CARTA APOSTÓLICA PATRIS CORDE
DO
PAPA FRANCISCO
POR
OCASIÃO DO 150º ANIVERSÁRIO DA DECLARAÇÃO DE SÃO JOSÉ COMO PADROEIRO UNIVERSAL
DA IGREJA
7.
Pai na sombra
Ser
pai significa introduzir o filho na experiência da vida, na realidade. Não
segurá-lo, nem prendê-lo, nem subjugá-lo, mas torná-lo capaz de opções, de
liberdade, de partir. Talvez seja por isso que a tradição, referindo-se a José,
ao lado do apelido de pai colocou também o de «castíssimo». Não se trata duma
indicação meramente afectiva, mas é a síntese duma atitude que exprime o
contrário da posse. A castidade é a liberdade da posse em todos os campos da
vida. Um amor só é verdadeiramente tal, quando é casto. O amor que quer
possuir, acaba sempre por se tornar perigoso: prende, sufoca, torna infeliz. O
próprio Deus amou o homem com amor casto, deixando-o livre inclusive de errar e
opor-se a Ele. A lógica do amor é sempre uma lógica de liberdade, e José soube
amar de maneira extraordinariamente livre. Nunca se colocou a si mesmo no
centro; soube descentralizar-se, colocar Maria e Jesus no centro da sua vida.
A
felicidade de José não se situa na lógica do sacrifício de si mesmo, mas na
lógica do dom de si mesmo. Naquele homem, nunca se nota frustração, mas apenas
confiança. O seu silêncio persistente não inclui lamentações, mas sempre gestos
concretos de confiança. O mundo precisa de pais, rejeita os dominadores, isto
é, rejeita quem quer usar a posse do outro para preencher o seu próprio vazio;
rejeita aqueles que confundem autoridade com autoritarismo, serviço com
servilismo, confronto com opressão, caridade com assistencialismo, força com
destruição. Toda a verdadeira vocação nasce do dom de si mesmo, que é a
maturação do simples sacrifício. Mesmo no sacerdócio e na vida consagrada,
requer-se este género de maturidade. Quando uma vocação matrimonial,
celibatária ou virginal não chega à maturação do dom de si mesmo, detendo-se
apenas na lógica do sacrifício, então, em vez de significar a beleza e a
alegria do amor, corre o risco de exprimir infelicidade, tristeza e frustração.
A
paternidade, que renuncia à tentação de decidir a vida dos filhos, sempre abre
espaços para o inédito. Cada filho traz sempre consigo um mistério, algo de
inédito que só pode ser revelado com a ajuda dum pai que respeite a sua liberdade.
Um pai sente que completou a sua ação educativa e viveu plenamente a
paternidade, apenas quando se tornou «inútil», quando vê que o filho se torna
autónomo e caminha sozinho pelas sendas da vida, quando se coloca na situação
de José, que sempre soube que aquele Menino não era seu: fora simplesmente
confiado aos seus cuidados. No fundo, é isto mesmo que dá a entender Jesus
quando afirma: «Na terra, a ninguém chameis “Pai”, porque um só é o vosso
“Pai”, aquele que está no Céu» (Mt 23, 9).
Todas
as vezes que nos encontramos na condição de exercitar a paternidade, devemos
lembrar-nos que nunca é exercício de posse, mas «sinal» que remete para uma
paternidade mais alta. Em certo sentido, estamos sempre todos na condição de
José: sombra do único Pai celeste, que «faz com que o sol se levante sobre os
bons e os maus, e faz cair a chuva sobre os justos e os pecadores» (Mt 5, 45);
e sombra que acompanha o Filho.
Francisco
©
Copyright - Libreria Editrice Vaticana
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.