AMORIS LÆTITIA
DO SANTO PADRE FRANCISCO
AOS BISPOS AOS PRESBÍTEROS E AOS DIÁCONOS
ÀS PESSOAS CONSAGRADAS AOS ESPOSOS CRISTÃOS E A TODOS OS FIÉIS LEIGOS SOBRE O AMOR NA FAMÍLIA
CAPÍTULO VI
ALGUMAS PERSPECTIVAS PASTORAIS.
Os debates do caminho
sinodal puseram a descoberto a necessidade de desenvolver novos caminhos
pastorais, que procurarei agora resumir em geral. As diferentes comunidades é
que deverão elaborar propostas mais práticas e eficazes, que tenham em conta
tanto a doutrina da Igreja como as necessidades e desafios locais. Sem
pretender apresentar aqui uma pastoral da família, limitar-me-ei a coligir
alguns dos principais desafios pastorais.
Anunciar hoje o Evangelho da família.
Os Padres sinodais insistiram
no facto de que as famílias cristãs são, pela graça do sacramento nupcial, os
sujeitos principais da pastoral familiar, sobretudo oferecendo «o testemunho jubiloso dos cônjuges e das
famílias, igrejas domésticas». Para isso – sublinharam – é preciso
fazer-lhes «experimentar que o Evangelho da família é alegria que “enche o
coração e a vida inteira”, porque, em Cristo, somos “libertados do pecado, da
tristeza, do vazio interior, do isolamento”[i].
À luz da parábola do
semeador[ii], a nossa tarefa consiste em cooperar na sementeira: o
resto é obra de Deus.[iii]
E não se deve esquecer
também que a Igreja, que prega sobre a família, «é sinal de contradição», mas os esposos agradecem que os pastores
lhes ofereçam motivações para uma aposta corajosa num amor forte, sólido,
duradouro, capaz de enfrentar todos os imprevistos que lhes surjam.
É com humilde compreensão
que a Igreja quer chegar às famílias, com o desejo de «acompanhar todas e cada uma delas a fim de que descubram a saída melhor
para superar as dificuldades que encontram no seu caminho».
Não basta inserir uma
genérica preocupação pela família nos grandes projectos pastorais; para que as
famílias possam ser sujeitos cada vez mais activos da pastoral familiar,
requer-se «um esforço evangelizador e
catequético dirigido à família», que a encaminhe nesta direcção. «Por isso exige-se a toda a Igreja uma
conversão missionária: é preciso não se contentar com um anúncio puramente
teórico e desligado dos problemas reais das pessoas».
A pastoral familiar «deve
fazer experimentar que o Evangelho da família é resposta às expectativas mais
profundas da pessoa humana: a sua dignidade e plena realização na reciprocidade,
na comunhão e na fecundidade.[iv]
Não se trata apenas de
apresentar uma normativa, mas de propor valores, correspondendo à necessidade
deles que se constata hoje, mesmo nos países mais secularizados.
De igual modo «sublinhou-se a necessidade duma evangelização
que denuncie, com desassombro, os condicionalismos culturais, sociais,
políticos e económicos, bem como o espaço excessivo dado à lógica do mercado,
que impedem uma vida familiar autêntica, gerando discriminação, pobreza,
exclusão e violência. Para isso, temos de entrar em diálogo e cooperação com as
estruturas sociais, bem como encorajar e apoiar os leigos que se comprometem,
como cristãos, no âmbito cultural e sociopolítico».
«A principal contribuição para a pastoral familiar é oferecida pela
paróquia, que é uma família de famílias, onde se harmonizam os contributos das
pequenas comunidades, movimentos e associações eclesiais». A par duma
pastoral especificamente voltada para as famílias, há necessidade duma «formação mais adequada dos presbíteros,
diáconos, religiosos e religiosas, catequistas e restantes agentes pastorais».
Nas respostas às
consultações promovidas em todo o mundo, ressaltou-se que os ministros
ordenados carecem, habitualmente, de formação adequada para tratar dos complexos
problemas actuais das famílias; para isso, pode ser útil também a experiência
da longa tradição oriental dos sacerdotes casados.[v]
Os seminaristas deveriam
ter acesso a uma formação interdisciplinar mais ampla sobre namoro e
matrimónio, não se limitando à doutrina. Além disso, a formação nem sempre lhes
permite desenvolver o seu mundo psico-afectivo. Alguns carregam, na sua vida, a
experiência da sua própria família ferida, com a ausência de pais e
instabilidade emocional. É preciso garantir um amadurecimento, durante a
formação, para que os futuros ministros possuam o equilíbrio psíquico que a sua
missão lhes exige. Os laços familiares são fundamentais para fortificar a
auto-estima sadia dos seminaristas. Por isso, é importante que as famílias
acompanhem todo o processo do Seminário e do sacerdócio, pois ajudam a revigorá-lo
de forma realista. Neste sentido, é salutar a combinação de tempos de vida no
Seminário com outros de vida em paróquias, que permitam tomar maior contacto
com a realidade concreta das famílias.
De facto, ao longo da sua
vida pastoral, o sacerdote encontra-se sobretudo com famílias. «A presença dos leigos e das famílias,
particularmente a presença feminina, na formação sacerdotal, favorece o apreço
pela variedade e complementaridade das diferentes vocações na Igreja».
As respostas às consultas
exprimem, com insistência, também a necessidade de formar agentes leigos de
pastoral familiar, com a ajuda de psicopedagogos, médicos de família, médicos
de comunidade, assistentes sociais, advogados de menores e família, predispondo-os
para receber as contribuições da psicologia, sociologia, sexologia e até aconselhamento.
Os profissionais, particularmente aqueles que têm experiência de acompanhamento,
ajudam a encarnar as propostas pastorais nas situações reais e nas preocupações
concretas das famílias. «Os itinerários e
cursos de formação destinados especificamente aos agentes pastorais poderão
torná-los idóneos a inserir o próprio caminho de preparação para o matrimónio
na dinâmica mais ampla da vida eclesial».
Uma boa preparação
pastoral é importante, «sobretudo tendo
em vista as particulares situações de emergência decorrentes dos casos de
violência doméstica e abuso sexual».
Tudo isto em nada diminui,
antes integra, o valor fundamental da direcção espiritual, dos recursos
espirituais inestimáveis da Igreja e da Reconciliação sacramental.
Guiar os noivos no caminho de preparação para o matrimónio.
Os Padres sinodais
afirmaram, de várias maneiras, que é preciso ajudar os jovens a descobrir o
valor e a riqueza do matrimónio.
Devem poder captar o fascínio
duma união plena que eleva e aperfeiçoa a dimensão social da vida, confere à
sexualidade o seu sentido maior, ao mesmo tempo que promove o bem dos filhos e proporciona
lhes o melhor contexto para o seu amadurecimento e educação.
«A complexa realidade social e os desafios, que a família é chamada a
enfrentar actualmente, exigem um empenhamento maior de toda a comunidade cristã
na preparação dos noivos para o matrimónio. É necessário lembrar a importância
das virtudes. Dentre elas, resulta ser condição preciosa para o crescimento
genuíno do amor interpessoal a castidade. A respeito desta necessidade, os
Padres sinodais foram concordes em sublinhar a exigência dum maior envolvimento
de toda a comunidade, privilegiando o testemunho das próprias famílias, e a
exigência ainda duma radicação da preparação para o matrimónio no caminho da
iniciação cristã, sublinhando o nexo do matrimónio com o baptismo e os outros
sacramentos. Da mesma forma, evidenciou-se a necessidade de programas específicos
de preparação próxima para o matrimónio que sejam verdadeira experiência de
participação na vida eclesial e aprofundem os vários aspectos da vida familiar».[vi]
Convido as comunidades
cristãs a reconhecerem que é um bem para elas mesmas acompanhar o caminho de
amor dos noivos. Como justamente disseram os bispos da Itália, aqueles que se
casam são, para as comunidades cristãs, «um
recurso precioso, porque, esforçando-se sinceramente por crescer no amor e no
dom recíproco, podem contribuir para renovar o próprio tecido de todo o corpo
eclesial: a forma particular de amizade que vivem pode tornar-se contagiosa,
fazendo crescer na amizade e na fraternidade a comunidade cristã de que fazem
parte».
(cont)
(revisão da versão
portuguesa por AMA)
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