O quarto mandamento
dirige-se expressamente aos filhos nas suas relações com os seus pais. No
entanto, refere-se também a outras relações de parentesco, educativas, de
trabalho, etc.
1.
Diferença entre os três primeiros mandamentos do Decálogo e os sete seguintes
Os três primeiros
mandamentos falam do amor de Deus, Sumo Bem e Fim Último da pessoa criada e de
todas as criaturas do universo, infinitamente digno de ser amado. Os sete restantes
têm como objecto o bem do próximo (e o bem pessoal), que deve ser amado por
amor de Deus, que é o seu Criador. No Novo testamento, o preceito supremo de
amar a Deus e o segundo, semelhante ao primeiro, de amar o próximo por amor de
Deus, compendiam todos os mandamentos do Decálogo (cf. Mt 22, 36-40; Catecismo,
2196).
2.
Significado e extensão do quarto mandamento
O quarto mandamento
dirige-se expressamente aos filhos nas suas relações com os seus pais.
Refere-se também às relações de parentesco com outros membros do agregado
familiar. Finalmente, estende-se aos deveres dos alunos relativamente aos
professores, dos subordinados em relação com os seus chefes, dos cidadãos para
com a sua pátria, etc. Este mandamento implica e subentende também os deveres
dos pais e de todos os que exercem autoridade sobre outros (cf. Catecismo,
2199). a) A família. O quarto mandamento refere-se em primeiro lugar às
relações entre pais e filhos no seio da família. «Ao criar o homem e a mulher,
Deus instituiu a família humana e dotou-a da sua constituição fundamental»
(Catecismo, 2203). «Um homem e uma mulher, unidos em matrimónio, formam com os
seus filhos uma família» (Catecismo, 2202). «A família cristã é uma comunhão de
pessoas, vestígio e imagem da comunhão do Pai e do Filho, no Espírito Santo»
(Catecismo, 2205). b) Família e sociedade. «A família é a célula originária da
vida social. É ela a sociedade natural em que o homem e a mulher são chamados
ao dom de si no amor e no dom da vida. A autoridade, a estabilidade e a vida de
relações no seio da família constituem os fundamentos da liberdade, da
segurança, da fraternidade no seio da sociedade. (…) A vida da família é
iniciação à vida em sociedade» (Catecismo, 2207). «A família deve viver de modo
que os seus membros aprendam a preocupar-se e a encarregar-se dos jovens e dos
velhos, das pessoas doentes ou incapacitadas e dos pobres» (Catecismo, 2208).
«O quarto mandamento esclarece as outras relações na sociedade» (Catecismo,
2212)[1]. A sociedade tem o grave dever de apoiar e fortalecer o matrimónio e a
família, reconhecendo a sua autêntica natureza, favorecendo a sua prosperidade
e assegurando a moralidade pública (cf. Catecismo, 2210)[2]. No ambiente
familiar, a Sagrada Família é modelo para qualquer família: modelo de amor e de
serviço, de obediência e de autoridade.
3.
Deveres dos filhos para com os pais
Os filhos hão-de respeitar e
honrar os pais, procurar dar-lhes alegrias, rezar por eles e corresponder
lealmente ao seu sacrifício: para um bom cristão, estes deveres são um
dulcíssimo preceito. A paternidade divina é a fonte da paternidade humana cf.
Ef 3, 14); é o fundamento da honra devida aos pais (cf. Catecismo, 2214). «O
respeito pelos pais (piedade filial) é feito de reconhecimento àqueles que,
pelo dom da vida, pelo seu amor e seu trabalho, puseram os filhos no mundo e
lhes permitiram crescer em estatura, sabedoria e graça. “Honra o teu pai de
todo o teu coração e não esqueças as dores da tua mãe. Lembra-te de que foram
eles que te geraram. Como lhes retribuirás o que por ti fizeram?” (Sir 7,
27-28)» (Catecismo, 2215
O respeito filial
manifesta-se na docilidade e obediência. «Filhos, obedecei em tudo aos vossos
pais, pois isto é agradável ao Senhor» (Cl 3, 20). Enquanto estão sujeitos aos
seus pais, os filhos devem obedecer-lhes no que disponham para o seu bem e o da
família. Esta obrigação cessa com a emancipação dos filhos, mas não cessa nunca
o respeito que devem aos seus pais (cf. Catecismo, 2216-2217). «O quarto
mandamento lembra aos filhos adultos as suas responsabilidades para com os
pais. Tanto quanto lhes for possível, devem prestar-lhes ajuda material e
moral, nos anos da velhice e no tempo da doença, da solidão ou do desânimo»
(Catecismo, 2218). Se os pais mandarem alguma coisa oposta à Lei de Deus, os
filhos estão obrigados a antepor a vontade de Deus aos desejos dos pais, tendo
presente que «é necessário obedecer antes a Deus que aos homens» (Act 5, 29).
Deus é mais Pai do que os nossos pais: d’Ele procede toda a paternidade (cf. Ef
3, 15).
4.
Deveres dos pais
Os pais hão-de receber com
agradecimento, como uma grande bênção e manifestação de confiança, os filhos
que Deus lhes enviar. Além de cuidarem das suas necessidades materiais, têm a
grave responsabilidade de lhes dar uma recta educação humana e cristã. O papel
dos pais na formação dos filhos tem tanto peso que, quando falta, dificilmente
se poderá suprir[3]. O direito e o dever da educação são, para os pais,
primordiais e inalienáveis[4]. Os pais têm a responsabilidade de criar um lar,
onde se viva o amor, o perdão, o respeito, a fidelidade e o serviço
desinteressado. O lar é o lugar apropriado para a educação nas virtudes. Hão-de
ensiná-los – com o exemplo e com a palavra – e viver uma simples, sincera e
alegre vida de piedade; transmitir-lhes, inalterada e completa, a doutrina
católica; formálos na luta generosa por acomodar a sua conduta às exigências da
Lei de Deus e da vocação pessoal à santidade. «Pais, não exaspereis os vossos
filhos, mas criai-os com a educação e correcção que vêm do Senhor» (Ef 6, 4).
Desta responsabilidade não se devem desentender, deixando a educação dos seus
filhos nas mãos de outras pessoas ou instituições, mesmo que possam – e em
certas ocasiões devem – contar coma ajuda de quem lhes mereça confiança (cf. Catecismo,
2222-2226).
Os pais hão-de saber
corrigir, porque «qual é o filho a quem o pai não corrige?» (Heb 12, 7), mas
tendo presente o conselho do Apóstolo: «Pais, não irriteis os vossos filhos,
para que não caiam em desânimo» (Cl 3, 21). a) Os pais hão-de ter um grande
respeito e amor à liberdade dos filhos, ensinando-os a usá-la bem, com
responsabilidade[5]. É fundamental o exemplo da própria conduta. b) Na relação
com os filhos devem saber unir o carinho e a fortaleza, a vigilância e a
paciência. É importante que os pais se tornem “amigos” dos seus filhos,
ganhando e assegurando a sua confiança. c) Para levar a bom termo a tarefa da
educação dos filhos, à frente dos meios humanos – por importantes e
imprescindíveis que sejam – hão-de empregar os meios sobrenaturais. «Como
primeiros responsáveis pela educação dos seus filhos, os pais têm o direito de
escolher para eles uma escola que corresponda às suas próprias convicções. É um
direito fundamental. Tanto quanto possível, os pais têm o dever de escolher as escolas
que melhor os apoiem na sua tarefa de educadores cristãos (cf. Concílio
Vaticano II, Decl. Gravissimum Educationis, 6). Os poderes públicos têm o dever
de garantir este direito dos pais e de assegurar as condições reais do seu
exercício» (Catecismo, 2229). «São importantes, mas não absolutos, os laços
familiares. Quanto mais a criança cresce para a maturidade e autonomia humanas
e espirituais, tanto mais a sua vocação individual, que vem de Deus, se afirma
com nitidez e força. Os pais devem respeitar este chamamento e apoiar a
resposta dos filhos para o seguir. Hão-de convencer-se de que a primeira
vocação do cristão é seguir Jesus (cf. Mt 16, 25): “Quem ama o pai ou a mãe
mais do que a Mim, não é digno de Mim; e quem ama o filho ou a filha mais do que
a Mim, não é digno de Mim” (Mt 10, 37)» (Catecismo, 2232)[6]. A vocação divina
de um filho para realizar uma peculiar missão apostólica, supõe uma dávida de
Deus para a família. Os pais hão-de aprender a respeitar o mistério do
chamamento, embora possa acontecer que não o entendam. A abertura às
possibilidades que abre a transcendência e o respeito pela liberdade fortalecem-se
na oração. Assim, evita-se a excessiva protecção ou o controlo indevido dos
filhos: um modo possessivo de actuar que não ajuda o crescimento humano e
espiritual.
5.
Deveres com os que governam a Igreja
Os cristãos devem possuir
«um verdadeiro espírito filial em relação à Igreja» (Catecismo, 2040). Este
espírito há-de manifestar-se com quem governa a Igreja.
Os fiéis «devem abraçar
prontamente, com obediência cristã, todas as coisas que os sagrados pastores,
representantes de Cristo, determinarem na sua qualidade de mestres e guias na
Igreja, a exemplo de Cristo, o qual com a Sua obediência, levada até à morte,
abriu para todos o feliz caminho da liberdade dos filhos de Deus. Nem deixem de
encomendar ao Senhor nas suas orações os seus prelados, já que eles olham pelas
nossas almas, como devendo dar contas delas, a fim de que o façam com alegria e
não gemendo (cf. Heb 13, 17)»[7]. Antes de mais, este espírito filial mostra-se
na adesão fiel e união ao Papa, cabeça visível da Igreja e Vigário de Cristo na
Terra, e aos bispos em comunhão com a Santa Sé. «O teu maior amor, a tua maior
estima, a tua mais profunda veneração, a tua obediência mais rendida, o teu
maior afecto há-de ser também para o Vice-Cristo na terra, para o Papa. Os
católicos têm de pensar que, depois de Deus e da nossa Mãe a Virgem Santíssima,
na hierarquia do amor e da autoridade, vem o Santo Padre»[8].
6.
Deveres para com a autoridade civil
«O quarto mandamento da Lei
de Deus manda que honremos também todos aqueles que, para nosso bem, receberam
de Deus alguma autoridade na sociedade. E esclarece os deveres dos que exercem
essa autoridade, bem como os daqueles que dela beneficiam» (Catecismo,
2234)[9]. Entre estes últimos destacam-se: a) respeitar as leis justas e
cumprir os legítimos mandatos da autoridade (cf. 1 Pe 2, 13); b) exercer os
direitos e cumprir os deveres de cidadania; c) intervir responsavelmente na vida
social e política. «A determinação dos regimes políticos, tal como a designação
dos seus dirigentes, devem ser deixados à livre vontade dos cidadãos»[10]. A
responsabilidade pelo bem comum exige moralmente o exercício do direito ao voto
(cf. Catecismo, 2240). Não é lícito apoiar quem propõe programas de organização
social contrários à doutrina cristã, logo, contrários ao bem comum e à
verdadeira dignidade do homem. «O cidadão é obrigado, em consciência, a não
seguir as prescrições das autoridades civis, quando tais prescrições forem
contrárias às exigências de ordem moral, aos direitos fundamentais das pessoas
ou aos ensinamentos do Evangelho. A recusa de obediência às autoridades civis,
quando as suas exigências forem contrárias às da recta consciência, tem a sua
justificação na distinção entre o serviço de Deus e o serviço da comunidade
política “Dai a César o que é de César,
e a Deus o que é de Deus” (Mt 22, 21). “Deve obedecer-se antes a Deus que aos
homens” (Act 5, 29)» (Catecismo, 2242).
7.
Deveres das autoridades civis
O exercício da autoridade
há-de facilitar o exercício da liberdade e da responsabilidade de todos. Os
governantes devem velar para que não se favoreça o interesse individual de
alguns em detrimento do bem comum[11]. «Os poderes políticos são obrigados a
respeitar os direitos fundamentais da pessoa humana. Administrarão a justiça
como humanidade, respeitando o direito de cada qual, nomeadamente das famílias
e dos deserdados. Os direitos políticos inerentes à cidadania (…) não podem ser
suspensos pelos poderes públicos sem motivo legítimo e proporcionado»
(Catecismo, 2237).
ANTONIO
PORRAS
Bibliografia
básica
-
Catecismo da Igreja Católica, 2196-2257. - Conselho Pontifício Justiça e Paz,
Compêndio da Doutrina Social da Igreja, Ed. Principia, Lisboa 2005, n. 209-214;
221-254; 377-383; 393-411.
Notas
[1]
Cf. Conselho Pontifício Justiça e Paz, Compêndio da Doutrina Social da Igreja,
Ed. Principia, Lisboa 2005, nn. 209-214; 221-251. [2]Cf . Ibidem, 252-254.
[3]Cf. Concílio Vaticano II, Decl. Gravissimum Educationis, 3. [4]Cf. S. João
Paulo II, Ex. ap. Familiaris Consortio, 22-XI-81, 36; Catecismo, 2221 e Compêndio
da Doutrina Social da Igreja, 239. [5]E, «ao tornarem-se adultos, os filhos têm
o dever e o direito de escolher a sua profissão e o seu estado de vida»
(Catecismo, 2230). [6]«E, ao consolar-nos com a alegria de encontrar Jesus -
três dias de ausência! - disputando com os Mestres de Israel (Lc II, 46),
ficará bem gravada, na tua alma e na minha, a obrigação de deixarmos os de
nossa casa, para servir o Pai Celestial» (S. Josemaria, Santo Rosário, 5º
mistério gozoso). [7]Concílio Vaticano II, Const. Lumen Gentium, 37. [8]S.
Josemaria, Forja, 135. [9]Cf. Conselho Pontifício Justiça e Paz, Compêndio da
Doutrina Social da Igreja, Ed. Principia, Lisboa 2005, nn.377-383; 393-398;
410-411. [10]Concílio Vaticano II, Const. Gaudium et Spes, 74. Cf. Catecismo,
1901. [11]Cf. S. João Paulo II, Enc. Centesimus annus, 1-V-91, 25. Cf.
Catecismo, 2236.
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