12/02/2018

Leitura espiritual

RESUMOS DA FÉ CRISTÃ

TEMA 6 A Criação


1. O acto criador

1.4. Criação e salvação

A criação é «o primeiro passo para a Aliança do Deus único com o seu povo» [i].

Na Bíblia a criação está aberta à actuação salvífica de Deus na história, que tem a sua plenitude no mistério pascal de Cristo e que alcançará a sua perfeição final no fim dos tempos.
A criação está feita com vista ao Sábado, o sétimo dia em que o Senhor descansou, dia em que culmina a primeira criação e que se abre ao oitavo dia em que começa uma obra ainda mais maravilhosa: a Redenção, a nova criação em Cristo [ii].

Mostra-se, assim, a continuidade e unidade do desígnio divino de criação e redenção.
Entre ambas não há nenhum hiato, pois o pecado dos homens não corrompeu totalmente a obra divina, mas o vínculo.
A relação entre ambas – criação e salvação – pode expressar-se dizendo que, por um lado, a criação é o primeiro acontecimento salvífico e, por outro, que a salvação redentora tem as características de uma nova criação.
Esta relação ilumina importantes aspectos da fé cristã, como a ordenação da natureza à graça ou a existência de um único fim sobrenatural do homem.

2. A realidade criada

O efeito da acção criadora de Deus é a totalidade do mundo criado, “céus e terra” [iii].

Deus é «Criador de todas as coisas, das visíveis e das invisíveis, espirituais e corporais; que pela sua omnipotente virtude ao mesmo tempo, desde o princípio do tempo, criou do nada uma e outra criatura, a espiritual e a corporal, ou seja, a angélica e a mundana e depois a humana, como comum, composta de espírito e de corpo» [iv].

O cristianismo supera quer o monismo (que afirma que a matéria e o espírito se confundem, que a realidade de Deus e do mundo se identificam), quer o dualismo (segundo o qual matéria e espírito são princípios originários opostos).
A acção criadora pertence à eternidade de Deus, mas o efeito de tal acção está marcado pela temporalidade.

A Revelação afirma que o mundo foi criado como mundo com um início temporal [v], quer dizer, que o mundo foi criado juntamente com o tempo, o que se mostra muito congruente com a unidade do desígnio divino de se revelar na história da salvação.

2.1. O mundo espiritual: os anjos

«A existência de seres espirituais, não-corporais, que a Sagrada Escritura chama habitualmente anjos, é uma verdade de fé.
O testemunho da Escritura é tão claro como a unanimidade da Tradição» [vi].

Ambos os mostram na sua dupla função de louvar a Deus e serem mensageiros do seu desígnio salvador.
O Novo Testamento apresenta os anjos em relação com Cristo, criados por Ele e para Ele [vii], rodeiam a vida de Jesus desde o seu nascimento até à Ascensão, sendo os anunciadores da sua segunda vinda gloriosa [viii].

Assim, estão também presentes desde o início da vida da Igreja, que beneficia da sua ajuda poderosa e na sua liturgia une-se a eles na adoração a Deus.

A vida de cada homem é acompanhada, desde o seu nascimento, por um anjo protector e pastor para o guiar na vida [ix].

A teologia – especialmente São Tomás de Aquino, o Doutor Angélico – e o Magistério da Igreja aprofundaram na natureza destes seres puramente espirituais, dotados de inteligência e vontade, afirmando que são criaturas pessoais e imortais que excedem, em perfeição, todas as criaturas visíveis [x].

Os anjos foram criados num estado de prova.
Alguns rebelaram-se irrevogavelmente contra Deus.
Caídos no pecado, Satanás e os outros demónios – que tinham sido criados bons, mas por si próprios se fizeram maus – instigaram os nossos primeiros pais a pecar [xi].

2.2. O mundo material

Deus «criou o mundo visível em toda a sua riqueza, a sua diversidade e a sua ordem.

A Sagrada Escritura apresenta a obra do Criador, simbolicamente, como uma sequência de seis dias “de trabalho” divino que terminam no “repouso” do sétimo dia [xii]» [xiii].

«A Igreja, em diversas ocasiões, viu-se na necessidade de defender a bondade da criação, mesmo a do mundo material [xiv]» [xv].

«Pela própria condição da criação, todas as coisas estão dotadas de firmeza, verdade e bondade próprias e de uma ordem» [xvi].

A verdade e bondade do criado procedem do único Deus Criador que é, ao mesmo tempo, Trino.

Assim, o mundo criado é um certo reflexo da actuação das Pessoas divinas: «em todas as criaturas se encontra uma representação da Trindade à maneira de vestígio» [xvii].

O cosmos tem uma beleza e uma dignidade, enquanto obra de Deus. Há solidariedade e hierarquia entre os seres, as quais hão-de conduzir à atitude contemplativa de respeito para com o criado e para com as leis naturais que o regem [xviii].

Certamente, o cosmos foi criado para o homem, que recebeu de Deus o mandato de dominar a terra [xix].
Tal mandato não é um convite à exploração despótica da natureza, mas à participação no poder criador de Deus: mediante o seu trabalho o homem colabora no aperfeiçoamento da criação.
O cristão partilha das justas exigências que a sensibilidade ecológica pôs em evidência nas últimas décadas, sem cair numa vaga divinização do mundo e afirmando a superioridade do homem sobre o resto dos seres como «o ponto culminante da obra da criação» [xx].

(cont)

Santiago Sanz

Notas





[i] Compêndio, 51
[ii] 2 Cor 5, 7; cf. Catecismo, 345-349
[iii] Gn 1, 1
[iv] Concílio Lateranense IV (1215), DS 800.
[v] Assim o ensina o Concílio Lateranense IV e, referindo-se a ele, o Concílio Vaticano I (cf. respectivamente DS 800 y 3002). Trata-se de uma verdade revelada, que a razão não pode demonstrar, como ensinou São Tomás na famosa disputa medieval sobre a eternidade do mundo: cf. Contra Gentiles, lib. 2, cap. 31-38; e o seu opúsculo filosófico De Aeternitate Mundi.
[vi] Catecismo, 328
[vii] Col 1, 16
[viii] cf. Catecismo, 333
[ix] cf. Catecismo, 334-336
[x] cf. Catecismo, 330
[xi] cf. Catecismo, 391-395
[xii] Gn 1, 1-2, 4
[xiii] Catecismo, 337
[xiv] cf. DS 286; 455-463; 800; 1333; 3002
[xv] Catecismo, 299
[xvi] GS 36, 2
[xvii] São Tomás, Summa Theologiae, I, q. 45, a. 7, co.; cf. Catecismo, 237.
[xviii] cf. Catecismo, 339, 340, 342, 354
[xix] cf. Gn 1, 28
[xx] Catecismo, 343

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