DO
PAPA FRANCISCO
POR OCASIÃO DO 150º
ANIVERSÁRIO DA DECLARAÇÃO DE SÃO JOSÉ COMO PADROEIRO UNIVERSAL DA IGREJA
4. Pai no acolhimento
José acolhe Maria, sem
colocar condições prévias. Confia nas palavras do anjo. «A nobreza do seu
coração fá-lo subordinar à caridade aquilo que aprendera com a lei; e hoje,
neste mundo onde é patente a violência psicológica, verbal e física contra a
mulher, José apresenta-se como figura de homem respeitoso, delicado que, mesmo
não dispondo de todas as informações, se decide pela honra, dignidade e vida de
Maria. E, na sua dúvida sobre o melhor a fazer, Deus ajudou-o a escolher
iluminando o seu discernimento».[18]
Na nossa vida, muitas vezes
sucedem coisas, cujo significado não entendemos. E a nossa primeira reação,
frequentemente, é de desilusão e revolta. Diversamente, José deixa de lado os
seus raciocínios para dar lugar ao que sucede e, por mais misterioso que possa
aparecer a seus olhos, acolhe-o, assume a sua responsabilidade e reconcilia-se
com a própria história. Se não nos reconciliarmos com a nossa história, não
conseguiremos dar nem mais um passo, porque ficaremos sempre reféns das nossas
expectativas e consequentes desilusões.
A vida espiritual que José
nos mostra, não é um caminho que explica, mas um caminho que acolhe. Só a
partir deste acolhimento, desta reconciliação, é possível intuir também uma
história mais excelsa, um significado mais profundo. Parecem ecoar as palavras
inflamadas de Job, quando, desafiado pela esposa a rebelar-se contra todo o mal
que lhe está a acontecer, responde: «Se recebemos os bens da mão de Deus, não
aceitaremos também os males?» (Job 2, 10).
José não é um homem
resignado passivamente. O seu protagonismo é corajoso e forte. O acolhimento é
um modo pelo qual se manifesta, na nossa vida, o dom da fortaleza que nos vem
do Espírito Santo. Só o Senhor nos pode dar força para acolher a vida como ela
é, aceitando até mesmo as suas contradições, imprevistos e desilusões.
A vinda de Jesus ao nosso
meio é um dom do Pai, para que cada um se reconcilie com a carne da sua
história, mesmo quando não a compreende totalmente.
O que Deus disse ao nosso
Santo – «José, Filho de David, não temas…» (Mt 1, 20) –, parece repeti-lo a nós
também: «Não tenhais medo!» É necessário deixar de lado a ira e a desilusão
para – movidos não por qualquer resignação mundana, mas com uma fortaleza cheia
de esperança – dar lugar àquilo que não escolhemos e, todavia, existe. Acolher
a vida desta maneira introduz-nos num significado oculto. A vida de cada um de
nós pode recomeçar miraculosamente, se encontrarmos a coragem de a viver segundo
aquilo que nos indica o Evangelho. E não importa se tudo parece ter tomado já
uma direção errada, e se algumas coisas já são irreversíveis. Deus pode fazer
brotar flores no meio das rochas. E mesmo que o nosso coração nos censure de
qualquer coisa, Ele «é maior que o nosso coração e conhece tudo» (1 Jo 3, 20).
Reaparece aqui o realismo
cristão, que não deita fora nada do que existe. A realidade, na sua misteriosa
persistência e complexidade, é portadora dum sentido da existência com as suas
luzes e sombras. É isto que leva o apóstolo Paulo a dizer: «Sabemos que tudo
contribui para o bem daqueles que amam a Deus» (Rm 8, 28). E Santo Agostinho
acrescenta: tudo, «incluindo aquilo que é chamado mal».[19] Nesta perspetiva
global, a fé dá significado a todos os acontecimentos, sejam eles felizes ou
tristes.
Assim, longe de nós pensar
que crer signifique encontrar fáceis soluções consoladoras. Antes, pelo
contrário, a fé que Cristo nos ensinou é a que vemos em São José, que não
procura atalhos, mas enfrenta de olhos abertos aquilo que lhe acontece,
assumindo pessoalmente a responsabilidade por isso.
O acolhimento de José
convida-nos a receber os outros, sem exclusões, tal como são, reservando uma
predileção especial pelos mais frágeis, porque Deus escolhe o que é frágil (cf.
1 Cor 1, 27), é «pai dos órfãos e defensor das viúvas» (Sal 68, 6) e manda amar
o forasteiro.[20] Posso imaginar ter sido do procedimento de José que Jesus
tirou inspiração para a parábola do filho pródigo e do pai misericordioso (cf.
Lc 15, 11-32).
Francisco
Notas:
[18] Francisco, Homilia na
Santa Missa com Beatificações (Villavicencio – Colômbia, 8 de setembro de
2017): AAS 109 (2017), 1061.
[19] «… etiam illud quod malum dicitur», in Enchiridion de fide, spe et caritate,
3.11: PL 40, 236.
[20] Cf. Deuteronómio 10,
19; Êxodo 22, 20-22; Lucas 10, 29-37.
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