21/06/2019

Leitura espiritual


São Josemaria Escrivá

Cristo que passa

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Lux fulgebit hodie super nos, quia natus est nobis Dominus - Hoje brilhará sobre nós a luz, porque nos nasceu o Senhor!
Eis a grande novidade que comove os cristãos e que, através deles, se dirige à Humanidade inteira.
Deus está aqui!
Esta verdade deve encher as nossas vidas.
Cada Natal deve ser para nós um novo encontro especial com Deus, deixando que a sua luz e a sua graça entrem até ao fundo da nossa alma.

Detemo-nos diante do Menino, de Maria e de José; estamos contemplando o Filho de Deus revestido da nossa carne...
Vem-me à lembrança a viagem que fiz a Loreto, em 15 de Agosto de 1951, para visitar a Santa Casa por motivo muito íntimo.
Celebrei lá a Santa Missa.
Queria dizê-la com recolhimento mas não tinha contado com o fervor da multidão.
Não tinha calculado que nesse grande dia de festa muitas pessoas dos arredores viriam a Loreto - com a bendita fé dessa terra e com o amor que têm à Madona.
E a sua piedade, considerando as coisas - como diria? - só do ponto de vista das leis rituais da Igreja, levava-as a manifestações não muito correctas.
E assim, enquanto eu beijava o altar, nos momentos prescritos pelas rubricas da Missa, três ou quatro camponeses beijavam-no ao mesmo tempo.
Distraía-me mas estava emocionado.
E também me atraía a atenção a lembrança de que naquela Santa Casa - que a tradição assegura ser o lugar onde viveram Jesus, Maria e José - na mesa do altar tinham gravado estas palavras: Hic Verbum caro factum est.
Aqui, numa casa construída pelas mãos dos homens, num pedaço de terra em que vivemos, habitou Deus!

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Jesus Cristo, perfeito Deus e perfeito homem

O Filho de Deus fez-se carne e é perfectus Deus, perfectus homo, perfeito Deus e perfeito homem!
Neste mistério há qualquer coisa que deveria emocionar os cristãos. Estava e estou comovido; gostava de voltar a Loreto...
Vou lá em desejo para reviver os anos da infância de Jesus, repetindo e considerando: Hic Verbum caro factum est!

Jesus Christus, Deus Homo, Jesus Cristo, Deus-Homem!
Eis uma magnalia Dei, uma das maravilhas de Deus em que temos de meditar e que temos de agradecer a este Senhor que veio trazer a paz na terra aos homens de boa vontade, a todos os homens que querem unir a sua vontade à Vontade boa de Deus.
Não só aos ricos, nem só aos pobres!
A todos os homens, a todos os irmãos!
Pois irmãos somos todos em Jesus; filhos de Deus, irmãos de Cristo. Sua Mãe é nossa Mãe.

Na terra há apenas uma raça: a raça dos filhos de Deus.
Todos devemos falar a mesma língua: a que o nosso Pai que está nos Céus nos ensina; a língua dos diálogos de Jesus com seu Pai; a língua que se fala com o coração e com a cabeça; a que estais a usar agora na vossa oração.
É a língua das almas contemplativas, dos homens espirituais por se terem dado conta da sua filiação divina; uma língua que se manifesta em mil moções da vontade, em luzes vivas do entendimento, em afectos do coração, em decisões de rectidão de vida, de bem-fazer, de alegria, de paz.

É preciso ver o Menino, nosso Amor, no seu berço.
Olhar para Ele, sabendo que estamos perante um mistério. Precisamos de aceitar o mistério pela fé, aprofundar o seu conteúdo. Para isso necessitamos das disposições humildes da alma cristã: não pretender reduzir a grandeza de Deus aos nossos pobres conceitos, às nossas explicações humanas, mas compreender que esse mistério, na sua obscuridade, é uma luz que guia a vida dos homens.

Vemos - diz S. João Crisóstomo - que Jesus saiu de nós, da nossa substância humana, e que nasceu de Mãe virgem; mas não entendemos como pode ter-se realizado esse prodígio.
Não nos cansemos, tentando descobri-lo; aceitemos antes com humildade o que Deus nos revelou sem esquadrinharmos com curiosidade o que Deus nos escondeu.
Assim, com este acatamento, saberemos compreender e amar; e o mistério será para nós um esplêndido ensinamento, mais convincente do que qualquer outro raciocínio humano.

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Sentido divino do caminhar terreno de Jesus

Ao falar diante do presépio sempre procurei ver Cristo Nosso Senhor desta maneira, envolto em paninhos sobre a palha da manjedoura, e, enquanto ainda menino e não diz nada, vê-Lo já como doutor, como mestre.
Preciso de considerá-Lo assim, porque tenho de aprender d'Ele.
E para aprender d'Ele é necessário conhecer a sua vida: ler o Santo Evangelho, meditar no sentido divino do caminho terreno de Jesus.

Na verdade, temos de reproduzir na nossa, a vida de Cristo, conhecendo Cristo à força de ler a Sagrada Escritura e de a meditar, à força de fazer oração, como agora estamos fazendo diante do presépio.
É preciso entender as lições que nos dá Jesus já desde menino, desde recém-nascido, desde que os seus olhos se abriram para esta bendita terra dos homens.

Jesus, crescendo e vivendo como um de nós, revela-nos que a existência humana, a vida corrente e ordinária, tem um sentido divino.
Por muito que tenhamos pensado nestas verdades, devemos encher-nos sempre de admiração ao pensar nos trinta anos de obscuridade que constituem a maior parte da passagem de Jesus entre os seus irmãos, os homens.
Anos de sombra, mas, para nós, claros como a luz do Sol.
Mais: resplendor que ilumina os nossos dias e lhes dá uma autêntica projecção, pois somos cristãos correntes, com uma vida vulgar, igual à de tantos milhões de pessoas nos mais diversos lugares do Mundo.

Assim viveu Jesus seis lustros: era filius fabris, o filho do carpinteiro. Virão depois os três anos de vida pública, com o clamor das multidões.
E as pessoas surpreendem-se: Quem é este?
Onde aprendeu tantas coisas?
Pois a sua vida tinha sido a vida comum do povo da sua terra.
Era o faber, filius Mariae, o carpinteiro, filho de Maria.
E era Deus; e estava a realizar a redenção do género humano; e estava a atrair a si todas as coisas.

(cont)


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