Art.
5 — Se a sabedoria é a maior das virtudes intelectuais.
O quinto discute-se assim.
— Parece que a sabedoria não é a maior das virtudes intelectuais.
1. — Pois, quem dirige é
maior que o dirigido. Ora, parece que a prudência impera sobre a sabedoria como
diz o Filósofo: esta, i. é, a política, relativa à prudência, segundo ficou
dito [2],
esta preordena quais as artes que devem
existir no Estado, e quais e até que ponto cada um as deve estudar [3].
Ora, como a sabedoria também faz parte da ciência, resulta que a prudência é
maior que ela.
2. Demais. — É da essência
da virtude ordenar o homem à felicidade, pois, ela é a disposição do que é
perfeito para o que é óptimo, como se disse [4].
Ora, a prudência é a razão recta dos actos, pelos quais alcançamos a
felicidade; ora, a sabedoria não considera esses actos. Logo, a prudência é
maior que ela.
3. Demais. — Tanto mais
perfeito, tanto maior é o conhecimento. Ora, podemos ter um conhecimento mais perfeito das coisas humanas, com as
quais se ocupa a ciência, do que das divinas, objecto da sabedoria, como
diz Agostinho [5];
porque as coisas divinas são incompreensíveis, conforme a Escritura (Job
36, 26): Com efeito, Deus é grande,
que sobreexcede a nossa ciência. Logo a ciência é maior virtude que a
sabedoria.
4. Demais. — O
conhecimento dos princípios é mais digno que o das conclusões. Ora, a
sabedoria, como as outras ciências, conclui partindo de princípios
indemonstráveis, objecto do intelecto. Logo, o intelecto é maior virtude que a
sabedoria.
Mas, em contrário, o
Filósofo diz, que a sabedoria é como a
cabeça das virtudes intelectuais [6].
SOLUÇÃO. — Como já
dissemos [7],
a grandeza específica de uma virtude depende do seu objecto. Ora; o objecto da
sabedoria tem precedência sobre os objectos de todas as virtudes intelectuais,
pois, é Deus, causa altíssima, como já dissemos [8].
E como pela causa julgamos do efeito, e pela causa superior, das inferiores, à
sabedoria cabe julgar de todas as outras virtudes intelectuais e ordená-las a
todas, e é quase arquitectónica em relação a todas.
DONDE A RESPOSTA À
PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Versando a prudência sobre as coisas humanas e a
sabedoria, sobre a causa altíssima, é impossível seja a prudência maior virtude
que a sabedoria, a menos que, como se disse, o homem fosse o que há de maior no
mundo [9].
Donde, devemos concluir, conforme também já está dito [10]
que a prudência não governa a sabedoria, mas ao inverso, pois, como diz a
Escritura (1 Cor 2, 15), o
espiritual julga todas as coisas, e ele não é julgado de ninguém. Assim, a
prudência não deve se ocupar com as coisas altíssimas, que a sabedoria
considera, mas dirige aquilo que se ordena à sabedoria, i. é, se ocupa com o
modo pelo qual os homens devem chegar à sabedoria. E por aí a prudência ou
política é ministra da sabedoria, pois conduz a ela, preparando-lhe a via, como
o ostiário ao rei.
RESPOSTA À SEGUNDA. — A
prudência considera os meios pelos quais chegamos à felicidade, ao passo que a
sabedoria considera o objecto mesmo da felicidade que é o inteligível
altíssimo. Ora, se a sabedoria fosse perfeita no considerar o seu objecto,
nesse acto consistiria a felicidade perfeita. Mas, como o acto da sabedoria
nesta vida é imperfeito, em relação ao seu principal objecto que é Deus, esse acto
é uma como incoação ou participação da felicidade futura. E portanto, está mais
próxima da felicidade que a prudência.
RESPOSTA À TERCEIRA. —
Como diz o Filósofo, um conhecimento é
superior a outro, ou porque tem um objecto mais nobre, ou pela sua certeza[11].
Se porém os objectos fossem iguais em bondade e nobreza, a virtude mais certa
será a maior. Mas a menos certa porém, com objectos mais altos e mais
importantes, é superior a mais certa, mas que tem por objecto coisas
inferiores. Por isso o Filósofo diz que é
grande coisa poder conhecer algo sobre as coisas celestes, mesmo por uma razão
débil e local [12].
E, noutro lugar, Aristóteles diz, que é
preferível conhecer um pouco dos seres mais nobres, que conhecer muito de seres
inferiores [13].
Donde, a sabedoria, cujo objecto é o conhecimento de Deus, o homem, no estado
da vida presente, não pode alcançá-la perfeitamente, de modo a ter-lhe a posse,
o que só é próprio de Deus, como se disse [14].
Porém, mesmo esse pequeno conhecimento, que, pela sabedoria, podemos ter de
Deus, é preferível a qualquer outro.
RESPOSTA À QUARTA. — A
verdade e o conhecimento dos princípios indemonstráveis, depende da natureza
dos termos. Assim, quem souber o que é o todo e o que é a parte, imediatamente
compreenderá que o todo é maior que a parte. Ora, conhecer em que consiste o
ente e o não-ente, o todo e a parte, e tudo o mais que resulta do ser e de que
se constituem como termos; os princípios indemonstráveis, isso pertence à
sabedoria. Pois, o ser comum é efeito próprio da causa altíssima, i. é, Deus. E
portanto, a sabedoria não só se serve dos princípios indemonstráveis, que é o objecto
do intelecto, para por eles chegar a conclusões, como o fazem também as outras
ciências, mas também os julga e disputa contra os que os negam. Donde se
conclui que a sabedoria é maior virtude que o intelecto.
(Revisão
da versão portuguesa por AMA)
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