São Josemaria Escrivá
Cristo que passa 37 a 40
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E, com os Reis Magos,
oferecemos também mirra, isto é, o sacrifício, que não deve faltar na vida
cristã.
A mirra traz à nossa
lembrança a Paixão do Senhor: na cruz, dão-lhe a beber mirra misturada com
vinho, e com mirra ungiram o seu corpo para a sepultura.
Mas não penseis que
meditar na necessidade de sacrifício e da mortificação significa dar uma nota
de tristeza a esta festa que comemoramos alegremente no dia de hoje.
Mortificação não é
pessimismo nem espírito azedo.
A mortificação nada vale
sem a caridade: por isso, havemos de procurar mortificações que, além de nos
manterem livres em relação às coisas da terra, não mortifiquem os que vivem à
nossa volta.
O cristão não pode ser um
verdugo nem um miserável; há-de ser um homem que sabe ama com obras, que prova
o seu amor na pedra de toque da dor.
Mas - insisto - essa
mortificação não consistirá habitualmente em grandes renúncias, cuja
oportunidade não se nos depara com frequência.
Há-de estar feita de
pequenas vitórias: ter um sorriso para quem nos incomoda, negar ao corpo o
capricho dos bens supérfluos, habituarmo-nos a ouvir os outros, fazer render o
tempo que Deus põe à nossa disposição... e tantos outros pormenores,
aparentemente insignificantes - contrariedades, dificuldades, dissabores - que
surgem ao longo do dia sem os procurarmos.
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Sancta Maria, Stella
Orientis
Termino repetindo umas
palavras do Evangelho de hoje: ao entrarem em casa, viram o Menino com Maria,
sua Mãe. Nossa Senhora não se separa do seu Filho.
Os Reis Magos não são
recebidos por um rei sentado no trono, mas por um Menino nos braços da Mãe.
Peçamos, pois, à Mãe de Deus, que é nossa Mãe, que nos prepare o caminho que
conduz à plenitude do amor: Cor Mariæ dulcissimum, iter para tutum!
O seu suave coração
conhece o caminho mais seguro para encontrarmos Cristo.
Os Reis Magos tiveram uma
estrela; nós temos Maria, Stella Maris, Stella Orientis.
No dia de hoje,
dizemos-lhe: Santa Maria, Estrela do mar, Estrela da manhã, ajuda os teus
filhos.
O nosso cuidado pelas
almas não deve conhecer fronteiras, porque ninguém está excluído do amor de
Cristo.
Os Reis Magos foram os
primeiros dos gentios; mas, depois de consumada a Redenção, já não há judeu nem
grego, não há servo nem livre, não há homem nem mulher - não existe
descriminação de espécie alguma - porque todos vós sois um só em Jesus Cristo.
Nós cristãos, não podemos
ser exclusivistas, nem separar ou catalogar as almas; virão muitos do Oriente e
do Ocidente; todos cabem no coração de Cristo.
Voltamos a contemplá-lo no
presépio; os seus braços são de menino mas são os mesmos que se abrirão na
Cruz, atraindo todos os homens.
E o nosso pensamento vai
também para esse homem justo, Nosso Pai e Senhor, S. José, que, como
habitualmente, passa despercebido na cena da Epifania.
Pressinto-o recolhido em
contemplação, protegendo com amor o Filho de Deus, que, ao fazer-se homem, foi
confiado à sua atenção paternal.
Com a maravilhosa
delicadeza de quem não vive para si, o Santo Patriarca entrega-se com um
espírito de sacrifício tão silencioso como eficaz.
Falámos hoje da vida de
oração e do afã de apostolado.
Queremos porventura melhor
mestre nesta matéria do que S. José? Se quereis que vos dê um conselho,
dir-vos-ei - com palavras que venho a repetir incansavelmente desde há muitos
anos: Ite ad Joseph, recorrei a S. José; ele vos mostrará caminhos concretos e
meios humanos e divinos para chegar a Jesus.
E em breve ousareis, tal
como ele, segurar nos braços, beijar, vestir e cuidar deste Menino Deus que
nasceu para nós.
Em sinal de veneração, os
Magos ofereceram a Jesus ouro, incenso e mirra; José deu-lhe plenamente o
coração jovem, cheio de amor.
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A Igreja inteira reconhece
S. José como seu protector e padroeiro.
Ao longo dos séculos
tem-se falado dele, sublinhando diversos aspectos da sua vida, sempre fiel à
missão que Deus lhe confiara.
Por isso, desde há muitos
anos, me agrada invocá-lo com um título carinhoso: Nosso Pai e Senhor.
S. José é realmente Pai e
Senhor, protegendo e acompanhando no seu caminho terreno aqueles que o veneram,
como protegeu e acompanhou Jesus enquanto crescia e se fazia homem.
Ganhando intimidade com
ele descobre-se que o Santo Patriarca é, além disso, Mestre da vida interior,
porque nos ensina a conhecer Jesus, a conviver com Ele, a tomar consciência de
que fazemos parte da família de Deus.
E S. José dá-nos essas
lições sendo, como foi, um homem corrente, um pai de família, um trabalhador
que ganhava a vida com o esforço das suas mãos.
Este facto possui também,
para nós, um significado que é motivo de reflexão e de alegria.
Ao celebrar hoje a sua
festa, quero evocar a sua figura, recordando o que dele nos diz o Evangelho
para podermos assim descobrir melhor o que, através da vida simples do Esposo
de Santa Maria, nos transmite Deus.
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A figura de S. José no
Evangelho
Tanto S. Mateus como S.
Lucas nos falam de S. José como varão descendente de uma estirpe ilustre: a de
David e de Salomão, reis de Israel.
Historicamente, os
pormenores dessa descendência são algo confusos.
Não sabemos qual das duas
genealogias que os evangelistas trazem corresponde a Maria - Mãe de Jesus,
segundo a carne - e qual a S. José, que era seu Pai segundo a lei judaica.
Nem sabemos se a cidade
natal de José era Belém, onde se dirigiu para se recensear, ou Nazaré, onde
vivia e trabalhava.
Sabemos, no entanto, que
não era uma pessoa rica; era um trabalhador como milhões de homens no mundo.
Exercia o ofício fatigante
e humilde que Deus escolheu também para Si quando tomou a nossa carne e viveu
trinta anos como uma pessoa mais entre nós.
A Sagrada Escritura diz
que José era artesão.
Vários Padres acrescentam
que foi carpinteiro. S. Justino, falando da vida de trabalho de Jesus, afirma
que fazia arados e jugos. Baseando-se talvez nestas palavras, Santo Isidoro de
Sevilha concluiu que José era ferreiro.
De qualquer modo era um
operário que trabalhava ao serviço dos seus concidadãos, que tinha uma
habilidade manual, fruto de anos de esforço e de suor.
Das narrações evangélicas
depreende-se a grande personalidade humana de S. José: em nenhum momento nos
aparece como um homem diminuído ou assustado perante a vida; pelo contrário,
sabe enfrentar-se com os problemas, superar as situações difíceis, assumir com
responsabilidade e iniciativa os trabalhos que lhe são encomendados.
Não estou de acordo com a
forma clássica de representar S. José como um homem velho, apesar da boa
intenção de se destacar a perpétua virgindade de Maria.
Eu imagino-o jovem, forte,
talvez com alguns anos mais do que a Virgem, mas na pujança da vida e das
forças humanas.
Para viver a virtude da
castidade não é preciso ser-se velho ou carecer de vigor.
A castidade nasce do amor;
a força e a alegria da juventude não constituem obstáculo para um amor limpo.
Jovem era o coração e o
corpo de S. José quando contraiu matrimónio com Maria, quando conheceu o
mistério da sua Maternidade Divina, quando vivei junto d'Ela respeitando a
integridade que Deus lhe queria oferecer ao mundo como mais um sinal da sua
vinda às criaturas.
Quem não for capaz de
compreender um amor assim conhece muito mal o verdadeiro amor e desconhece por
completo o sentido cristão da castidade.
Como dizíamos, José era
artesão da Galileia, um homem como tantos outros.
E que pode esperar da vida
um habitante de uma aldeia perdida, como era Nazaré?
Apenas trabalho, todos os
dias, sempre com o mesmo esforço.
E, no fim da jornada, uma
casa pobre e pequena, para recuperar as forças e recomeçar o trabalho no dia
seguinte.
Mas o nome de José
significa em hebreu Deus acrescentará.
Deus dá à vida santa dos
que cumprem a sua vontade dimensões insuspeitadas, o que a torna importante, o
que dá valor a todas as coisas, o que a torna divina.
À vida humilde e santa de
S. José, Deus acrescentou - se me é permitido falar assim - a vida da Virgem
Maria e a de Jesus Nosso Senhor.
Deus nunca se deixa vencer
em generosidade. José podia fazer suas as palavras que pronunciou Santa Maria,
sua Esposa: Quia fecit mihi magna qui potens est, fez em mim grandes coisas
Aquele que é todo poderoso quia respexit humilitatem, porque pôs o seu olhar na
minha pequenez.
José era efectivamente um
homem corrente, em quem Deus confiou para realizar coisas grandes.
Soube viver exactamente
como o Senhor queria todos e cada um dos acontecimentos que compuseram a sua
vida.
Por isso, a Sagrada
Escritura louva José, afirmando que era justo.
E, na língua hebreia,
justo quer dizer piedoso, servidor irrepreensível de Deus, cumpridor da vontade
divina; outras vezes significa bom e caritativo para com o próximo.
Numa palavra, o justo é o
que ama a Deus e demonstra esse amor, cumprindo os seus mandamentos e
orientando toda a sua vida para o serviço dos seus irmãos, os homens.
(cont)