07/04/2019

Leitura espiritual


EXORTAÇÃO APOSTÓLICA PÓS-SINODAL
AMORIS LÆTITIA
DO SANTO PADRE
FRANCISCO
AOS BISPOS AOS PRESBÍTEROS E AOS DIÁCONOS
ÀS PESSOAS CONSAGRADAS AOS ESPOSOS CRISTÃOS E A TODOS OS FIÉIS LEIGOS SOBRE O AMOR NA FAMÍLIA 

CAPÍTULO VII

REFORÇAR A EDUCAÇÃO DOS FILHOS.


É necessário maturar hábitos.

Os próprios hábitos adquiridos em criança têm uma função positiva, ajudando a traduzir em comportamentos externos sadios e estáveis os grandes valores interiorizados. Uma pessoa pode possuir sentimentos sociáveis e uma boa disposição para com os outros, mas se não foi habituada durante muito tempo, por insistência dos adultos, a dizer «por favor», «com licença», «obrigado», a tal boa disposição interior não se traduzirá facilmente nestas expressões. O fortalecimento da vontade e a repetição de determinadas acções constroem a conduta moral; mas, sem a repetição consciente, livre e elogiada de determinados comportamentos bons, nunca se chega a educar tal conduta. As motivações ou a atracção que sentimos por um determinado valor, não se tornam uma virtude sem estes actos adequadamente motivados.
A liberdade é algo de grandioso, mas podemos perdê-la. A educação moral é cultivar a liberdade através de propostas, motivações, aplicações práticas, estímulos, prémios, exemplos, modelos, símbolos, reflexões, exortações, revisões do modo de agir e diálogos que ajudem as pessoas a desenvolver aqueles princípios interiores estáveis que movem a praticar espontaneamente o bem. A virtude é uma convicção que se transformou num princípio interior e estável do agir. Assim, a vida virtuosa constrói a liberdade, fortifica-a e educa-a, evitando que a pessoa se torne escrava de inclinações compulsivas desumanizadoras e anti-sociais. Com efeito, a própria dignidade humana exige que cada um «proceda segundo a própria consciência e por livre adesão, ou seja, movido e induzido pessoalmente desde dentro».

O valor da sanção como estímulo. 

De igual modo, é indispensável sensibilizar a criança e o adolescente para se darem con- ta de que as más acções têm consequências. É preciso despertar a capacidade de colocar-se no lugar do outro e sentir pesar pelo seu sofrimento originado pelo mal que lhe fez. [i]

Algumas sanções – aos comportamentos anti-sociais agressivos – podem parcialmente cumprir esta finalidade. É importante orientar a criança, com firmeza, para que peça perdão e repare o mal causado aos outros. Quando o percurso educativo mostra os seus frutos num amadurecimento da liberdade pessoal, a dado momento o próprio filho começará a reconhecer, com gratidão, que foi bom para ele crescer numa família e também suportar as exigências impostas por todo o processo formativo.

A correcção é um estímulo quando, ao mesmo tempo, se apreciam e reconhecem os esforços e quando o filho descobre que os seus pais conservam viva uma paciente confiança. Uma criança corrigida com amor sente-se tida em consideração, percebe que é alguém, dá-se conta de que seus pais reconhecem as suas potencialidades. Isto não exige que os pais sejam irrepreensíveis, mas que saibam reconhecer, com humildade, os seus limites e mostrem o seu esforço pessoal por ser melhores. Mas um testemunho de que os filhos precisam da parte dos pais, é que estes não se deixem levar pela ira. O filho, que comete uma má acção, deve ser corrigido, mas nunca como um inimigo ou como alguém sobre quem se descarrega a própria agressividade. Além disso, um adulto deve reconhecer que algumas más acções têm a ver com as fragilidades e os limites próprios da idade. Por isso, seria nociva uma atitude constantemente punitiva, porque não ajudaria a notar a diferente gravidade das acções e provocaria desânimo e exasperação: «Vós, pais, não exaspereis os vossos filhos»[ii]

Condição fundamental é que a disciplina não se transforme numa mutilação do desejo, mas se torne um estímulo para ir sempre mais além. Como integrar disciplina e dinamismo interior? Como fazer para que a disciplina seja limite construtivo do caminho que uma criança deve empreender e não um muro que a aniquile ou uma dimensão da educação que a iniba? É preciso saber encontrar um equilíbrio entre dois extremos igualmente nocivos: um seria pretender construir um mundo à medida dos desejos do filho, que cresceria sentindo-se sujeito de direitos mas não de responsabilidades; o outro extremo seria levá-lo a viver sem consciência da sua dignidade, da sua identidade singular e dos seus direitos, torturado pelos deveres e submetido à realização dos desejos alheios.


(cont)

(revisão da versão portuguesa por AMA)


[i] Conc. Ecum. Vat. II, Const. past. sobre a Igreja no mundo contemporâneo Gaudium et spes, 17.
[ii] (Ef 6, 4; cf. Col 3, 21).

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