O
TESOURO VERDADEIRO
Com as reflexões
anteriores, procuramos desenhar um quadro da bondade actuante.
Agora, olhando com
perspectiva essa pintura, é necessário concluir que, dentre os traços do
quadro, talvez esteja faltando ressaltar o principal.
A razão é simples.
Todas as cores que se
juntam para compor a luz da bondade apontam para uma única finalidade, várias
vezes recordada ao longo destas páginas: fazer o bem.
Por isso, o que é
realmente decisivo é ter uma ideia clara sobre o verdadeiro conceito de bem.
De nada adiantaria
empenharmo-nos generosamente em fazer o bem aos outros, se, no final das
contas, terminássemos por descobrir que, pretendendo ajudá-los, involuntariamente
lhes fizemos mal ou, o que vem a dar na mesma, lhes proporcionamos bens
fictícios e omitimos o bem real.
Daí a grande importância
de não perdermos nunca de vista qual é o verdadeiro bem do homem, o único bem, sem
o qual nenhum dos outros merece esse nome.
A resposta a essa pergunta
sobre o bem já foi dada por Cristo:
Que
aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro se vier a perder a sua alma? Ou que
poderá dar o homem em troca da sua alma? (Mt 16, 26).
Estas palavras brilham
como um lampejo no meio da escuridão.
Nenhum “bem” vale a pena se
a alma estiver privada da Vida da graça de Deus.
Com efeito, sem a graça
divina, uma alma está morta e, então, as melhores qualidades e “bens” de que
possa dispor não passam de flores vistosas enfeitando um cadáver.
Estando ausente a vida,
“de que aproveitam” as flores?
Deveriam pensar mais nisto,
todos os que amam, todos aqueles que, por terem a fé cristã, são capazes de
compreender a perspectiva de Cristo.
Sim, deveríamos entender
que “querer bem” outra coisa não é que “querer o bem” do próximo, e que não há
bem algum quando falta Deus.
“A quem tem Deus – dizia
Santa Teresa de Ávila – nada lhe falta”.
A quem não o tem, podemos
acrescentar, nada lhe aproveita.
É excelente, sem dúvida, o
empenho dos pais em que os filhos tenham saúde, cultura, bem-estar, capacitação
profissional que lhes permita enfrentar com segurança o futuro.
Mas é um empenho muito
mais excelente e vital – por ser decisivo, questão de vida ou morte –
esforçarem-se com a sua oração, o seu exemplo e uma orientação prudente e contínua,
para que os filhos conheçam as verdades da fé cristã – a doutrina salvadora de
Cristo – e aprendam a praticá-las.
Podem ter a certeza de que
as virtudes cristãs de um filho vão fazer-lhe, ao longo do dia, um bem infinitamente
maior do que todos os diplomas ou contas bancárias que lhes possam
proporcionar.
Mil vezes mais vale a fé
do que a saúde, a união com Deus do que o sucesso.
Só as virtudes cristãs são
os tesouros verdadeiros de que Cristo falava (Mt 6, 19-20).
E só esses tesouros
proporcionam àqueles que amamos a “realização” – o bem e a plenitude –, quer
nesta terra, quer na eternidade.
Sem esta convicção, todos
os ideais de bondade se dissolvem como um sonho ilusório.
Sempre deveria ecoar em
nossos ouvidos, como um roteiro de bondade, o segredo que Cristo confidenciou a
Marta:
Tu
te inquietas e te perturbas por muitas coisas; no entanto, uma só coisa é necessária.
Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada
(Lc 10, 41-42).
A “melhor parte” é
estarmos junto de Cristo, atentos às suas palavras, fazendo da Vontade de Deus
a luz e o norte da vida.
Aí está o verdadeiro bem
do homem.
* * *
Começávamos estas páginas
constatando que uma das impressões mais gratas e indeléveis da vida é ter
conhecido um homem bom.
Ao encerrá-las com estes
últimos pensamentos, talvez seja o momento de tomarmos consciência de que esse
homem bom, deveríamos sê-lo cada um de nós.
Afinal, foi para isso que
Deus nos pôs no mundo, e a nós nos cabe – com a sua ajuda – trabalhar por
consegui-lo.
Não duvidemos de que,
quando o curso desta nossa vida terrena se encerrar, uma das nossas maiores
alegrias será olhar para trás e ver que a nossa passagem pelo mundo não foi
inútil.
Valerá a pena termos
vivido se, nessa hora definitiva, pudermos dizer que, pela misericórdia divina
e apesar das nossas misérias, tivemos a graça de ser um reflexo da bondade de
Deus nos corações dos homens.
FIM
[i]
Francisco Faus é licenciado em Direito pela
Universidade de Barcelona e Doutor em Direito Canónico pela Universidade de São
Tomás de Aquino de Roma. Ordenado sacerdote em 1955, reside em São Paulo, onde
exerce uma intensa atividade de atenção espiritual entre estudantes
universitários e profissionais. Autor de diversas obras literárias, algumas
delas premiadas, já publicou na coleção Temas Cristãos, entre outros, os
títulos O valor das dificuldades, O homem bom, Lágrimas de Cristo, lágrimas dos
homens, Maria, a mãe de Jesus, A voz da consciência e A paz na família.
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