Leitura Espiritual Temas actuais do cristianismo |
São Josemaria Escrivá
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pergunta:
Monsenhor,
é cada vez maior a presença da mulher na vida social, para além do âmbito
familiar, em que se tinha movido quase exclusivamente até agora. Que lhe parece
esta evolução?
E
quais são, em seu entender, as características gerais que a mulher tem de
alcançar para cumprir a missão que lhe está confiada?
resposta:
Em
primeiro lugar, parece-me oportuno não contrapor esses dois âmbitos que acaba
de mencionar.
Como
na vida do homem, mas com matizes muito peculiares, o lar e a família ocuparão
sempre um lugar central na vida da mulher.
É
evidente que a dedicação às tarefas familiares representa uma grande função
humana e cristã.
Contudo,
isto não exclui a possibilidade de se ocupar em outros trabalhos profissionais
- o do lar também o é -, em qualquer dos ofícios e EMPREGOS honestos que há na
sociedade em que se vive.
Compreende-se
bem o que se quer dizer ao pôr assim o problema, mas penso que insistir na
contraposição sistemática - mudando só o tom - levaria facilmente, do ponto de
vista social, a um erro maior do que aquele que se pretende corrigir, porque
seria mais grave que a mulher abandonasse o TRABALHO com os seus.
Também
no plano pessoal se não pode afirmar unilateralmente que a mulher deva alcançar
a perfeição apenas fora do lar, como se o tempo dedicado à família fosse um
tempo roubado ao desenvolvimento e à maturidade da sua personalidade.
O
lar - qualquer que seja, porque também a mulher solteira deve ter um lar - é um
âmbito particularmente propício para o desenvolvimento da personalidade.
A
atenção prestada à família constituirá sempre para a mulher a sua maior
dignidade; no cuidado com o marido e com os filhos, ou, para falar em termos
mais gerais, no trabalho para criar à sua volta um ambiente acolhedor e
formativo, a mulher realiza o mais insubstituível da sua missão e,
consequentemente, pode atingir aí a sua perfeição pessoal.
Como
acabo de dizer, isso não se opõe à participação em outros aspectos da vida social
e até da política.
Também
nesses sectores a mulher pode dar uma valiosa contribuição, como pessoa, e
sempre com as peculiaridades da sua condição feminina.
Fá-lo-á
na medida em que estiver humana e profissionalmente preparada. Não há dúvida
que tanto a família como a sociedade necessitam dessa contribuição especial,
que não é de modo algum secundária.
Desenvolvimento,
maturidade, emancipação da mulher, não devem significar uma pretensão de
igualdade - de uniformidade - com o homem, uma imitação do modo de agir
varonil.
Isso
não seria uma aquisição, seria uma perda para a mulher, não porque ela seja mais
ou menos que o homem, mas porque é diferente.
Num
plano essencial - que deve ser objecto de reconhecimento jurídico, tanto no
direito civil como no eclesiástico - pode-se falar de igualdade de direitos,
porque a mulher tem, exactamente como o homem, a dignidade de pessoa e de filha
de Deus.
Mas,
a partir desta igualdade fundamental, cada um deve alcançar o que lhe é
próprio, e, neste plano, emancipação é o mesmo que possibilidade real de
desenvolver plenamente as próprias virtualidades: as que tem na sua
singularidade e as que tem como mulher.
A
igualdade em face do direito, a igualdade de oportunidades perante a lei, não
suprime, antes pressupõe e promove essa diversidade, que é riqueza para todos.
A
mulher é chamada a levar à família, à sociedade civil, à Igreja, alguma coisa
de característico, que lhe é próprio e que só ela pode dar: a sua delicada
ternura, a sua generosidade incansável, o seu amor ao concreto, a sua agudeza
de engenho, a sua capacidade de intuição, a sua piedade profunda e simples, a
sua tenacidade...
A
feminilidade não é autêntica se não reconhece a formosura dessa contribuição
insubstituível e não a incorpora na própria vida.
Para
cumprir essa missão, a mulher tem de desenvolver a sua própria personalidade,
sem se deixar levar por um ingénuo espírito de imitação, que - em geral - a
colocaria facilmente num plano de inferioridade e deixaria irrealizadas as suas
possibilidades mais originais.
Se
se formar bem, com autonomia pessoal, com autenticidade, realizará eficazmente
o seu trabalho, a missão para que se sente chamada, seja ela qual for.
A
sua vida e o seu trabalho serão realmente construtivos e fecundos, cheios de
sentido, tanto se passa o dia dedicada ao marido e aos filhos, como se, tendo
renunciado ao matrimónio por alguma razão nobre, se entregou plenamente a
outras tarefas.
Cada
uma no seu próprio caminho, sendo fiel à sua vocação humana e divina, pode
realizar e realiza de facto a plenitude da personalidade feminina.
Não
esqueçamos que Santa Maria, Mãe de Deus e Mãe dos homens, é não só modelo, mas
também prova do valor transcendente que pode alcançar uma vida aparentemente
sem relevo.
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pergunta:
Em
algumas ocasiões, porém, a mulher não está segura de se encontrar realmente no
lugar que lhe corresponde e a que é chamada. Muitas vezes, quando realiza um
trabalho fora de casa, pesam sobre ela as solicitações do lar, e, quando
permanece completamente dedicada à família, sente as suas possibilidades
limitadas. Que diria às mulheres que sentem essas contradições?
resposta:
Esse
sentimento, que é muito real, procede com frequência, mais do que das
limitações efectivas - que todos temos, porque somos humanos -, da falta de
ideias bem determinadas, capazes de orientar a vida inteira, ou também de uma
soberba inconsciente.
Às
vezes, desejaríamos ser os melhores em qualquer aspecto e em qualquer nível.
Como
isso não é possível, origina-se um estado de desorientação e de ansiedade, ou,
inclusivamente, de desânimo e de tédio.
Não
se pode estar em toda a parte ao mesmo tempo, não se sabe a que se há-de
atender e não se atende eficazmente a coisa nenhuma. Nesta situação, a alma
fica exposta à inveja e é natural que a imaginação se solte e procure um
refúgio na fantasia, que afastando-nos da realidade, acaba por adormecer a
vontade.
É
a isso que tenho chamado repetidas vezes mística ojalatera - mística do oxalá - feita de sonhos vãos e de idealismos
falsos: oxalá não me tivesse casado, oxalá não tivesse esta profissão, oxalá
tivesse mais saúde, ou menos anos ou mais tempo!
O
remédio - custoso, como é tudo o que tem valor - está em procurar o verdadeiro
centro da vida humana, o que pode dar uma hierarquia, uma ordem e um sentido a
tudo: a intimidade com Deus, mediante uma vida interior autêntica.
Se,
vivendo em Cristo, tivermos n'Ele o nosso centro, descobriremos o sentido da
missão que se nos confiou, teremos um ideal humano que se torna divino, novos
horizontes de esperança se abrirão à nossa vida e chegaremos a sacrificar com
gosto, já não este ou aquele aspecto da nossa actividade, mas a vida inteira,
dando-lhe assim, paradoxalmente, a sua mais profunda realização.
O
problema que levanta acerca da mulher não é extraordinário. Com outras
particularidades, muitos homens experimentam algumas vezes algo de semelhante.
A
raiz costuma ser a mesma: falta de um ideal profundo, que só à luz de Deus se
descobre.
Em
todo o caso, é necessário também pôr em prática pequenos remédios, que parecem
banais, mas que não o são: quando há muitas coisas a fazer, é preciso
estabelecer uma ardem, é necessário organizar-se.
Muitas
dificuldades provêm da falta de ordem, da carência deste hábito.
Há
mulheres que fazem mil e uma coisas e todas bem, porque se organizam, porque,
com fortaleza de ânimo, submetem a uma ordem as suas múltiplas tarefas.
Souberam
estar em cada momento no que deviam fazer, sem se perturbarem pensando no que
viria depois ou no que talvez pudessem ter feito antes.
A
outras, pelo contrário, domina-as o muito que têm a fazer, e, assim dominadas,
não fazem nada.
Sem
dúvida que haverá sempre muitas mulheres que não tenham outra ocupação além de
dirigir o seu lar.
Digo-vos
que esta é uma grande ocupação, que vale a pena. Através desta profissão -
porque o é, verdadeira e nobre - influem positivamente, não só na família, como
também em muitos amigos e conhecidos, em pessoas com as quais de um modo ou de
outro se relacionam, realizando uma tarefa às vezes muito mais extensa que a de
outros profissionais.
E,
se põem essa experiência e essa ciência ao serviço de centenas de pessoas, em
centros destinados à formação da mulher, como os que dirigem em todos os países
do Mundo as minhas filhas do Opus Dei, então convertem-se em professoras do
lar, com mais eficácia educativa, diria eu, que muitos catedráticos da
Universidade.
Entrevista
realizada por Pilar Salcedo, publicada em Telva (Madrid), em 1 de Fevereiro de
1968 e reproduzida em Mundo Cristiano (Madrid) em 1 de Março do mesmo ano.
(cont)
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