Questão
63: Do efeito principal dos Sacramentos, que é a graça.
Art.
2 — Se o carácter é um poder espiritual.
O segundo discute-se assim. — Parece
que o carácter não é um poder espiritual.
1. – Pois, carácter é o mesmo que
figura; por isso no lugar em que o Apóstolo fala da figura da sua substância no
grego se lê, em lugar de figura carácter. Ora a figura pertence à quarta
espécie de qualidade; e assim difere do poder, pertencente à segunda espécie de
qualidade. Logo, o carácter não é um poder espiritual.
2. – Demais. — Dionísio diz: A divina
beatitude recebe a participação de si o que busca a beatitude e com o seu lume
próprio, por um como sinal, permite-lhe a sua participação. E assim parece que
o carácter é um certo lume. Ora, o lume pertence antes à terceira espécie de qualidade.
Logo, o carácter não é um poder, considerado como pertencente à segunda
espécie de qualidade.
3. Demais. — Certos definem o carácter
assim: O carácter é o sinal santo da comunhão da fé e da santa ordenação dado
pelo hierarca. Ora, o sinal pertence ao gênero da relação, mas não ao gênero do
poder. Logo, o carácter não é um poder espiritual.
4. Demais. — O poder exerce a função
de causa e de principio, como se lê em Aristóteles. Ora, o sinal, que entra na
definição do carácter, antes implica a noção de efeito. Logo o carácter não é
um poder espiritual.
Mas, em contrário, o Filósofo diz:
Três elementos há na alma - a potência, o hábito e a paixão. Ora, o carácter
não é paixão porque a paixão logo passa e, ao contrário, o carácter é
indelével, como a seguir se dirá. Semelhantemente, também não é um hábito.
Porque nenhum hábito há que possa ser usado tanto para o bem como para o mal.
Ora, o carácter pode sê-la de um e de outro modo, pois, certos usam bem dele e
outros, mal. O que não se dá com os hábitos, pois, do hábito da virtude ninguém
pode usar mal, e do hábito do mal ninguém pode usar bem. Logo, conclui-se que o
carácter é uma potência.
Como dissemos, os
sacramentos da lei nova imprimem carácter, porque por eles se destinam os
homens ao culto de Deus segundo o rito da religião cristã. Por isso Dionísio,
depois de ter dito, que Deus por um certo sinal, concede a participação de si
ao que recebe o baptismo, acrescenta: tornando-o divino e dispensado de bens
divinos. Ora, o culto divino consiste ou em receber bens divinos ou em
comunicá-los aos outros. Ora, para ambas essas coisas é necessária uma
potência; pois, para dar alguma coisa a alguém é necessária uma potência
activa; e para receber é necessária a potência passiva. Por isso o carácter
implica uma certa potência espiritual ordenada às cousas do culto divino. -
Mas, devemos saber que essa potência espiritual é instrumental, como também já
antes dissemos da virtude existente nos sacramentos. Pois, ter o carácter do
sacramento compete aos ministros de Deus, porque o ministro se comporta como
instrumento, no dizer do Filósofo. Por onde, assim como a virtude que têm os
sacramentos, não pertence essencialmente a um gênero, mas só por uma redução
porque tem uma existência emanada de outra e incompleta, assim também o carácter
não pertence propriamente a nenhum gênero ou espécie, mas se reduz à segunda
espécie de qualidade.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. A
figura é de certo modo uma terminação da quantidade. Por isso, propriamente
falando, só os seres materiais têm figura; os espirituais só a têm
metaforicamente. Ora, nenhum ser pertence a um gênero ou a uma espécie, senão
pelo que dele se predica propriamente. Por isso o carácter não pode pertencer à
quarta espécie de qualidade, embora certos o dissessem.
RESPOSTA À SEGUNDA. – A terceira
espécie de qualidade só pertencem as paixões sensíveis ou as qualidades
sensíveis. Ora, o carácter não é um lume sensível. E por isso não pertence à
terceira espécie de qualidade, como certos disseram.
RESPOSTA À TERCEIRA. — A relação que
implica o nome de sinal há de forçosamente ter algum fundamento. Ora, a
relação desse sinal, que é o carácter, não pode fundar-se imediatamente sobre a
essência da alma, porque então conviria naturalmente a toda alma. E por isso é
necessário supor alguma coisa na alma sobre o que se funde essa relação. E
essa é a essência do carácter. Por onde, não é necessário pertença ao género da
relação, como o disseram certos.
RESPOSTA À QUARTA. — O carácter tem
natureza de sinal por comparação com o sacramento sensível pelo qual é
impresso. Mas, em si mesmo considerado tem natureza de princípio, do modo já
referido.
Nota: Revisão da versão portuguesa por
ama.