Dentro
do Evangelho – (cfr:
São Josemaria, Sulco 253)
EVANGELHO Lc IX, 1-10
1 Tendo entrado em Jericó,
atravessava a cidade. 2 Eis que um homem chamado Zaqueu, que era
chefe dos publicanos e rico, 3 procurava conhecer de vista Jesus,
mas não podia por causa da multidão, porque era pequeno de estatura. 4
Correndo adiante, subiu a um sicómoro para O ver, porque havia de passar por ali.
5 Quando chegou Jesus àquele lugar, levantou os olhos e disse-lhe:
«Zaqueu, desce depressa, porque convém que Eu fique hoje em tua casa». 6
Ele desceu a toda a pressa, e recebeu-O alegremente. 7 Vendo isto,
todos murmuravam, dizendo: «Foi hospedar-Se em casa de um homem pecador». 8
Entretanto, Zaqueu, de pé diante do Senhor, disse-Lhe: «Eis, Senhor, que dou
aos pobres metade dos meus bens e, naquilo em que tiver defraudado alguém,
restituir-lhe-ei o quádruplo». 9 Jesus disse-lhe: «Hoje entrou a
salvação nesta casa, porque este também é filho de Abraão. 10 Porque
o Filho do Homem veio buscar e salvar o que estava
perdido».
Personagem
O servo de Zaqueu
Há muitos anos que sirvo em casa de Zaqueu. Confesso que não é um trabalho muito agradável
e não fora o excelente salário há muito teria procurado outro. Mas não só…
também tenho de reconhecer que me afeiçoei ao meu amo não só porque me trata
bem, mas principalmente porque tenho a noção que sou o único amigo – e, às
vezes, confidente – que tem. O meu amo é «chefe
dos publicanos [i]
o que não lhe granjeia grandes simpatias junto do povo pelo que tem muito
poucos amigos. Não obstante ser «um homem
rico»[ii]
e possuir uma excelente casa, onde nada falta, e uma mesa farta, vive de facto
quase isolado e só. Claro que eu sei muito bem que todos suspeitam que os meios
de fortuna lhe vêm directamente do exercício da sua profissão de cobrador de
impostos e não só das “comissões” que os romanos lhe pagam para os cobrar, mas
também porque muitas vezes se “aproveita” de algumas situações cobrando mais do
que o devido, arrecadando para si esses dinheiros. Talvez, até, os seus colegas
lhe entreguem parte do que eles próprios também cobram a mais.
Aconteceu, porém, que um dos seus subordinados – um tal
conhecido por Mateus – tinha subitamente abandonado a profissão e, isto, em
circunstâncias relatadas por muita gente do povo. Claro que Mateus veio ter com
o seu chefe – o meu amo – e lhe contou o que sucedera e o levara a tal decisão
de mudar de vida. Desde então, o meu amo nunca mais teve sossego por causa de
uma ideia fixa que se lhe instalara no espírito: tinha de conhecer esse homem a
que chamavam Jesus o Nazareno, esse mesmo que fora ”o responsável” pela mudança
de vida de Mateus que agora o seguia para onde quer que fosse. De facto, «procurava conhecer de vista Jesus» [iii]
porque, julgava ele, um contacto pessoal não seria possível: um judeu falar com
um publicano!!!
Um dia, no mercado da cidade próxima, Jericó, deparei-me
com uma agitação fora do comum e informaram-me que esse Jesus ia passar por ali
pelo que toda a gente se juntava no caminho à saída da cidade para O ver e, se
possível, fazer-lhe algum pedido. Voltei a toda a pressa para casa e informei o
meu amo dizendo-lhe que ali estava a oportunidade porque tanto ansiava. Ele não
hesitou um minuto sequer e «Correndo
adiante, subiu a um sicómoro para O ver» [iv] quando
passasse por ali. Confesso que fiquei espantado com tal atitude e percebi-me
que o seu desejo de ver Jesus era de tal forma genuíno que não se importou com
o que outros pudessem dizer por se colocar, assim, empoleirado numa árvore,
algo inesperado por parte de uma pessoa tão importante. O cortejo que seguia Jesus aproximava-se e,
então, aconteceu uma coisa extraordinária: Jesus parou mesmo debaixo do
sicómoro onde o meu amo se empoleirara e «levantando os olhos disse-lhe: «Zaqueu, desce depressa, porque convém que
Eu fique hoje em tua casa» [v]. O
meu amo, radiante «desceu a toda a
pressa, e recebeu-O alegremente» [vi] Foi um dia memorável que jamais esquecerei. Os dois, Jesus e Zaqueu conversaram
longamente como se fossem “velhos amigos” e era bem notória a alegria e, ao
mesmo tempo, a serenidade que o meu amo ostentava. Não lhe importando os
murmúrios que os circunstantes deixavam escapar, as críticas e os “remoques”,
pondo-se subitamente «pé diante do
Senhor, disse-Lhe: «Eis, Senhor, que dou aos pobres metade dos meus bens e, naquilo
em que tiver defraudado alguém, restituir-lhe-ei o quádruplo». [vii] Os murmúrios cessaram de repente e as pessoas
comentavam admiradas e algo incrédulas o que acabavam de ouvir. Mas, a verdade,
é que logo que Jesus se afastou o meu amo começou a tratar das coisas tal como
tinha dito e prometido.
O que posso dizer é que o meu amo nunca mais foi o mesmo
homem; a mudança na sua vida, no seu modo de proceder foi tal que, aos poucos
muitas pessoas que – como atrás disse – evitavam qualquer contacto, passaram a
ser visitas de sua casa e, muitas vezes assisti, com pedidos de auxílio e
assistência que nunca lhes negava.
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