(Cfr. Lc 8, 49-56)
Chamá-los-á também para testemunhar a Sua Transfiguração, para verem com os
seus olhos tão humanos a glória do Filho de Deus. Ainda aqui, não entendiam
nada.
Com os olhos carregados de sono, a Pedro só lhe ocorre dizer que se sente
bem, que não quer afastar-se daquela visão, daquele local.
Depois, nos momentos derradeiros, convidá-los-á, aos mesmos três, para O
acompanharem no Horto das Oliveiras para testemunharem a Sua Agonia.
Mais uma vez, o sono vence-os.
Este sono é a figura do desânimo, da preocupação, da incerteza, do medo.
«A oração do Senhor
prolongava-se entre lágrimas e eles não penetraram no seu mistério. A tristeza
ia afundando-os num sopor paralisante. E adormeceram. O sono foi para eles a
saída psicológica da tristeza, enquanto Jesus a superava permanecendo em
vigília, orando com perseverança, clamando ao Pai de joelhos, sem Se dispensar
do esforço». [1]
Tristeza e sono… como andam juntas estas “fraquezas” do homem!
Consentir na tristeza é caminho certo para adormecer. Ficamos absortos no
problema ou na situação que nos aflige e nos entristece.
Tudo parece cinzento à nossa volta, não vemos nem saída nem escapatória e,
se nos deixarmos ir por aí, o mais certo é os nossos olhos deixarem de ver o
que realmente se passa à nossa volta e cerrarem-se com sono.
‘Eu…? Não!’ Dizemos, espantados com tal possibilidade, ‘comigo isso não
acontece, nunca estou triste!’
Será verdade?
Todas as vezes que nos detemos a pensar no que não temos e desejaríamos
ter, porque pensamos que nos faz falta, no que faríamos se as circunstâncias
fossem as que consideramos ideais; quando deixamos insinuar-se a suspeita, a
pequena inveja, a nossa vontade de sobressair, de sermos notados, talvez mais
“queridos” que os outros; quando nos revemos com prazer e gosto no que fizemos,
como falámos, como fomos “certeiros” na nossa avaliação, como nos olharam com
admiração… aí, não estamos tristes, bem pelo contrário, sentimo-nos contentes,
felizes até, talvez, eufóricos.
E, a tristeza, que tem a ver com isto, que, afinal, são coisas pequenas que
procuramos reprimir de imediato?
Tem, e muito, a ver.
Porque essa alegria e esse contentamento depressa se desvanecem quando nos
damos conta da nossa fraqueza, do pouco que somos, da nossa tendência para
considerar detidamente tudo aquilo que é agradável aos nossos sentidos e, em
contrapartida, a fuga ao sacrifício, à entrega, à renúncia, à simples contenção
de pensamentos, atitudes e palavras.
«Se vês que
adormeço; se descobres que me assusta a dor; se notas que me detenho ao ver
mais de perto a Cruz, não me deixes! Diz-me como a Pedro, como a Tiago, como a
João, que necessitas da minha correspondência, do meu amor. Diz-me para
seguir-te, para não voltar a deixar-te abandonado com os que tramam a Tua
morte, tenho que passar por cima do sono, das minhas paixões, da comodidade.» [2]
(AMA,
reflexões sobre o Evangelho, 2006)
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