TEMA 5 A Santíssima Trindade
É o mistério central da fé e
da vida cristã. Os cristãos são baptizados em nome do Pai e do Filho e do
Espírito Santo.
1.
A revelação de Deus uno e trino
«O mistério central da fé e
da vida cristã é o mistério da Santíssima Trindade.
Toda a vida de Jesus é
revelação do Deus Uno e Trino: na anunciação, no nascimento, no episódio da Sua
perda e encontro no Templo quando tinha doze anos e na Sua morte e
ressurreição, Jesus revela-Se como Filho de Deus de uma forma nova
relativamente à filiação conhecida por Israel.
Além disso, no momento do
Seu baptismo, ao iniciar a Sua vida pública, o próprio Pai testemunha ao mundo
que Cristo é o Filho Amado [ii]
descendo sobre Ele o Espírito em forma de pomba.
A esta primeira revelação
explícita da Trindade corresponde a manifestação paralela na Transfiguração,
que introduz o mistério Pascal [iii].
Finalmente, ao despedir-Se
dos Seus discípulos, Jesus envia-os a baptizar em nome das três Pessoas
divinas, para que seja comunicada a todo o mundo a vida eterna do Pai, do Filho
e do Espírito Santo [iv].
No Antigo Testamento, Deus
tinha revelado a Sua unicidade e o Seu amor para com o povo eleito: Yahwé era
como um Pai.
Mas, depois de ter falado
muitas vezes pelos profetas, Deus falou por meio de Seu Filho [v],
revelando que Yahvé não só é como um Pai, mas que é Pai [vi].
Jesus dirige-se a Ele na Sua
oração com o termo aramaico Abba, usado pelas crianças israelitas para se
dirigirem ao seu próprio pai [vii] e
distingue sempre a Sua filiação da dos discípulos.
Isto é tão chocante, que se
pode dizer que a verdadeira razão da crucifixão é justamente o facto de Se
chamar a si mesmo Filho de Deus em sentido único.
não podemos esperar outra
revelação, enquanto Cristo é Deus [ix] que
se nos dá, enxertando-nos na vida que emana do regaço de Seu Pai.
Em Cristo, Deus abre e
entrega a Sua intimidade, que de per si seria inacessível ao homem apenas por
meio das suas forças [x].
Esta mesma revelação é um
acto de amor, porque o Deus pessoal do Antigo Testamento abre livremente o Seu
coração e o Unigénito do Pai sai ao nosso encontro, para Se fazer uma só coisa
connosco e levar-nos de regresso ao Pai [xi].
Trata-se de algo que a filosofia
não podia adivinhar, porque radicalmente apenas pode ser conhecido mediante a
fé.
2.
Deus na Sua vida íntima
Deus não só possui uma vida
íntima, mas Deus é – identifica-se com – a Sua vida íntima, uma vida
caracterizada por eternas relações vitais de conhecimento e de amor, que nos
levam a expressar o mistério da divindade em termos de processões.
De facto, os nomes revelados
das três Pessoas divinas exigem que se pense em Deus como o proceder eterno do
Filho do Pai e na mútua relação – também eterna – do Amor que «procede do Pai» [xii] e «toma do Filho» [xiii],
que é o Espírito Santo.
A Revelação fala-nos, assim,
de duas processões em Deus: a geração do Verbo [xiv] e a
processão do Espírito Santo.
Com a característica
peculiar de que ambas são relações imanentes, porque estão em Deus: mais ainda,
são o próprio Deus, enquanto Deus é Pessoal; quando falamos de processão,
pensamos habitualmente em algo que sai de outro e implica mudança e movimento.
Visto que o homem foi criado
à imagem e semelhança de Deus Uno e Trino [xv], a
melhor analogia com as processões divinas podemos encontrá-la no espírito
humano, onde o conhecimento que temos de nós próprios não sai para o exterior:
o conceito que fazemos de nós é distinto de nós mesmos, mas não está fora de
nós.
O mesmo se pode dizer do
amor que temos para connosco.
De forma parecida, em Deus o
Filho procede do Pai e é Imagem Sua, da mesma forma como o conceito é imagem da
realidade conhecida.
Só que esta Imagem em Deus é
tão perfeita que é Deus mesmo, com toda a Sua infinitude, a Sua eternidade, a
Sua omnipotência: o Filho é uma só coisa com o Pai, o próprio Algo, essa é a
única e indivisa natureza divina, embora seja outro Alguém.
O Símbolo de Niceia-Constantinopla
exprime-o com a fórmula «Deus de Deus,
Luz de Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro».
O facto é que o Pai gera o
Filho dando-Se a Ele, entregando-Lhe a Sua substância e a Sua natureza, não em
parte, como acontece na geração humana, mas perfeita e infinitamente.
O mesmo se pode dizer do
Espírito Santo, que procede como o Amor do Pai e do Filho.
Procede de ambos, porque é o
Dom eterno e incriado que o Pai entrega ao Filho gerando-O e que o Filho
devolve ao Pai como resposta ao Seu Amor.
Este Dom é Dom de si, porque
o Pai gera o Filho comunicando-Lhe total e perfeitamente o Seu próprio Ser
mediante o Seu Espírito. A terceira Pessoa é, portanto, o Amor mútuo entre o
Pai e o Filho [xvi].
O nome técnico desta segunda
processão é espiração.
Seguindo a analogia do
conhecimento e do amor, pode dizer-se que o Espírito procede como a vontade que
se move para o Bem conhecido.
Estas duas processões chamam-se imanentes e
diferenciam-se radicalmente da criação, que é transeunte, no sentido de que é algo
que Deus faz para fora de Si.
Tratando-se de processões
dão conta da distinção em Deus, enquanto que ao serem imanentes dão razão da
unidade.
Por isso, o mistério do Deus
Uno e Trino não pode ser reduzido a uma unidade sem distinções, como se as três
Pessoas fossem apenas três máscaras; ou a três seres sem unidade perfeita, como
se se tratasse de três deuses distintos, embora juntos.
(cont)
Giulio
Maspero
Notas:
[x] «Deus
deixou alguns traços do seu ser trinitário na criação e no Antigo Testamento,
mas a intimidade do seu Ser como Trindade Santa constitui um mistério
inacessível à razão humana sozinha e mesmo à fé de Israel, antes da Encarnação
do Filho de Deus e do envio do Espírito Santo. Tal mistério foi revelado por
Jesus Cristo e é a fonte de todos os outros mistérios» (Compêndio, 45).
[xvi] O
Espírito Santo «é a terceira Pessoa da Santíssima Trindade. Ele é Deus, uno e
igual ao Pai e ao Filho; Ele “procede do Pai” (Jo 15, 26), o qual, princípio
sem princípio, é origem de toda a vida trinitária. E procede também do Filho
(Filioque), pelo dom eterno que o Pai faz de Si ao Filho. Enviado pelo Pai e
pelo Filho encarnado, o Espírito Santo conduz a Igreja “ao conhecimento da
verdade total” (Jo 16, 13)» (Compêndio, 47).
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