Art.
6 — Se o poder judiciário de Cristo se estende aos anjos.
O
sexto discute-se assim. — Parece que o poder judiciário de Cristo não se
estende aos anjos.
1. — Pois, os anjos, tanto os bons como
os maus, foram julgados desde o princípio do mundo, quando uns caíram pelo
pecado e os outros foram confirmados na beatitude. Ora, os que já foram
julgados não precisam sê-lo de novo. Logo, o poder judiciário de Cristo não se
estende aos anjos.
2. Demais. — Não pertence à mesma pessoa
julgar e ser julgada. Ora, os anjos virão com Cristo para julgar, segundo o
Evangelho: Quando vier o Filho do homem
na sua majestade e todos os anjos com ele. Logo, parece que os anjos não
devem ser julgados por Cristo.
3. Demais. — Os anjos são superiores às
outras criaturas. Se, pois, Cristo é juiz não só dos homens, mas, também dos
anjos, pela mesma razão será juiz de todas as criaturas. O que é falso, porque
essa é uma atribuição própria da providência de Deus, donde o dizer a
Escritura: A qual outro estabeleceu sobre
a terra ou a quem pôs sobre o mundo que fabricou? Logo não é Cristo o juiz
dos anjos.
Mas, em contrário, o Apóstolo: Não sabeis que havemos de julgar aos anjos?
Ora, os santos não julgarão senão pela autoridade de Cristo. Logo, com maior
razão, tem Cristo o poder judiciário sobre os anjos.
Os anjos estão sujeitos ao
poder judiciário de Cristo, não só pela natureza divina deste, enquanto Verbo
de Deus, mas também em razão da sua natureza humana. O que resulta de três
razões. — Primeiro, da proximidade que tem com Deus a natureza assumida, pois,
como diz o Apóstolo, em nenhum lugar ele
tomou aos anjos, mas tomou a descendência de Abraão. Por isso a alma de
Cristo, mais que nenhum dos anjos, está cheia da virtude do Verbo de Deus. Daí vem que ilumina os anjos, como diz
Dionísio e, portanto, pode julgá-los, — Segundo, porque, pelas humilhações da
Paixão, a natureza humana mereceu ser exaltado, em Cristo acima dos anjos; de
modo que, como diz o Apóstolo, ao nome de
Jesus se dobre todo o joelho dos que estão nos céus, na terra e nos infernos.
Por isso Cristo exerce o poder judiciário também sobre todos os anjos, tanto bons
como maus. Em prova do que diz a Escritura: Todos
os anjos estavam em pé ao derredor do trono. — Terceiro, em razão do que
obram em relação aos homens, dos quais Cristo é, de certo modo especial, a
cabeça. Donde o dizer o Apóstolo: Todos
os espíritos são uns administradores enviados para exercer o seu ministério a
favor daqueles que hão de receber a herança da salvação. Estão sujeitos,
pois, ao juízo de Cristo, primeiro quanto à ministração das obras que devem ser
feitas por eles. Ministração essa que também lhes advém do homem Cristo, a quem
os anjos serviam, e a quem os demónios pediam lhes permitissem entrar nos
porcos, como refere o Evangelho. — Segundo, quanto aos demais prémios
acidentais dos bons anjos, que são o alegrarem-se com a salvação dos homens,
segundo o Evangelho: Haverá júbilo entre
os anjos de Deus por um pecador que faz penitência. E também quanto às
penas acidentais do demónio, que os afligem na terra ou encerrados no inferno.
O que também depende do homem Cristo. Por isso o Evangelho conta que o demónio
clamava: Que tens tu connosco, Jesus
Nazareno? Vieste a perder-nos antes do tempo? — Terceiro, quanto ao prémio
essencial dos bons anjos, que é a beatitude eterna; e quanto à pena essencial
dos maus anjos, que é a condenação eterna. O que tudo advém de Cristo enquanto
Verbo de Deus, desde o princípio do mundo.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. —
A objecção colhe, quanto ao juízo concernente ao prémio essencial e à pena
principal.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Como diz
Agostinho, embora o espiritual julgue de
todas as coisas, contudo pela verdade é ele julgado. Donde, embora os
anjos, por serem espirituais, julguem, são, contudo, julgados por Cristo,
enquanto é a Verdade.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Cristo tem o
poder de julgar não só os anjos, mas também as actividades de todas as
criaturas. Se, pois, como ensina Agostinho, os
inferiores são, numa certa ordem, governados por Deus mediante os superiores,
é necessário admitirmos que todos os seres são governados pela alma de Cristo,
superior a todas as criaturas. Daí o dizer o Apóstolo: Deus não submeteu aos anjos o mundo vindouro, isto é, aquele de quem
falamos, isto é, a Cristo. Nem, contudo, por causa disso, estabeleceu Deus
outro sobre a terra. Porque Deus tem unidade e identidade de ser com Nosso
Senhor Jesus Cristo homem. De cujo mistério da Encarnação basta o que até aqui
dissemos.
Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.
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