18/01/2012

Tratado De Deo Trino 64

Questão 41: Das Pessoas em relação aos actos nocionais.

Art. 4 – Se em Deus há potência, quanto aos actos nocionais.

(I Sent., dist. VII. q. 1. a. 1; De Pot., q. 2. a. 1).

O quarto discute-se assim. – Parece que em Deus não há potência, quanto aos actos nocionais.

1. – Pois, toda potência é activa ou passiva. Ora, nenhuma delas pode convir a Deus, quanto aos actos nocionais: a passiva nele não existe, como já se demonstrou [1]; a activa, por seu lado, não convém a uma Pessoa em relação à outra, por não serem feitas as Pessoas divinas, como se demonstrou [2]. Logo, em Deus não há potência, quanto aos actos nocionais.

2. Demais. – A potência é relativa ao possível. Ora, as Pessoas divinas não são do número dos possíveis, mas, dos necessários. Logo, quanto aos actos nocionais, dos quais as divinas Pessoas procedem, não se deve admitir potência em Deus.

3. Demais. – O Filho procede como Verbo, que é concepção do intelecto; porém o Espírito Santo procede como Amor, que pertence à vontade. Ora, em Deus, a potência é relativa aos efeitos e não, ao inteligir e querer, como se estabeleceu [3]. Logo, em Deus deve-se admitir potência, em relação aos actos nocionais.

Mas, em contrário, Agostinho: Se Deus Pai não pôde gerar o Filho igual a si, onde está a omnipotência de Deus Pai? [4].Logo, em Deus há potência, quanto aos actos nocionais.

Assim como se admitem actos nocionais em Deus, assim também devemos admitir nele a potência, quanto a tais actos; pois, esta nada mais significa senão o principio de um acto. Portanto, assim como inteligimos o Pai, como princípio da geração, e o Pai e o Filho como princípio de inspiração, necessário é atribuirmos ao Pai a potência de gerar, e ao Pai e ao Filho, a de espirar. Porque a potência de gerar é o princípio pelo qual o gerador gera; pois, todo gerador gera por algum meio; por onde, é necessário admitir a potência de gerar em todo gerador. E, no espirante, a potência de espirar.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – Assim como, quanto aos actos nocionais, nenhu­ma pessoa procede, como feita, assim também não há potência, em Deus, quanto aos actos nocionais, em relação à pessoa feita, mas só em relação à pessoa procedente.

RESPOSTA À SEGUNDA. – O possível, enquanto se opõe ao necessário, resulta da potência pas­siva, que não existe em Deus. Por onde, nem em Deus há nada de possível, deste modo; mas só enquanto o possível está contido no necessá­rio. E assim podemos dizer que, como é possível existir Deus, assim é possível o Filho ser gerado.

RESPOSTA À TERCEIRA. – Potência significa princípio, e este importa distinção daquilo de que é princípio. Ora, há uma dupla distinção a fazer, no que dizemos de Deus: uma real e outra, apenas racional. Assim, realmente, Deus se distingue, por essência, das coisas de que é o princípio, pela criação; do mesmo modo que uma pessoa se distingue de outra, da qual é o princípio, pelo acto nocional. Mas a ação não se distingue do agente, em Deus, senão apenas pela razão; do contrário a ação seria nele um acidente. Logo, relativamente às acções pelas quais certas coisas procedem de Deus e são distintas dele, essencial ou pessoalmente, a potência pode ser atribuída a Deus, quanto à noção própria de princípio. Por onde, como admitimos em Deus a potência de criar, pode­mos também admitir a de gerar ou espirar. Ora, inteligir e querer não são actos tais, que designem a processão de alguma coisa, de Deus distinta, essencial ou pessoalmente. Por onde, quanto a tais actos, não se pode atribuir a noção de potência a Deus, senão apenas racionalmente e quanto ao modo de significar. Pois, em Deus, têm significações diversas o intelecto e o inteligir, embora o inteligir de Deus seja a sua essência, sem princípio.



[1] Q. 25, a. 1.
[2] Q.41, a. 3.
[3] Q. 25, a. 1, ad 3, 4
[4] Contra Maximinum haereticum, L. II (al. III), c. 7.

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