POR DE
PO
Dentro do Evangelho
Como o medo e a cobardia podem ter consequências tão diferentes.
Aproximava-se
a Páscoa e Jesus sabe que essa será a Sua última Páscoa.
Em
Jerusalém irá sofrer todo o martírio da Paixão e Morte. Tudo o que irá
acontecer nesses dias derradeiros, está bem patente no Seu espírito.
A
Sua natureza divina conhece em pormenor os incríveis sofrimentos, o desprezo,
os ultrajes, as mentiras, a violência, o abandono mais completo.
A
Sua natureza humana “força-se” a empreender o caminho que O levará a Jerusalém
para cumprir o plano salvífico.
Temos
de admitir que teve de fazer um esforço enorme, inaudito, para tomar essa firme
resolução, como nos diz S. Lucas. Cfr. Lc
9, 51
Também
nós nos enfrentamos, muitas vezes, com situações de grande tensão.
Temos
pela frente um quadro negro e carregado de problemas, de dificuldades, de
grande sofrimento. Sabemos que é inevitável enfrentar a situação e temos de nos
dispor a fazer o que tem de ser feito. E, a nossa humanidade revolta-se
firmemente contra isto, porque o sofrimento, é contrário à condição humana,
porque Deus nos criou para sermos felizes.
«Bem-aventurado
significa «feliz», «ditoso», e em cada uma das Bem-aventuranças Jesus começa
prometendo a felicidade e assinalando os meios para a conseguir. Porque
começará Nosso Senhor falando da felicidade? Porque em todos os homens existe
uma tendência irresistível para ser felizes; este é o fim que todos os seus
actos propõem; mas muitas vezes procuram a felicidade onde não se encontra,
onde não acharão senão miséria.» Cfr.
j. garrigou lagrange, Las tres edades de la vida interior, Vol
I, 188.
Só
que, a felicidade, pelo menos a felicidade autêntica, duradoura, não está na
consolação e no bem-estar, na vida tranquila e sem incidentes.
A
verdadeira felicidade está no cumprimento da Vontade de Deus, custe o que
custar, doa o que doer.
«A
Vontade de Deus é a bússola que em todo o momento nos indica o caminho que nos
leva a Ele; é, ao mesmo tempo, o caminho da nossa própria felicidade. O
cumprimento do querer divino dá-nos também uma grande fortaleza para superar os
obstáculos.» Cfr. francisco fernández carvajal, Hablar com Dios, Advento, 1ª Sem., 5ª F.
Jesus
tranquiliza os seus discípulos apavorados ao vê-lo caminhar sobre as águas: «Sou Eu, não temais» Cfr. Mt 14, 22-36.
Este
medo, contudo, não é cobardia, é temor genuíno perante o desconhecido, o
insólito, o inexplicável.
O
Senhor mantém-se nesta atitude permanente: «Sou
Eu, não temais».
A
cada passo diz-nos que, n’Ele, encontramos refúgio, segurança tranquilidade.
«Não
conseguia deter a corrente. Caudaloso, o rio, levava-me no seu seio numa viagem
rápida, vertiginosa para um destino que, pensava eu, só poderia ser o mar. Mal
podia manter a cabeça fora de água e, quando o conseguia, quase sufocava com as
golfadas que me entravam pela boca, pelo nariz... O que seria de mim se não conseguisse
aproximar-me da margem, encontrar algo a que pudesse agarrar-me e sair daquele
torvelinho?
O
que seria de mim se fosse assim, não sei por quanto tempo, até ao mar?‘De profundis clamavit a Te Domine! Cfr. Slm 129. Da
profundidade da minha aflição, clamei por Ti, meu Deus!
‘Ne timeas!’
Ouvi-te, claramente.
Senhor,
eu confio em Ti, sei, tenho a certeza que tudo é para bem, mas ajuda a minha
debilidade, a minha pouca fé, a minha confiança que vacila.» AMA, memórias
do Hospital, Synesthesia,
O
medo de não sermos ouvidos nas nossas preces é consequência da nossa pouca fé.
Sabemos
o que somos e como somos e, essa constatação leva-nos, por vezes, a duvidar que
Deus nos oiça quando Lhe pedimos algo. A oração é sempre petição.
Esquecemo-nos
que Ele nos conhece intimamente, melhor, muitíssimo melhor, que nós próprios
nos conhecemos e, não obstante, tem para connosco carinho e solicitude de Pai
extremoso que só quer o nosso bem.
É
fundamental que a nossa oração não seja anónima, desgarrada, sem convicção, mas
sim, uma oração confiada de filhos.
«Ser
Teu filho Senhor! Esta certeza é cada vez mais uma presença dominante no meu
espírito e desejo sinceramente que assim continue, aumente e cresça até tomar
conta total de mim. De tal modo desejo que esta realidade tome posse de mim,
que me entrego totalmente nas Tuas mãos amorosas de Pai misericordioso, e
embora não saiba bem para que me queres, para que queres como filho a alguém
como eu, entrego-me confiante que me conheces profundamente, com todos os meus
defeitos e pequenas virtudes e é assim, e não de outro modo, que me queres ao
pé de Ti». AMA, orações
pessoais
«Lembro-me que houve muitos dias em que não conseguia
rezar de uma forma consistente. Os pensamentos entrechocavam-se e resultavam
numa confusão sem sentido. Entreguei-me com decidida persistência às orações
vocais: Ave-Marias, Pai-nossos, Mistérios do Rosário, as orações simples que
rezo desde criança.
Aprendi agora que não me aconteceu nada de estranho,
nem fui o primeiro – nem serei seguramente o último – a passar por tal transe.»
AMA, memórias do Hospital
«Para que a oração desenvolva força purificadora,
deve, por um lado, ser muito pessoal, um confronto do meu eu com Deus, com o
Deus vivo; mas, por outro, deve ser incessantemente guiada e iluminada pelas
grandes orações da Igreja e dos santos, pela oração litúrgica, na qual o Senhor
nos ensina continuamente a rezar de modo justo.
O cardeal Nyugen Van Thuan contou no seu livro de
Exercícios Espirituais, como na sua vida tinha havido longos períodos de
incapacidade para rezar, e como ele se tinha agarrado às palavras de oração da
Igreja: ao Pai-nosso, à Ave-Maria e às orações da Liturgia. (Testimoni della speranza, Città Nuova,
2000, 156 ss.)
Na oração, deve haver sempre este entrelaçamento de
oração pública e oração pessoal, Assim podemos falar a Deus, assim Deus nos
fala a nós» Bento XVI, Encíclica, Salvos na Esperança,
34.
De facto, nada é novo, não somos os primeiros em nada,
antes de nós, já alguém pensou, fez ou desejou algo semelhante.
Esta é, sem dúvida, a tendência que todos - mais ou
menos -, temos para nos considerarmos únicos, peculiares, especiais. Na
verdade, só somos particulares aos olhos de Deus, que nos conhece pelo nosso
nome, pelo qual nos chamou mesmo antes do início do mundo.
Se acreditarmos nisto, que é essencial para a nossa
fé, facilmente concluiremos que, o nosso caminho se cruza, definitivamente, com
o caminho do Jesus que passa, na nossa vida, sempre tão perto de nós.
«E
foi com ele».
Jesus não se detém mais tempo.
Provavelmente dando o braço a Jairo, numa atitude de
confiança, de tranquila certeza, diz-lhe que indique o caminho para sua casa.
Como deve tranquilizar-nos esta atitude do Mestre: caminhando confiadamente
connosco, deixando que O levemos onde queremos ir, ao encontro da nossa
necessidade.
Certamente entabulou conversa com o Seu companheiro,
informando-se da sua vida, do seu trabalho, a família. Tal como fará em muitas
ocasiões, muito particularmente com dois, a caminho de Emaús.
Esses também vão para sua casa, procurando refúgio,
recato, pondo-se ao abrigo de uma situação que os afligia em extremo. Tinha
acontecido um desastre, algo que não conseguiam explicar. Nas suas mentes
entrechocavam-se os pensamentos mais contraditórios, as dúvidas mais profundas.
Estão desorientados, sem saber que fazer ou pensar.
E, Jesus, junta-se-lhes no caminho e ouve-os, escuta
as suas dúvidas, interroga-os com interesse. Quer saber, deseja inteirar-se. E,
depois, esclarece, explica, tranquiliza.
Este Senhor que caminha ao nosso lado e cuja presença,
tantas vezes, ignoramos, é o mesmo Jesus que caminha agora com Jairo,
tranquilamente, conversando na Sua voz profunda, suave, segura, transmitindo
paz, confiança, tranquilidade.
Como desejamos esta companhia tão excelente todos os
dias da nossa vida, em todos os caminhos que temos de percorrer! Nunca estamos
sozinhos, Jesus está sempre connosco e, por extraordinário que possa parecer,
mesmo quando não O convidamos expressamente, ou nos esquecemos de Lhe pedir
para nos acompanhar.
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