TEMA 6 A Criação
1.
O acto criador
1.4.
Criação e salvação
Na Bíblia a criação está
aberta à actuação salvífica de Deus na história, que tem a sua plenitude no
mistério pascal de Cristo e que alcançará a sua perfeição final no fim dos
tempos.
A criação está feita com
vista ao Sábado, o sétimo dia em que o Senhor descansou, dia em que culmina a
primeira criação e que se abre ao oitavo dia em que começa uma obra ainda mais
maravilhosa: a Redenção, a nova criação em Cristo [ii].
Mostra-se, assim, a
continuidade e unidade do desígnio divino de criação e redenção.
Entre ambas não há nenhum
hiato, pois o pecado dos homens não corrompeu totalmente a obra divina, mas o
vínculo.
A relação entre ambas –
criação e salvação – pode expressar-se dizendo que, por um lado, a criação é o
primeiro acontecimento salvífico e, por outro, que a salvação redentora tem as
características de uma nova criação.
Esta relação ilumina
importantes aspectos da fé cristã, como a ordenação da natureza à graça ou a
existência de um único fim sobrenatural do homem.
2.
A realidade criada
Deus é «Criador de todas as
coisas, das visíveis e das invisíveis, espirituais e corporais; que pela sua
omnipotente virtude ao mesmo tempo, desde o princípio do tempo, criou do nada
uma e outra criatura, a espiritual e a corporal, ou seja, a angélica e a
mundana e depois a humana, como comum, composta de espírito e de corpo» [iv].
O cristianismo supera quer o
monismo (que afirma que a matéria e o espírito se confundem, que a realidade de
Deus e do mundo se identificam), quer o dualismo (segundo o qual matéria e
espírito são princípios originários opostos).
A acção criadora pertence à
eternidade de Deus, mas o efeito de tal acção está marcado pela temporalidade.
A Revelação afirma que o
mundo foi criado como mundo com um início temporal [v],
quer dizer, que o mundo foi criado juntamente com o tempo, o que se mostra
muito congruente com a unidade do desígnio divino de se revelar na história da
salvação.
2.1.
O mundo espiritual: os anjos
«A existência de seres
espirituais, não-corporais, que a Sagrada Escritura chama habitualmente anjos,
é uma verdade de fé.
Ambos os mostram na sua
dupla função de louvar a Deus e serem mensageiros do seu desígnio salvador.
O Novo Testamento apresenta
os anjos em relação com Cristo, criados por Ele e para Ele [vii],
rodeiam a vida de Jesus desde o seu nascimento até à Ascensão, sendo os
anunciadores da sua segunda vinda gloriosa [viii].
Assim, estão também
presentes desde o início da vida da Igreja, que beneficia da sua ajuda poderosa
e na sua liturgia une-se a eles na adoração a Deus.
A vida de cada homem é
acompanhada, desde o seu nascimento, por um anjo protector e pastor para o
guiar na vida [ix].
A teologia – especialmente
São Tomás de Aquino, o Doutor Angélico – e o Magistério da Igreja aprofundaram
na natureza destes seres puramente espirituais, dotados de inteligência e
vontade, afirmando que são criaturas pessoais e imortais que excedem, em
perfeição, todas as criaturas visíveis [x].
Os anjos foram criados num
estado de prova.
Alguns rebelaram-se
irrevogavelmente contra Deus.
Caídos no pecado, Satanás e
os outros demónios – que tinham sido criados bons, mas por si próprios se
fizeram maus – instigaram os nossos primeiros pais a pecar [xi].
2.2.
O mundo material
Deus «criou o mundo visível
em toda a sua riqueza, a sua diversidade e a sua ordem.
A Sagrada Escritura
apresenta a obra do Criador, simbolicamente, como uma sequência de seis dias
“de trabalho” divino que terminam no “repouso” do sétimo dia [xii]» [xiii].
«A Igreja, em diversas
ocasiões, viu-se na necessidade de defender a bondade da criação, mesmo a do
mundo material [xiv]» [xv].
«Pela própria condição da
criação, todas as coisas estão dotadas de firmeza, verdade e bondade próprias e
de uma ordem» [xvi].
A verdade e bondade do
criado procedem do único Deus Criador que é, ao mesmo tempo, Trino.
Assim, o mundo criado é um
certo reflexo da actuação das Pessoas divinas: «em todas as criaturas se
encontra uma representação da Trindade à maneira de vestígio» [xvii].
O cosmos tem uma beleza e
uma dignidade, enquanto obra de Deus. Há solidariedade e hierarquia entre os
seres, as quais hão-de conduzir à atitude contemplativa de respeito para com o
criado e para com as leis naturais que o regem [xviii].
Certamente, o cosmos foi
criado para o homem, que recebeu de Deus o mandato de dominar a terra [xix].
Tal mandato não é um convite
à exploração despótica da natureza, mas à participação no poder criador de
Deus: mediante o seu trabalho o homem colabora no aperfeiçoamento da criação.
O cristão partilha das
justas exigências que a sensibilidade ecológica pôs em evidência nas últimas
décadas, sem cair numa vaga divinização do mundo e afirmando a superioridade do
homem sobre o resto dos seres como «o ponto culminante da obra da criação» [xx].
(cont)
Santiago
Sanz
Notas
[v] Assim o ensina o Concílio Lateranense
IV e, referindo-se a ele, o Concílio Vaticano I (cf. respectivamente DS 800 y
3002). Trata-se de uma verdade revelada, que a razão não pode demonstrar, como
ensinou São Tomás na famosa disputa medieval sobre a eternidade do mundo: cf.
Contra Gentiles, lib. 2, cap. 31-38; e o seu opúsculo filosófico De Aeternitate
Mundi.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.