Há
quem pense que ser fiel significa perder a liberdade, talvez porque confunda
liberdade com independência.
Depender
de alguma coisa ou de alguém – como o filho depende de sua mãe, ou a respiração
do oxigénio, ou o peixe da água – não pode ser considerado como uma limitação
da liberdade, mas antes como sua condição essencial.
Não
se chega à existência se não se é concebido e dado à luz; morreríamos de
asfixia se nos faltasse o ar, como o peixe que é tirado da água: são
dependências que, em vez de nos escravizarem, nos dão a liberdade de viver.
Talvez
se pudesse identificar liberdade e independência no reino animal, que só goza
da chamada liberdade física.
Mas,
no caso do homem, trata-se de uma liberdade racional, que se reveste de um
carácter moral.
É
algo de interior, caracterizado pela capacidade de orientar a própria
existência para o bem e de poder escolher os melhores recursos em função do
fim.
Por
isso, apenas os seres dotados de inteligência podem chamar-se livres no seu pleno
sentido.
E
somente um ser livre está em condições de comprometer o seu tempo, os seus
talentos, os seus bens, o seu amor e até a sua vida, quando encontra para isso
uma razão proporcionada.
A
fidelidade exige limites indestrutíveis, relações insubornáveis.
Há
quem tema qualquer compromisso, seja de que natureza for, como se fosse um
atentado à sua liberdade.
Não
se percebe que o homem – como as árvores – para elevar-se tem impedimentos rumo
às alturas, tem de mergulhar as suas raízes na terra, ser abraçado por ela e
permanecer sujeito, vinculado!
Sim,
vinculado.
Se
a árvore pretendesse “libertar-se” da terra apenas encontraria a sua própria
destruição.
Quando
a liberdade não cria vínculos, em breve se converte em grilhão de morte.
Não
podemos existir sem estar submetidos a umas normas.
Para
não sermos expelidos para o espaço vazio, necessitamos da lei da gravidade;
para que a ave possa remontar-se às alturas e o avião manter-se em pleno voo,
carecem da resistência do ar; para que as estrelas subsistam, devem
subordinar-se às suas órbitas.
E
para que a sociedade possa permanecer como tal, deve ser fiel a umas leis morais,
a umas normas éticas: quem pretendesse desprezá-las, como fossem coacção substituiria
a liberdade pela libertinagem.
Se
queremos a verdadeira liberdade, procuremo-la na fidelidade.
Se
queremos a expressão de nós mesmos, a nossa espiritualidade, a nossa autonomia
interior, a nossa paz, somente a fidelidade nos poderá dar esses bens.
A
virtude da fidelidade lança raízes exclusivamente em homens livres.
Um
escravo não pode chamar-se fiel, a não ser que resolva assumir interiormente –
com liberdade pessoal- a sua servidão.
Somente
as pessoas livres – que o sejam de verdade por saberem responsabilizar-se
voluntariamente pelos seus compromissos – podem receber sem mentira o
enaltecedor e belíssimo nome de fiéis.
(Cfr
FIDELIDADE, de Javier Abad Gómez, 1989)
(Revisão
da versão portuguesa por AMA)
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