Evangelho
Jo XVII, 27-50
Pedido de alguns pagãos
27 Agora a minha alma está perturbada. E
que hei-de Eu dizer? Pai, salva-me desta hora? Mas precisamente para esta hora
é que Eu vim! 28 Pai, manifesta a tua glória!» Veio, então, uma voz do Céu: «Já
a manifestei e voltarei a manifestá-la!» 29 Entre as pessoas presentes, que
escutaram, uns diziam que tinha sido um trovão; outros diziam: «Foi um Anjo que
lhe falou!» 30 Jesus respondeu: «Esta voz não veio por causa de mim, mas por
amor de vós. 31 Agora é o julgamento deste mundo; agora é que o dominador deste
mundo vai ser lançado fora. 32 E Eu, quando for erguido da terra, atrairei
todos a mim.» 33 Dizia isto dando a entender de que espécie de morte havia de
morrer. 34 Aquela gente replicou-lhe: «Nós aprendemos na nossa Lei que o
Messias permanece vivo para sempre. Como afirmas Tu que o Filho do Homem tem de
ser erguido? Mas quem é, afinal, esse tal Filho do Homem?» 35 Jesus
respondeu-lhes: «Por um pouco de tempo ainda, a Luz está no meio de vós.
Caminhai enquanto tendes a Luz, de modo que as trevas não vos apanhem, pois
quem caminha nas trevas não sabe para onde vai. 36 Enquanto tendes a Luz, crede
na Luz, para vos tornardes filhos da Luz.» Jesus disse estas coisas, foi-se
embora e ocultou-se deles.
Incredulidade dos judeus
37 Embora Jesus tivesse realizado diante
deles tantos sinais portentosos, não criam nele, 38 de modo a cumprirem-se as
palavras do profeta Isaías, que dissera: Senhor, quem acreditou no que ouviu de
nós? E a quem foi revelado o poder do Senhor? 39 Realmente não eram capazes de
crer; por isso Isaías também dissera: 40 Cegou-lhes os olhos e endureceu-lhes o
coração, para não verem com os olhos e não entenderem com o coração e não se
converterem e Eu ter de os curar. 41 Isto disse Isaías falando dele, porque
tinha visto a sua glória. 42 Apesar disso, até entre os chefes, muitos creram
nele, mas não o confessavam por causa dos fariseus, para não serem expulsos da
Sinagoga, 43 pois amavam mais a glória dos homens do que a glória de Deus. 44 Jesus
levantou a voz e disse: «Quem crê em mim não é em mim que crê, mas sim naquele
que me enviou; 45 e quem me vê a mim vê aquele que me enviou. 46 Eu vim ao
mundo como luz, para que todo o que crê em mim não fique nas trevas. 47 Se
alguém ouve as minhas palavras e não as cumpre, não sou Eu que o julgo, pois
não vim para condenar o mundo, mas sim para o salvar. 48 Quem me rejeita e não
aceita as minhas palavras tem quem o julgue: a palavra que Eu anunciei, essa é
que o há-de julgar no último dia; 49 porque Eu não falei por mim mesmo, mas o
Pai, que me enviou, é que me encarregou do que devo dizer e anunciar. 50 E Eu
bem sei que este seu mandato traz consigo a vida eterna; por isso, as coisas
que Eu anuncio, anuncio-as tal como o Pai as disse a mim.»
Amar a Igreja
Para
começar, gostaria de vos recordar umas palavras de São Cipriano:
“A
Igreja universal apresenta-se-nos como um povo cuja unidade é obtida a partir
da unidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo”.
Não
estranhem, portanto, que nesta festa da Santíssima Trindade a homilia trate da
Igreja, tanto mais que a Igreja tem as suas raízes no mistério fundamental da
nossa fé católica: o de Deus uno em essência e trino em pessoas.
A
Igreja centrada na Trindade: eis como sempre a consideraram os Padres.
Reparem
como são claras as palavras de Santo Agostinho: “Deus habita no seu templo;
não apenas o Espírito Santo, mas igualmente o Pai e o Filho... Por isso, a
Santa Igreja é o templo de Deus, ou seja, de toda a Trindade”.
Ao
reunirmo-nos de novo no próximo Domingo, consideraremos outro dos aspectos
maravilhosos da Santa Igreja: essas notas que recitaremos dentro de pouco, no
Credo, depois de cantar a nossa fé no Pai, no Filho e no Espírito Santo.
Et in Spiritum Sanctum, dizemos.
E,
logo a seguir, et unam, sanctam
catholicam et apostolicam Ecclesiam, confessamos que há uma só Igreja,
Santa, Católica e Apostólica.
Todos
aqueles que amaram verdadeiramente a Igreja souberam relacionar estas quatro
notas com o mais inefável mistério da nossa santa religião: a Santíssima
Trindade.
Nós
cremos na Igreja de Deus, Una, Santa, Católica e Apostólica, na qual recebemos
a doutrina; conhecemos o Pai, o Filho e o Espírito Santo e somos baptizados em
nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.
18
Momentos difíceis
É
necessário meditarmos frequentemente, para não corrermos o risco de nos
esquecermos, que a Igreja é um mistério grande, profundo. Nunca poderá ser
abarcado nesta terra.
Se a
razão tentasse explicá-lo por si só, veria apenas a reunião de pessoas que cumprem
certos preceitos, que pensam de forma parecida. Mas isso não seria a Santa
Igreja.
Na
Santa Igreja os católicos encontramos a nossa fé, as nossas normas de conduta,
a nossa oração, o sentido de fraternidade, a comunhão com todos os irmãos que
já desapareceram e que estão a purificar-se no Purgatório - Igreja padecente-,
ou com os que já gozam da visão beatífica - Igreja triunfante-, amando
eternamente Deus, três vezes Santo.
É a
Igreja que permanece aqui e, ao mesmo tempo, transcende a história.
A
Igreja que nasceu sob o manto de Santa Maria e continua a louvá-la como Mãe na
terra e no céu.
Confirmemos
em nós mesmos o carácter sobrenatural da Igreja; confessemo-lo aos gritos, se
for preciso, porque nestes momentos são muitos aqueles que - embora fisicamente
dentro da Igreja, e até em altas posições - se esqueceram destas verdades capitais
e pretendem apresentar uma imagem da Igreja que não é Santa, que não é Una, que
não pode ser Apostólica porque não se apoia na rocha de Pedro, que não é
Católica porque está sulcada por particularismos ilegítimos, por caprichos de
homens.
Não
é novidade.
Desde
que Jesus Cristo fundou a Santa Igreja, esta Mãe, que é nossa Mãe, sofreu uma
perseguição constante.
Talvez
noutras épocas as agressões se organizassem abertamente; agora, em muitos
casos, trata-se de uma perseguição camuflada.
Seja
como for, hoje, como ontem, há quem continue a combater a Igreja.
Repetirei
mais uma vez que não sou pessimista, nem por temperamento nem por hábito.
Como
é possível ser pessimista se Nosso Senhor prometeu que estará connosco até ao
fim dos séculos?
A
efusão do Espírito Santo plasmou, na reunião dos discípulos no Cenáculo, a
primeira manifestação pública da Igreja.
O
nosso Pai Deus - conforme nos diz a Escritura com uma expressão tão gráfica,
para podermos perceber: “Pai amoroso que cuida de nós como da menina dos
olhos, - não cessa de santificar, pelo Espírito Santo, a Igreja fundada pelo
Seu Filho muito amado”.
Mas
a Igreja vive actualmente dias difíceis: são anos de grande desconcerto para as
almas.
O
clamor da confusão levanta-se por toda a parte e renascem com estrondo todos os
erros que houve ao longo dos séculos.
19
Fé.
Precisamos
de fé.
Se
olharmos com olhos de fé, descobrimos que a Igreja contém em si mesma e difunde
à sua volta a sua própria apologia.
Quem
a contempla, quem a estuda com olhos de amor à verdade, deve reconhecer que
ela, independentemente dos homens que a compõem, e das modalidades práticas com
que se apresenta, leva em si mesma uma mensagem de luz universal e única,
libertadora e necessária, divina.
Quando
ouvimos vozes de heresia - porque são exactamente isso, nunca me agradaram os
eufemismos-, quando observamos que se ataca impunemente a santidade do
matrimónio e do sacerdócio; a concepção imaculada da Nossa Mãe Santa Maria e a
sua virgindade perpétua, com todos os restantes privilégios e excelências com
que Deus a adornou; o milagre perene da presença real de Jesus Cristo na
Sagrada Eucaristia, o primado de Pedro, a própria Ressurreição de Nosso Senhor,
como não sentir a alma cheia de tristeza?
Mas
tenham confiança: a Santa Igreja é incorruptível.
A
Igreja vacilará se o seu fundamento vacilar, mas poderá Cristo vacilar?
Enquanto
Cristo não vacilar, a Igreja jamais fraquejará até ao fim dos tempos.
20
O humano e o divino na Igreja
Assim
como em Cristo há duas naturezas - a humana e a divina - também, por analogia,
podemos referir-nos à existência na Igreja de um elemento humano e de um
elemento divino.
A
ninguém passa despercebida a evidência dessa parte humana.
A
Igreja, neste mundo, está composta por homens e para homens, e dizer homem é
falar da liberdade, da possibilidade de actos grandes e de actos mesquinhos, de
heroísmos e de claudicações.
Se
só admitíssemos essa parte humana da Igreja nunca conseguiríamos compreendê-la,
pois não teríamos chegado à porta do mistério. A Sagrada Escritura utiliza
muitos termos - tirados da experiência terrena - para os aplicar ao Reino de
Deus e à sua presença entre nós, na Igreja.
Compara-a
ao redil, ao rebanho, à casa, à semente, à vinha, ao campo onde Deus planta ou
edifica.
Mas
destaca uma expressão que compendia tudo: “a Igreja é o Corpo de Cristo”.
E
Ele a uns constituiu Apóstolos, a outros profetas, a outros evangelistas, a
outros pastores e doutores, para o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do
ministério, para a edificação do Corpo de Cristo. São Paulo escreve também que “somos
um só corpo em Cristo, e cada um de nós membros uns dos outros”.
Como
é luminosa a nossa fé! Todos somos em Cristo, porque Ele é a Cabeça do corpo da
Igreja.
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