Não abandones a tua leitura espiritual.
A leitura tem feito muitos santos.
(S. josemaria, Caminho 116)
Está aconselhada a leitura espiritual diária de mais ou menos 15 minutos. Além da leitura do novo testamento, (seguiu-se o esquema usado por P. M. Martinez em “NOVO TESTAMENTO” Editorial A. O. - Braga) devem usar-se textos devidamente aprovados. Não deve ser leitura apressada, para “cumprir horário”, mas com vagar, meditando, para que o que lemos seja alimento para a nossa alma.
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Evangelho: Jo 7, 1-24
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Evangelho: Jo 7, 1-24
1 Depois disto, andava Jesus pela
Galileia; não queria andar pela Judeia, visto que os judeus O queriam matar. 2
Estava próxima a festa dos judeus chamada dos Tabernáculos. 3
Disseram-Lhe, pois, Seus irmãos: «Sai daqui e vai para a Judeia a fim de que
também os Teus discípulos vejam as obras que fazes. 4 Porque ninguém
que deseja ser conhecido em público faz coisa alguma em segredo. Já que fazes
estas coisas, manifesta-Te ao mundo». 5 Nem mesmo os Seus irmãos
acreditavam n'Ele. 6 Jesus disse-lhes: «Ainda não chegou o Meu
tempo; para vós é sempre tempo. 7 O mundo não pode odiar-vos, mas
odeia-Me a Mim, porque faço ver que as suas obras são más. 8 Vós,
ide a essa festa; Eu não vou, porque não chegou ainda o Meu tempo». 9
Tendo dito isto, deixou-Se ficar na Galileia. 10 Mas, quando Seus
irmãos já tinham partido, então foi Ele também à festa, não publicamente, mas
como que em segredo. 11 Ora os judeus procuravam-n'O no dia da festa
e diziam: «Onde está Ele?». 12 E havia entre o povo muitos
comentários acerca d'Ele. Uns diziam: «É um homem de bem». Outros, porém,
diziam: «Não é, antes engana o povo». 13 Ninguém, contudo, ousava
falar d'Ele livremente por terem medo dos judeus. 14 Estando já em
meio os dias da festa, foi Jesus ao templo e ensinava. 15
Admiravam-se os judeus, dizendo: «Como sabe Este de letras não tendo
estudado?». 16 Jesus respondeu-lhes: «A Minha doutrina não é Minha,
mas d'Aquele que Me enviou. 17 Se alguém quiser fazer a vontade
d'Ele, reconhecerá se a Minha doutrina vem de Deus ou se falo de Mim mesmo. 18
Quem fala de si mesmo busca a própria glória; mas Aquele que busca a glória de
Quem o enviou, esse é verdadeiro, e não há nele iniquidade. 19
Porventura não vos deu Moisés a Lei? E, contudo, nenhum de vós observa a Lei. 20
Porque procurais vós matar-Me?». O povo respondeu: «Tu estás possesso do
demónio; quem procura matar-Te?». 21 Jesus replicou-lhes: «Eu fiz
uma só obra, e todos estais por isso maravilhados. 22 Vós, contudo,
porque Moisés vos deu a circuncisão (se bem que ela não vem de Moisés, mas dos
patriarcas), circuncidais, mesmo em dia de sábado. 23 Se, para não
se violar a Lei de Moisés, recebe um homem a circuncisão em dia de sábado,
porque vos indignais comigo porque em dia de sábado curei um homem em todo o
seu corpo? 24 Não julgueis segundo as aparências mas julgai segundo
a justiça».
Ioannes
Paulus PP. II
Redemptoris Mater
sobre
a Bem Aventurada
Virgem
Maria
na
vida da Igreja que está a caminho
1987.03.25
Bênção
Veneráveis
Irmãos, caríssimos Filhos e Filhas: saúde e Bênção Apostólica!
INTRODUÇÃO
1.
A MÃE DO REDENTOR tem um lugar bem preciso no plano da salvação, porque,
"ao chegar a plenitude dos tempos, Deus enviou o seu Filho, nascido duma
mulher, nascido sob a Lei, a fim de resgatar os que estavam sujeitos à Lei e
para que nós recebêssemos a adopção de filhos. E porque vós sois filhos, Deus
enviou aos nossos corações o Espírito do seu Filho, que clama: "Aba!
Pai!" (Gál 4, 4-6).
Com
estas palavras do Apóstolo São Paulo, que são referidas pelo Concílio Vaticano
II no início da sua exposição sobre a Bem-aventurada Virgem Maria, 1 desejo também eu começar a minha reflexão
sobre o significado que Maria tem no mistério de Cristo e sobre a sua presença
activa e exemplar na vida da Igreja. Trata-se, de facto, de palavras que
celebram conjuntamente o amor do Pai, a missão do Filho, o dom do Espírito
Santo, a mulher da qual nasceu o Redentor e a nossa filiação divina, no
mistério da "plenitude dos tempos". 2
Esta
"plenitude" indica o momento, fixado desde toda a eternidade, em que
o Pai enviou o seu Filho, "para que todo o que n'Ele crer não pereça, mas
tenha a vida eterna" (Jo 3, 16). Ela designa o momento
abençoado em que "o Verbo, que estava junto de Deus,... se fez carne e
habitou entre nós" (Jo 1, 1. 14), fazendo-se nosso irmão. Esta
"plenitude" marca o momento em que o Espírito Santo que já tinha
infundido a plenitude de graça em Maria de Nazaré, plasmou no seu seio virginal
a natureza humana de Cristo. A mesma "plenitude" denota aquele
momento, em que, pelo ingresso do eterno no tempo, do divino no humano, o
próprio tempo foi redimido e, tendo sido preenchido pelo mistério de Cristo, se
torna definitivamente "tempo de salvação". Ela assinala, ainda, o
início arcano da caminhada da Igreja. Na Liturgia, de facto, a Igreja saúda
Maria de Nazaré como seu início, 3
por isso mesmo que já vê projectar-se, no evento da Conceição imaculada, como
que antecipada no seu membro mais nobre, a graça salvadora da Páscoa; e,
sobretudo, porque no acontecimento da Incarnação se encontram indissoluvelmente
ligados Cristo e Maria Santíssima: Aquele que é o seu Senhor e a sua Cabeça e
Aquela que, ao pronunciar o primeiro "fiat" (faça-se) da Nova
Aliança, prefigura a condição da mesma Igreja de esposa e de mãe.
2.
Confortada pela presença de Cristo (cf. Mt 28, 20), a Igreja caminha
no tempo, no sentido da consumação dos séculos e procede para o encontro com o
Senhor que vem. Mas nesta caminhada - desejo realçá-lo desde já - a Igreja
procede seguindo as pegadas do itinerário percorrido pela Virgem Maria, a qual
"avançou na peregrinação da fé, mantendo fielmente a união com o seu Filho
até à Cruz". 4
Refiro
estas palavras tão densas, evocando assim a Constituição Lumen Gentium, o
documento que, no último capítulo, apresenta uma síntese vigorosa da fé e da
doutrina da Igreja sobre o tema da Mãe de Cristo, venerada como Mãe amantíssima
e como seu modelo na fé, na esperança e na caridade.
Poucos
anos depois do Concílio, o meu grande Predecessor Paulo VI houve por bem voltar
a falar da Virgem Santíssima, expondo primeiramente na Carta Encíclica Christi Matri e, em seguida, nas Exortações Apostólicas Signum Magnum e
Marialis Cultus, 5 os
fundamentos e os critérios daquela veneração singular que a Mãe de Cristo
recebe na Igreja, assim como as formas de devoção mariana - litúrgicas,
populares e privadas - em correspondência com o espírito da fé.
3.
A circunstância que agora me impele também a mim a retomar este assunto é a
perspectiva do Ano Dois Mil, que já está próximo, no qual o Jubileu bimilenário
do nascimento de Jesus Cristo, nos leva a volver o olhar simultaneamente para a
sua Mãe. Nestes anos mais recentes, foram aparecendo diversos alvitres que
apontavam a oportunidade de fazer anteceder a comemoração bimilenária de um
outro Jubileu análogo, dedicado à celebração do nascimento de Maria Santíssima.
Na
realidade, se não é possível estabelecer um momento cronológico preciso para aí
fixar o nascimento de Maria, tem sido constante da parte da Igreja a
consciência de que Maria apareceu antes de Cristo no horizonte da história da
salvação. 6 É um facto que, ao
aproximar-se definitivamente a "plenitude dos tempos", isto é, o
advento salvífico do Emanuel, Aquela que desde a eternidade estava destinada a
ser sua Mãe já existia sobre a terra. Esta sua "precedência", em
relação à vinda de Cristo, tem anualmente os seus reflexos na liturgia do
Advento. Por conseguinte, se os anos que nos vão aproximando do final do
Segundo Milénio depois de Cristo e do início do Terceiro forem cotejados com
aquela antiga expectativa histórica do Salvador, torna- se perfeitamente compreensível
que neste período desejemos voltar-nos de modo especial para Aquela que, na
"noite" da expectativa do Advento, começou a resplandecer como uma
verdadeira "estrela da manhã" (Stella matutina). Com efeito, assim
como esta estrela, conjuntamente à "aurora", precede o nascer do sol,
assim também Maria, desde a sua Conceição imaculada, precedeu a vinda do
Salvador, o nascer do "sol da justiça" na história do género humano. 7
A
sua presença no meio do povo de Israel - tão discreta que passava quase despercebida
aos olhos dos contemporâneos - brilhava bem clara diante do Eterno, que tinha
associado esta ignorada "Filha de Sião" (cf. Sof 3, 14; Zac 2,
14) ao plano salvífico que compreendia toda a história da humanidade. Com
razão, pois, no final deste Milénio, nós cristãos, que sabemos ser o plano
providencial da Santíssima Trindade a realidade central da revelação e da fé,
sentimos a necessidade de pôr em relevo a presença singular da Mãe de Cristo na
história, especialmente no decorrer deste último período de tempo que precede o
Ano Dois Mil.
4.
Para isso nos prepara já o Concílio Vaticano II, ao apresentar no seu
magistério a Mãe de Deus no mistério de Cristo e da Igreja. Com efeito, se
"o mistério do homem só se esclarece verdadeiramente no mistério do Verbo
Incarnado" - como proclama o mesmo Concílio 8 - então é necessário aplicar
este princípio, de modo muito particular, àquela excepcional "filha da
estirpe humana", àquela "mulher" extraordinária que se tornou
Mãe de Cristo. Só no mistério de Cristo "se esclarece" plenamente o
seu mistério. Foi assim, de resto, que a Igreja, desde o princípio, procurou
fazer a sua leitura: o mistério da Incarnação permitiu-lhe entender e
esclarecer cada vez melhor o mistério da Mãe do Verbo Incarnado. Neste
aprofundamento teve uma importância decisiva o Concílio de Éfeso (a. 431),
durante o qual, com grande alegria dos cristãos, a verdade sobre a maternidade
divina de Maria foi confirmada solenemente como verdade de fé da Igreja. Maria
é a Mãe de Deus (= Theotókos), uma vez que, por obra do Espírito Santo,
concebeu no seu seio virginal e deu ao mundo Jesus Cristo, o Filho de Deus
consubstancial ao Pai. 9 "O
Filho de Deus... ao nascer da Virgem Maria, tornou-se verdadeiramente um de
nós...", 10 fez-se homem.
Deste modo, pois, mediante o mistério de Cristo, resplandece plenamente no
horizonte da fé da Igreja o mistério da sua Mãe. O dogma da maternidade divina
de Maria, por sua vez, foi para o Concílio de Éfeso e é para a Igreja como que
uma chancela no dogma da Incarnação, em que o Verbo assume realmente, sem a
anular, a natureza humana na unidade da sua Pessoa.
5.
O Concílio Vaticano II, apresentando Maria no mistério de Cristo, encontra
desse modo o caminho para aprofundar também o conhecimento do mistério da
Igreja. Maria, de facto, como Mãe de Cristo, está unida de modo especial com a
Igreja, "que o Senhor constituiu como seu corpo". 11 O texto conciliar põe bem próximas uma da
outra, significativamente, esta verdade sobre a Igreja como corpo de Cristo
(segundo o ensino das Cartas de São Paulo) e a verdade de que o Filho de Deus
"por obra do Espírito Santo nasceu da Virgem Maria". A realidade da
Incarnação encontra como que um prolongamento no mistério da Igreja - corpo de
Cristo. E não se pode pensar na mesma realidade da Incarnação sem fazer
referência a Maria - Mãe do Verbo Incarnado.
Nas
reflexões que passo a apresentar, porém, quero referir-me principalmente àquela
"peregrinação da fé", na qual "a Bem-aventurada Virgem Maria
avançou", conservando fielmente a união com Cristo. 12 Deste modo, aquele dúplice vínculo, que
une a Mãe de Deus com Cristo e com a Igreja, reveste-se de um significado
histórico. E não se trata aqui simplesmente da história da Virgem Maria, do seu
itinerário pessoal de fé e da "melhor parte" que ela tem no mistério
da salvação; trata-se também da história de todo o Povo de Deus, de todos
aqueles que tomam parte na mesma peregrinação da fé.
É
isto o que exprime o Concílio, ao declarar, numa outra passagem, que a Virgem
Maria "precedeu", tornando-se "a figura da Igreja, na ordem da
fé, da caridade e da perfeita união com Cristo". 13 Este seu "preceder", como
figura ou modelo, refere-se ao próprio mistério íntimo da Igreja, a qual cumpre
a própria missão salvífica unindo em si - à semelhança de Maria - as qualidades
de mãe e de virgem. É virgem que "guarda fidelidade total e pura ao seu
esposo" e "torna-se, também ela própria, mãe... pois gera para vida
nova e imortal os filhos concebidos por acção do Espírito Santo e nascidos de
Deus". 14
6.
Tudo isto se realiza num grande processo histórico e, por assim dizer,
"numa caminhada". "A peregrinação da fé" indica a história
interior, que é como quem diz a história das almas. Mas esta é também a
história dos homens, sujeitos nesta terra à condição transitória e situados nas
dimensões históricas. Nas reflexões que seguem quereria, juntamente convosco,
concentrar-me primeiro que tudo na sua fase presente, que aliás de per si não
pertence ainda à história; e, contudo, incessantemente já a vai plasmando,
também no sentido de história da salvação. Aqui abre-se um espaço amplo, no
interior do qual a Bem-aventurada Virgem Maria continua a "preceder"
o Povo de Deus. A sua excepcional peregrinação da fé representa um ponto de referência
constante para a Igreja, para as pessoas singulares e para as comunidades, para
os povos e para as nações e, em certo sentido, para toda a humanidade. É
verdadeiramente difícil abarcar e medir o seu alcance.
O
Concílio sublinha que a Mãe de Deus já é a realização escatológica da Igreja:
"na Santíssima Virgem ela já atingiu aquela perfeição sem mancha nem ruga
que lhe é própria (cf. Et 5, 27)" - e, simultaneamente, que
"os fiéis ainda têm de envidar esforços para debelar o pecado e crescer na
santidade; e, por isso, eles levantam os olhos para Maria, que brilha como
modelo de virtudes sobre toda a comunidade dos eleitos" 15 A peregrinação da fé é algo que já não
pertence à Genetriz do Filho de Deus: glorificada nos céus ao lado do próprio
Filho, a sua união com o mesmo Deus já transpôs o limiar entre a fé e a visão
"face a face" (1 Cor 13, 12). Ao mesmo tempo, porém, nesta
realização escatológica, Maria não cessa de ser a "estrela-do-mar"
(Maris Stella) 16 para todos
aqueles que ainda percorrem o caminho da fé. Se levantam os olhos para Ela nos
diversos lugares onde se desenrola a sua existência terrena, fazem-no porque
Ela "deu à luz o Filho, que Deus estabeleceu como primogénito entre muitos
irmãos" (Rom 8, 29) 17 e também porque "Ela coopera com
amor de mãe" para "a regeneração e educação" destes irmãos e
irmãs. 18
PRIMEIRA PARTE - MARIA NO MISTÉRIO DE
CRISTO
1. Cheia de graça
7.
"Bendito seja Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o qual no alto dos
céus, nos abençoou com toda a sorte de bênçãos espirituais em Cristo" (Ef
1, 3). Estas palavras da Carta aos Efésios revelam o eterno desígnio de
Deus Pai, o seu plano de salvação do homem em Cristo. É um plano universal, que
concerne todos os homens criados à imagem e semelhança de Deus (cf. Gén 1,
26). Todos eles, assim como "no princípio" estão compreendidos
na obra criadora de Deus, assim também estão eternamente compreendidos no plano
divino da salvação, que se deve revelar cabalmente na "plenitude dos
tempos", com a vinda de Cristo. Com efeito, "n'Ele", aquele
Deus, que é "Pai de nosso Senhor Jesus Cristo" - são as palavras que
vêm a seguir na mesma Carta - "nos elegeu antes da criação do mundo, para
sermos santos e imaculados aos seus olhos. Por puro amor Ele nos predestinou a
sermos adoptados por Ele como filhos, por intermédio de Jesus Cristo, segundo o
beneplácito da sua vontade, para louvor da magnificência da sua graça, pela
qual nos tornou agradáveis em seu amado Filho. N'Ele, mediante o seu sangue,
temos a redenção, a remissão dos pecados segundo as riquezas da sua graça"
(Ef 1, 4-7).
O
plano divino da salvação, que nos foi revelado plenamente com a vinda de
Cristo, é eterno. Ele é também - segundo o ensino contido na mesma Carta e
noutras Cartas paulinas (cf. Col 1, 12-14; Rom 3, 24; Gál 3, 13; 2 Cor 5,
18-29) - algo que está eternamente ligado a Cristo. Ele compreende em si
todos os homens; mas reserva um lugar singular à "mulher" que foi a
Mãe d'Aquele ao qual o Pai confiou a obra da salvação. 19 Como explana o Concílio Vaticano II,
"Maria encontra-se já profeticamente delineada na promessa da vitória
sobre a serpente, feita aos primeiros pais caídos no pecado", segundo o
Livro do Génesis (cf. 3, 15). "Ela é, igualmente, a Virgem que
conceberá e dará à luz um Filho, cujo nome será Emanuel" segundo as
palavras de Isaías (cf. 7, 14). 20
Deste modo, o Antigo Testamento prepara aquela "plenitude dos
tempos", quando Deus haveria de enviar "o seu Filho, nascido duma
mulher..., para que nós recebêssemos a adopção como filhos". A vinda ao
mundo do Filho de Deus e o acontecimento narrado nos primeiros capítulos dos
Evangelhos segundo São Lucas e segundo São Mateus.
8.
Maria é introduzida no mistério de Cristo definitivamente mediante aquele
acontecimento que foi a Anunciação do Anjo. Esta deu-se em Nazaré, em
circunstâncias bem precisas da história de Israel, o povo que foi o primeiro
destinatário das promessas de Deus. O mensageiro divino diz à Virgem:
"Salve, ó cheia de graça, o Senhor é contigo" (Lc 1, 28).
Maria "perturbou-se e interrogava-se a si própria sobre o que significaria
aquela saudação" (Lc 1, 29): que sentido teriam todas aquelas
palavras extraordinárias, em particular, a expressão "cheia de graça"
(kecharitoméne). 21
Se
quisermos meditar juntamente com Maria em tais palavras e, especialmente, na
expressão "cheia de graça", podemos encontrar uma significativa
correspondência precisamente na passagem acima citada da Carta aos Efésios. E
se, depois do anúncio do mensageiro celeste, a Virgem de Nazaré é chamada
também a "bendita entre as mulheres" (cf. Lc 1, 42), isso
explica-se por causa daquela bênção com que "Deus Pai" nos cumulou
"no alto dos céus, em Cristo". É uma bênção espiritual, que se refere
a todos os homens e traz em si mesma a plenitude e a universalidade ("toda
a sorte de bênçãos"), tal como brota do amor que, no Espírito Santo, une
ao Pai o Filho consubstancial. Ao mesmo tempo, trata-se de uma bênção derramada
por obra de Jesus Cristo na história humana até ao fim: sobre todos os homens.
Mas esta bênção refere-se a Maria em medida especial e excepcional: ela, de
facto, foi saudada por Isabel como "a bendita entre as mulheres".
O
motivo desta dupla saudação, portanto, está no facto de se ter manifestado na alma
desta "filha de Sião", em certo sentido, toda a "magnificência
da graça", daquela graça com que "o Pai... nos tornou agradáveis em
seu amado Filho". O mensageiro, efectivamente, saúda Maria como
"cheia de graça"; e chama-lhe assim, como se este fosse o seu
verdadeiro nome. Não chama a sua interlocutora com o nome que lhe é próprio
segundo o registo terreno: "Miryam" (= Maria); mas sim com este nome
novo: "cheia de graça". E o que significa este nome? Por que é que o
Arcanjo chama desse modo à Virgem de Nazaré?
Na
linguagem da Bíblia "graça" significa um dom especial, que, segundo o
Novo Testamento, tem a sua fonte na vida trinitária do próprio Deus, de Deus
que é amor (cf. 1 Jo 4, 8). É fruto deste amor a "eleição"
- aquela eleição de que fala a Carta aos Efésios. Da parte de Deus esta
"escolha" é a eterna vontade de salvar o homem, mediante a
participação na sua própria vida divina (cf. 2 Pdr 1, 4) em Cristo:
é a salvação pela participação na vida sobrenatural. O efeito deste dom eterno,
desta graça de eleição do homem por parte de Deus, é como que um gérmen de
santidade, ou como que uma nascente a jorrar na alma do homem, qual dom do
próprio Deus que, mediante a graça, vivifica e santifica os eleitos. Desta
forma se verifica, isto é, se torna realidade aquela "bênção" do
homem "com toda a sorte de bênçãos espirituais", aquele "ser
seus filhos adoptivos... em Cristo", ou seja, n'Aquele que é desde toda a
eternidade o "Filho muito amado" do Pai.
Quando
lemos que o mensageiro diz a Maria "cheia de graça", o contexto
evangélico, no qual confluem revelações e promessas antigas, permite-nos
entender que aqui se trata de uma "bênção" singular entre todas as
"bênçãos espirituais em Cristo". No mistério de Cristo, Maria está
presente já "antes da criação do mundo", como aquela a quem o Pai
"escolheu" para Mãe do seu Filho na Incarnação - e, conjuntamente ao
Pai, escolheu-a também o Filho, confiando-a eternamente ao Espírito de
santidade. Maria está unida a Cristo, de um modo absolutamente especial e
excepcional; e é amada neste "Filho muito amado" desde toda a
eternidade, neste Filho consubstancial ao Pai, no qual se concentra toda
"a magnificência da graça". Ao mesmo tempo, porém, ela é e permanece
perfeitamente aberta para este "dom do Alto" (cf. Tg 1, 17)
Como ensina o Concílio, Maria "é a primeira entre os humildes e os pobres
do Senhor, que confiadamente esperam e recebem d'Ele a salvação". 22
(Nota:
Revisão da tradução para português por ama)
______________________________________
Notas
(em latim):
(1) Cfr. Const. dogm. Lumen Gentium de
Ecclesia, 52 et totum cap. VIII cui est titulus «De Beata Maria Virgine Deipara
in mysterio Christi et Ecclesiae ».
(2) Locutio illa « plenitudo temporis »
(πλήρωμα τού χpóνου) similibus aequatur dictionibus Iudaicae traditionis tum
intra ipsa Biblia (cfr. Gn 29, 21; 1 Sam 7, 12; Tob 14, 5) tum extra,
praesertim Novi Testamenti (cfr. Mc 1, 15; Lc 21, 24; Io 7, 8; Eph 1, 10).
Formali sumpta sensu ea demonstrat non solum terminum cuiusdam progressionis
temporis, sed praesertim perfectionem vel absolutionem aetatis, quae singulare
habet momentum, quoniam illuc dirigitur ut exspectatio quaedam impleatur, quae
proinde consequitur aliquam eschatologicam rationem. Secundum illum locum Gal
4, 4 eiusque contextum, adventus ipse Filii Dei patefacit tempus, ut ita
dicatur, complevisse suum destinatum modum; id est aetatem eam, promissis
Abrahae datis necnon lege per Moysen tradita designatam, suum attigisse culmen,
ita quidem ut Christus ipse iam promissionem impleat divinam veteremque excedat
legem.
(3) Cfr. Missale Romanum, Praefatio die 8
Decembris « In Conceptione Immaculata Beatae Mariae Virginis »; S. AMBROSIUS,
De Institutione Virginis, XV, 93-94: PL 16, 342; CONC. OEC. VAT. II, Const.
dogm. Lumen Gentium de Ecclesia, 68.
(4) CONC. OEC. VAT. II, Const. dogm. Lumen
Gentium de Ecclesia, 58.
(5)
PAULUS PP. VI, Ep. Enc. Christi Matri (15 Septembris 1966): AAS 58
(1966) 745- 749 ; Adhort. Apost. Signum magnum (13 Maii 1967): AAS 59 (1967)
465-475; Adhort. Apost. Marialis cultus (2 Februarii 1974): AAS 66 (1974)
113-168.
(6) Vetus Testamentum multimodis
praenuntiavit mysterium Mariae: cfr. S. IOANNES DAMASCENUS, Hom. in Dormitionem
I, 8-9: S. Ch. 80, 103-107.
(7) Cfr. Insegnamenti di Giovanni Paolo II,
VI/2 (1983) 225 s.; Pius PP. IX, Ep. Apost. Ineffabilis Deus (8 Decembris
1854); PII IX P. M. Acta, pars I, 597-599.
(8) Cfr. Const. past. Gaudium et spes de
Ecclesia in mundo huius temporis, 22.
(9) CONC. OEC. EPHES., Conciliorum
Oecumenicorum Decreta, Bologna 1973', 41-44; 59-62 (DS 250-264); cfr. CONC.
OEC. CHALCEDON.: o. mem., 84-87 (DS 300-303).
(10) CONC. OEC. VAT. II, Const. past.
Gaudium et spes de Ecclesia in mundo huius temporis, 22.
(11) Const. dogm. Lumen Gentium de
Ecclesia, 52.
(12) Ibid., 58;
(13) Ibid., 63; cfr. S. AMBROSIUS, Expos.
Evang. sec. Lucam, II, 7: CSEL 32/4, 45; De Institutione Virginia, XIV, 88-89:
PL 16, 341.
(14) Cfr. Const. dogm. Lumen Gentium de
Ecclesia, 64.
(15) Ibid., 65.
(16) « Tolle corpus hoc solare, quod
illuminat mundum: ubi dies? Tolle Mariam, liane maris stellam, maris utique
magni et spatiosi: quid visi caligo involvens, et umbra mortis ac densisshnae
tenebrae relinquuntur? »: S. BERNARDUS, In Nativitate B. Mariae Sermo - De acquaeductu,
6: S. Bernardi Opera, V, 1968, 279; cfr. In laudibus Virginis Matris Homilia
II, 17: ed. mem., IV, 1966, 34 s.
(17) Const. dogm. Lumen Gentium de
Ecclesia. 63.
(18) Ibid., 63.
(19) De praedestinatione Mariae, cfr. S.
IOANNES DAMASCENUS, Hom. in Nativitatem, 7; 10: S. Ch. 80, 65; 73; Hom. in
Dormitionem I, 3: S. Ch. 80, 85: « Est enim ea, quae electa inde a
generationibus antiquis virtute praedestinationis et benevolentiae Dei et
Patris qui te (Verbum Dei) genuit extra tempus non exiens a seipso ac sine ulla
mutatione, est ea quae te peperit, nutrivit sua carne, postremis temporibus
...».
(20) Const. dogm. Lumen Gentium de
Ecclesia, 55.
(21) Quod attinet ad hanc vocem,
inveniuntur in traditione Patrum amplae et variae interpretationes: cfr.
ORIGENES, In Lucam homiliae, VI, 7: S. Ch. 87, 148; SEVERIANUS GABALORUM, In
mundi creationem, Oratio VI, 10: PG 56, 497 s.; S. IOANNES CHRYSOSTOMUS
(pseudo), In Annuntiationem Deiparae et contra Arium impium: PG 62, 765 s.;
BASILIUM SELEUCIENSIS, Oratio 39, In Sanctissimae
Deiparae Annuntiationem, 5: PG 85, 441-446; ANTIPATER BOSTRENSIS, Hom. Il, In
Sanctissimae Deiparae Annuntiationem, 3-11: PG 85, 1777-1783; SOPHEONIUS
HIEROSOLYMITANUS, Oratio II, In Sanctissimae Deiparae Annuntiationem, 17-19: PG
87/3, 3235-3240; S. IOANNES DAMASCENUS, Hom. in Dormitionem, I, 7: S. Ch. 80,
96-101; S. HIERONYMUS, Epistola 65, 9: PL 22, 628; S. AMBROSIUS, Expos. Evang.
sec. Lucam, II, 9: CSEL 32/4, 45 s.; S. AUGUSTINUS, Sermo 291, 4-6: PL 38, 1318
s.; Enchiridion, 36, 11: PL 40, 250; S. PETRUS CHRYSOLUGUS, Sermo 142: PL 52,
579 s.; Sermo 143: PL 52, 583; S. FUIGENTIUS RUSPENSIS, Epistola 17, VI, 12: PL
65, 458; S. BERNARDUS, In laudibus Virginis Matris, Homilia III, 2-3: S.
Bernardi Opera, IV, 1966, 36-38.
(22) Const. dogm. Lumen Gentium de
Ecclesia, 55.
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