ao mundo,
segundo o Concílio, já deixa entrever esta continuidade da maternidade de
Maria: "Tendo sido do agrado de Deus não manifestar solenemente o mistério
da salvação humana, antes de ter derramado o Espírito prometido por Cristo,
vemos os Apóstolos, antes do dia do Pentecostes, "assíduos e concordes na
oração, com algumas mulheres e com Maria a Mãe de Jesus e com os irmãos
dele" (Act 1, 14), implorando também Maria, com suas orações, o
dom daquele Espírito que já tinha estendido sobre ela a sua sombra, na Anunciação".
51
Sendo
assim, na economia redentora da graça, actuada sob a acção do Espírito Santo,
existe uma correspondência singular entre o momento da Incarnação do Verbo e o
momento do nascimento da Igreja. E a pessoa que une estes dois momentos é
Maria: Maria em Nazaré e Maria no Cenáculo de Jerusalém. Em ambos os casos, a
sua presença discreta, mas essencial, indica a via do "nascimento do
Espírito". Assim, aquela que está presente no mistério de Cristo como Mãe,
torna-se - por vontade do Filho e por obra do Espírito Santo - presente no
mistério da Igreja. E também na Igreja continua a ser uma presença materna,
como indicam as palavras pronunciadas na Cruz: "Mulher, eis o teu
Filho"; "Eis a tua Mãe".
SEGUNDA PARTE
A MÃE DE DEUS NO CENTRO DA IGREJA QUE
ESTÁ A CAMINHO
1. A Igreja, Povo de Deus presente em
todas as nações da terra
25.
"A Igreja "prossegue a sua peregrinação no meio das perseguições do
mundo e das consolações de Deus", 52
anunciando a paixão e a morte do Senhor até que ele venha (cf. 1 Cor
11,26)". 53
"Assim como Israel segundo a carne, que peregrinava no deserto, é já
chamado Igreja de Deus (cf. Esdr 13, 1; Núm 20, 4; Dt 23, 1 ss.),
também o novo Israel... se chama Igreja de Cristo (cf. Mt 16,18),
porque Ele a adquiriu com o seu próprio sangue (cf. Act 20, 28), a
encheu com o seu Espírito e a dotou com os meios adequados para a unidade
visível e social. A todos aqueles que olham com fé para Jesus, como autor da
salvação e princípio de unidade e de paz, Deus convocou-os e constituiu com
eles a Igreja, a fim de que ela seja para todos e cada um sacramento visível
desta unidade salvífica". 54
O
Concílio Vaticano II fala da Igreja que ainda está a caminho, estabelecendo uma
analogia com o Israel da Antiga Aliança em peregrinação através do deserto. A
peregrinação possui um carácter também externo, visível no tempo e no espaço,
em que ela se efectua historicamente. A Igreja, de facto, "devendo
estender-se a toda a terra", "entra na história dos homens, mas
simultaneamente transcende os tempos e as fronteiras dos povos". 55 Porém, o carácter essencial desta
peregrinação da Igreja é interior: trata-se de uma peregrinação mediante a fé,
pela "virtude do Senhor ressuscitado", 56
de uma peregrinação no Espírito Santo, que foi dado à Igreja como Consolador
invisível (paraklétos) (cf. Jo 14,26; 15, 26; e 16,7): "Por
entre as tentações e tribulações que vai encontrando no seu peregrinar, a
Igreja é confortada pela força da graça de Deus, que lhe foi prometida pelo
Senhor, para que... não cesse nunca de renovar-se, com o auxílio do Espírito
Santo, até que, pela Cruz, chegue àquela luz que não conhece ocaso". 57
Precisamente
ao longo desta caminhada-peregrinação eclesial, através do espaço e do tempo e,
mais ainda, através da história das almas, Maria está presente, como aquela que
é "feliz porque acreditou", como aquela que avançava na peregrinação
da fé, participando como nenhuma outra criatura no mistério de Cristo. Diz
ainda o Concílio que "Maria... pela sua participação íntima na história da
salvação, reúne, por assim dizer, e reflecte em si os imperativos mais altos da
fé". 58 Ela é, entre todos
os que acreditam, como um "espelho", em que se reflectem da maneira
mais profunda e mais límpida "as maravilhas de Deus" (Act 2, 11).
26.
Edificada por Cristo sobre os Apóstolos, a Igreja tornou-se plenamente cônscia
destas "maravilhas de Deus" no dia do Pentecostes, quando os que
estavam congregados no Cenáculo de Jerusalém "ficaram todos cheios do
Espírito Santo e começaram a falar outras línguas, segundo o Espírito Santo
lhes concedia que se exprimissem" (Act 2, 4). A partir desse
momento começa também aquela caminhada de fé, a peregrinação da Igreja através
da história dos homens e dos povos. É sabido que, ao iniciar-se essa caminhada,
Maria se encontrava presente; vemo-la no meio dos Apóstolos no Cenáculo de Jerusalém,
"implorando com as suas orações o dom do Espírito". 59
A
sua caminhada de fé, em certo sentido, é mais longa. O Espírito Santo já tinha
descido sobre ela, que se tornou sua fiel esposa na Anunciação, acolhendo o
Verbo de Deus vivo, rendendo "o obséquio pleno da inteligência e da
vontade e prestando o voluntário assentimento à Sua revelação"; ou melhor,
abandonando-se totalmente nas mãos de Deus, "mediante a obediência de
fé", 60 pelo que respondeu
ao Anjo: "Eis a serva do Senhor! Faça-se em mim segundo a tua
palavra" (Lc 1, 38). Assim, a caminhada de fé de Maria, que
vemos a orar no Cenáculo, é "mais longa" do que a dos outros que aí
se encontravam reunidos: Maria "precede-os", "vai adiante"
deles. 61 O momento do
Pentecostes em Jerusalém foi preparado pelo momento da Anunciação em Nazaré. No
Cenáculo, o "itinerário" de Maria encontra-se com a caminhada da fé
da Igreja. E de que modo?
Entre
aqueles que eram assíduos à oração no Cenáculo, preparando-se para ir "por
todo o mundo" depois de receber o Espírito Santo, alguns tinham sido
chamados por Jesus, uns após outros, sucessivamente, desde os primórdios da sua
missão em Israel. Onze dentre eles tinham sido constituídos Apóstolos; e a
estes, Jesus, tinha transmitido a missão que ele próprio recebera do Pai:
"Assim como o Pai me enviou, também eu vos envio a vós" (Jo 20,
21), tinha Ele dito aos mesmos Apóstolos depois da Ressurreição. E,
passados quarenta dias, antes de voltar para o Pai, tinha acrescentado ainda:
"quando o Espírito Santo tiver descido sobre vós..., sereis minhas
testemunhas até às extremidades da terra" (cf. Act 1, 8). Esta
missão dos Apóstolos teve início a partir do momento da sua saída do Cenáculo
de Jerusalém. A Igreja nasce e começa então a crescer, mediante o testemunho
que Pedro e os demais Apóstolos dão acerca de Cristo crucificado e ressuscitado
(cf. Act 2, 31-34; 3, 15-18; 4, 10-12; 5, 30-32).
Maria
não recebeu directamente esta missão apostólica. Não se encontrava entre
aqueles que Jesus enviou "por todo o mundo para ensinar todas as
gentes" (cf. Mt 28, 19), quando lhes conferiu tal missão. Estava,
porém, no Cenáculo, onde os Apóstolos se preparavam para assumir esta sua
missão com a vinda do Espírito da Verdade: Maria estava com eles. No meio deles
ela era "assídua na oração" como Mãe de Jesus" (cf. Act 1,
13-14), ou seja, de Cristo crucificado e ressuscitado. E esse primeiro
núcleo daqueles que se voltavam "com fé para Jesus Cristo, autor da
salvação", 62 estava
consciente de que o mesmo Jesus era o Filho de Maria e que ela era sua Mãe; e
como tal desde o momento da concepção e do nascimento, ela era uma testemunha
especial do mistério de Jesus, daquele mistério que tinha sido expresso e
confirmado diante dos seus olhos com a Cruz e a Ressurreição. A Igreja,
portanto, desde o primeiro momento, "olhou" para Maria através de
Jesus, como também "olhou" para Jesus através de Maria. Ela foi para
a Igreja de então e de sempre uma testemunha singular dos anos da infância de
Jesus e da sua vida oculta em Nazaré, período em que ela "conservava todas
estas coisas, ponderando-as no seu coração" (Lc 2, 19; Lc 2, 51).
Mas
na Igreja de então como na Igreja de sempre, Maria foi e é, sobretudo, aquela
que é "feliz porque acreditou": foi quem primeiro acreditou. Desde o
momento da Anunciação e da concepção e depois do nascimento na gruta de Belém,
Maria acompanhou passo a passo Jesus, na sua materna peregrinação de fé.
Acompanhou-o ao longo dos anos da sua vida oculta em Nazaré; acompanhou-o
também durante o período da separação externa, quando ele começou a dedicar-se
às "obras e ao ensino" (cf. Act 1, 1) no seio de Israel; e
acompanhou-o, sobretudo, na experiência trágica do Gólgota. E agora, enquanto
Maria se encontrava com os Apóstolos no Cenáculo de Jerusalém, nos alvores da
Igreja, recebia confirmação a sua fé, nascida das palavras da Anunciação. O
Anjo tinha-lhe dito então: "Conceberás e darás à luz um filho, ao qual
porás o nome de Jesus. Ele será grande... e reinará eternamente sobre a casa de
Jacob e o seu reinado não terá fim" (Lc 1, 32-33). Os
acontecimentos do Calvário, havia pouco ainda, tinham envolvido em trevas esta
promessa; e contudo, mesmo aos pés da Cruz, não tinha desfalecido a fé de
Maria. Ela, ainda ali, permanecia aquela que, como Abraão, "acreditou,
esperando contra toda a esperança" (Rom 4, 18). E assim, depois
da Ressurreição, a esperança tinha desvelado o seu verdadeiro rosto e a
promessa tinha começado a transformar-se em realidade. Com efeito, Jesus, antes
de voltar para o Pai, dissera aos Apóstolos: "Ide e ensinai todas as gentes...
Eis que eu estou convosco, todos os dias, até ao fim do mundo" (cf.
Mt 28, 19. 20). Dissera assim aquele que, com a sua Ressurreição, se
tinha revelado como o triunfador da morte, como o detentor de um reinado
"que não terá fim", conforme o Anjo tinha anunciado.
(Nota:
Revisão da tradução para português por ama)
______________________________________
Notas
(em latim):
(45) Const. dogm. Lumen Gentium, de
Ecclesia, 61.
(46) Ibid., 62.
(47) Nota quidem sunt verba, quae scripsit
Origenes de Maria et Ioanne in Calvariae loco praesentibus: « Audeamus igitur
dicere primitias Scripturarum omnium Evangelium esse; Evangeliorurn vero
primitias, Evangelium a Ioanne traditum; cuius sensum percipere nemo potest,
nisi qui supra pectus Iesu recubuerit, vel acceperit a Iesu Mariam, quae etiam
ipsius mater fiat »: Comm. in Evang Ioan., I, 6: PG 14, 31; cfr. S. AMBROSIUS,
Expos. Evang. sec. Lucam, X, 129-131: CSEL 32/4, 504 s.
(48) Const. dogm. Lumen Gentium de Ecclesia
54 et 53; hic textus Concilii memorat S. AUGUSTINUM, De Sancta Virginitate, VI,
6: PL 40, 399.
(49) Const. dogm. Lumen Gentium de
Ecclesia, 55.
(50) Cfr. S. LEO MAGNUS, Tractatus 26, de
Natale Domini, 2: CCL 138, 126.
(51) Const. dogm. Lumen Gentium de
Ecclesia, 59.
(52) S. AUGUSTINUS, De Civitate Dei, XVIII,
51, 2: CCL 48, 650.
(53) OEC. VAT. II, Const. dogm. Lumen
Gentium de Ecclesia, 8.
(54) Ibid., 9.
(55) Ibid., 9.
(56) Ibid., 8.
(57) Ibid., 9.
(58) Ibid., 65.
(59) Ibid., 59.
(60) Cfr. CONC. OEC. VAT. II, Const. dogm.
Dei Verbum de Divina Revelatione, 5.
(61) Cfr. CONC. OEC. VAT. II, Con st. dogm.
Lumen Gentium de Ecclesia, 63.
(62) Cfr. CONC. OEC. VAT. II, Con st. dogm.
Lumen Gentium de Ecclesia, 9.
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