Leitura Espiritual
Cristo que passa |
São Josemaria Escrivá
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Os pais educam fundamentalmente com a
conduta.
O que os filhos e as filhas procuram
no seu pai ou na sua mãe, não são apenas conhecimentos mais amplos do que os
seus ou conselhos mais ou menos acertados, mas algo de maior importância: um
testemunho do valor e do sentido da vida, encarnados numa existência concreta e
confirmados nas diversas circunstâncias e situações que se sucedem ao longo dos
anos.
Se eu tivesse de dar um conselho aos
pais, dar-lhes-ia sobretudo este: que os vossos filhos vejam (não tenhais
ilusões: desde crianças, vêem tudo e julgam-no) que procurais viver de acordo
com a vossa fé, que Deus não está só nos vossos lábios, que está nas vossas
obras; que vos esforçais por serdes sinceros e leias, que vos amais e os amais
a eles realmente.
Assim é que contribuireis melhor para
fazer deles homens e mulheres íntegros, capazes de enfrentar com espírito
aberto as situações que a vida lhes depare, de servir os seus concidadãos e de
contribuir para a solução dos grandes problemas da humanidade, levando o
testemunho de Cristo aonde mais tarde venham a encontrar-se na sociedade.
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Escutai os vossos filhos, dedicai-lhes
também o vosso tempo, mostrai que tendes confiança neles; acreditai em tudo o
que vos disserem, mesmo que alguma vez vos enganem; não vos assusteis com as
suas rebeldias, pois também vós, na idade deles, fostes mais ou menos rebeldes;
ide ao seu encontro, até meio do caminho, e rezai por eles. E vereis que
recorrerão aos seus pais com simplicidade - podeis ter a certeza disso, se
actuais cristãmente - em vez de irem ter, para satisfazer as suas legítimas
curiosidades, com um amigalhote desavergonhado ou brutal.
A vossa confiança, a vossa relação
amigável com os filhos, receberá como resposta a sinceridade deles para
convosco; e isto, mesmo que não faltem disputas e incompreensões de pouca
monta, é a paz familiar, a vida cristã.
Como descreverei - como um escritor
dos primeiros séculos - a felicidade desse matrimónio que a Igreja une, que a
entrega confirma, que a bênção sela, que os Anjos proclamam e que Deus Pai tem
por celebrado?...
Ambos os esposos são como irmãos,
servos um do outro, sem que entre eles se dê a separação alguma, nem na carne
nem no espírito. Porque verdadeiramente são dois numa só carne e onde há uma só
carne deve haver um só espírito...
Ao contemplar esses lares, Cristo
alegra-Se e envia-lhes a Sua paz; onde estão dois, aí está também Ele, e onde
está Ele não pode haver nada de mau.
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Procurámos resumir e comentar alguns
dos traços desses lares em que se reflecte a luz de Cristo e que são, por isso,
luminosos e alegres, repito; nos quais a harmonia que reina entre os pais se
transmite aos filhos, à família inteira e a todos os ambientes que a envolvem.
Assim, em cada família autenticamente
cristã reproduz-se de algum modo o mistério da Igreja, escolhida por Deus e
enviada como guia do mundo.
A todos os cristãos, qualquer que seja
a sua condição - sacerdotes ou leigos, casados ou solteiros - se aplicam
plenamente as palavras do Apóstolo que se lêem precisamente na epístola da
festa da Sagrada Família: escolhidos de Deus, santos e amados.
É isso mesmo o que somos todos, cada
um no seu lugar e na sua tarefa no mundo: homens e mulheres escolhidos por Deus
para dar testemunho de Cristo e levar aos que nos rodeiam a alegria de se
saberem filhos de Deus, apesar dos nossos erros e procurando lutar contra eles.
É muito importante que o sentido
vocacional do matrimónio nunca falte, tanto na catequese e na pregação como na
consciência daqueles a quem Deus quer levar por esse caminho, porque estão real
e verdadeiramente chamados a integrar-se nos desígnios divinos da salvação de
todos os homens.
Por isso, talvez não possa
apresentar-se aos esposos cristãos melhor modelo que o das famílias dos tempos
apostólicos: o centurião Cornélio, que foi dócil à vontade de Deus e em cuja
casa se consumou a abertura da Igreja aos gentios; Áquila e Priscila, que
difundiram o cristianismo em Corinto e em Éfeso, e que colaboraram no
apostolado de S. Paulo; Tabita, que com a sua caridade assistiu aos
necessitados de Jope...
E tantos outros lares de judeus e de
gentios, de gregos e de romanos, nos quais lançou raízes a pregação dos
primeiros discípulos do Senhor.
Famílias que viveram de Cristo e que
deram a conhecer Cristo. Pequenas comunidades cristãs que foram centros de
irradiação da mensagem evangélica.
Lares iguais aos outros lares daqueles
tempos, mas animados de um espírito novo que contagiava aqueles que os conheciam
e com eles conviviam.
Assim foram os primeiros cristãos e
assim havemos de ser os cristãos de hoje: semeadores de paz e de alegria, da
paz e da alegria que Cristo nos trouxe.
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Ainda não há muito tempo, tive
oportunidade de admirar um baixo-relevo em mármore, que representa a cena da
adoração de Deus Menino pelos Reis Magos.
Emoldurando esse baixo-relevo, havia
outros: quatro anjos, cada um com seu símbolo - um diadema, o mundo coroado
pela cruz, uma espada e um ceptro.
Deste modo, utilizando símbolos bem
conhecidos, ilustrava-se plasticamente o acontecimento que hoje comemoramos:
uns homens sábios - reis, segundo a tradição - prostram-se diante do Menino,
depois de perguntar em Jerusalém: Onde
está o rei dos judeus que acaba de nascer?
Também eu, instado por esta pergunta,
contemplo agora Jesus, deitado numa manjedoura, num lugar que só é próprio para
os animais.
Onde está, Senhor, a tua realeza: o
diadema, a espada, o ceptro? Pertencem-lhe e não os quer; reina envolto em
panos.
É um rei inerme, que se nos apresenta
indefeso; é uma criança. Como não havemos de recordar aquelas palavras do
Apóstolo: aniquilou-se a si mesmo,
tomando a forma de servo.
Nosso Senhor encarnou para nos
manifestar a vontade do Pai.
E começa a instruir-nos estando ainda
no berço. Jesus Cristo procura-nos - com uma vocação, que é vocação para a
santidade -, a fim de consumarmos com Ele a Redenção.
Considerai o seu primeiro ensinamento:
temos de co-redimir à custa de triunfar, não sobre o próximo, mas sobre nós
mesmos.
Tal como Cristo, precisamos de nos
aniquilar, de sentir-nos servidores dos outros para os conduzir a Deus.
Onde está o nosso Rei?
Não será que Jesus quer reinar, antes
de mais, no coração, no teu coração?
Por isso se fez menino: quem é capaz
de ter o coração fechado para uma criança?
Onde está o nosso Rei?
Onde está o Cristo que o Espírito
Santo procura formar na nossa alma?
Cristo não pode estar na soberba, que
nos separa de Deus, nem na falta de caridade, que nos isola dos homens.
Aí não podemos encontrar Cristo, mas
apenas a solidão.
No dia da Epifania, prostrados aos pés
de Jesus Menino, diante de um Rei que não ostenta sinais externos de realeza,
podeis dizer-lhe: Senhor, expulsa a soberba da minha vida, subjuga o meu amor-próprio,
esta minha vontade de afirmação pessoal e de imposição da minha vontade aos
outros.
Faz com que o fundamento da minha
personalidade seja a identificação contigo.
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O caminho da fé
Não é fácil esta meta da identificação
com Cristo.
Mas também não é difícil, se vivemos
de acordo com os ensinamentos do Senhor, isto é, se recorrermos diariamente à
sua Palavra, se impregnarmos a nossa vida da realidade sacramental - a
Eucaristia - que Ele nos deixou como alimento, porque o caminho do cristão é
andadeiro, como diz uma antiga canção da minha terra.
Tal como os Reis Magos, descobrimos
uma estrela que é luz, rumo certo no céu da nossa alma.
Vimos a sua estrela no Oriente e
viemos adorá-lo.
Também nós vivemos esta experiência.
Também nós sentimos que, pouco a
pouco, se acendia na nossa alma uma luz nova: o desejo de ser cristãos em
plenitude, o desejo, por assim dizer, de tomar Deus a sério.
Se cada um de nós começasse agora a
contar em voz alta o processo interior da sua vocação sobrenatural, não
poderíamos deixar de pensar que tudo isso foi divino.
Agradeçamos, pois, a Deus Pai, a Deus
Filho, a Deus Espírito Santo e a Santa Maria - por cuja intercessão chegam até
nós todas as bênçãos do Céu - este dom, que, a par da fé, é o maior que o
Senhor pode conceder a uma criatura: a firme determinação de alcançar a
plenitude da caridade, com a convicção de que também é necessária, e não apenas
possível, a santidade no meio dos afazeres profissionais, sociais...
Considerai a delicadeza com que o
Senhor nos dirige este convite. Exprime-se com palavras humanas, como um
apaixonado: Eu chamei-te pelo teu nome... tu és meu.
Deus - que é a Beleza, a Sabedoria, a
Grandeza - anuncia-nos que somos seus, que fomos escolhidos como objecto do seu
amor infinito. É precisa uma vida forte de fé para não desvirtuar esta
maravilha que a Providência depõe nas nossas mãos, uma fé como a dos Reis
Magos, que nos leva a ter a certeza de que nem o deserto, nem a tormenta, nem a
tranquilidade do oásis nos impedirão de chegar à meta do presépio eterno: a
vida definitiva com Deus.
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Caminho de fé é caminho de sacrifício.
A vocação cristã não nos tira do nosso
lugar, mas exige que abandonemos tudo o que estorva a vontade de Deus.
A luz que se acende na nossa alma é
apenas o começo; temos de segui-la, se queremos que se torne estrela e depois
sol. Enquanto os Magos estavam na Pérsia - escreve S. João Crisóstomo - não
viam senão uma estrela, mas quando abandonaram a pátria viram o próprio sol da
justiça.
Pode dizer-se que não teriam
continuado a ver a estrela se tivessem permanecido no seu país.
Apressemo-nos, pois, nós também; e
embora todos no-lo impeçam, corramos para casa desse Menino.
(cont)
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