Leitura Espiritual Temas actuais do cristianismo |
São Josemaria Escrivá
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Gostaria
de acrescentar que, juntamente com esta consciencialização dos leigos, se está
a produzir um desenvolvimento análogo da sensibilidade dos pastores: eles
reparam no que tem de específico a vocação laical, que deve ser promovida e
favorecida mediante uma pastoral que leve a descobrir no meio do Povo de Deus o
carisma da santidade e do apostolado, nas infinitas e diversíssimas formas nas
quais Deus o concede.
Esta
nova pastoral é muito exigente mas, em minha opinião, absolutamente necessária.
Requer
o dom sobrenatural do discernimento de espíritos, a sensibilidade para as
coisas de Deus, a humildade de não impor as próprias preferências e de servir o
que Deus promove nas almas.
Numa
palavra: o amor à legítima liberdade dos filhos de Deus, que encontram Cristo e
são feitos portadores de Cristo, percorrendo caminhos muito diversos entre si,
mas todos igualmente divinos.
Um
dos maiores perigos que hoje ameaçam a Igreja poderia ser precisamente o de não
reconhecer essas exigências divinas da liberdade cristã e, deixando-se levar
por falsas razões de eficácia, pretender impor uma uniformidade aos cristãos.
Na
raiz dessa atitude há algo não apenas legítimo, como, até, louvável: o desejo
de que a Igreja dê um testemunho tal, que comova o mundo moderno.
Todavia,
receio bem que o caminho seja errado e leve, por um lado, a comprometer a
Hierarquia em questões temporais, caindo num clericalismo diferente mas tão
nefasto como o dos séculos passados; e, por outro, a isolar os leigos, os
cristãos correntes, do mundo em que vivem, para os converter em porta-vozes de
decisões ou ideias concebidas fora desse mundo.
Parece-me
que a nós, sacerdotes, se nos pede a humildade de aprender a não estar na moda,
de sermos realmente servos dos servos de Deus - lembrando-nos daquela
exclamação do Baptista: illum oportet
crescere, me autem mínui [i],
convém que Cristo cresça e que eu diminua - para que os cristãos correntes, os
leigos, tornem Cristo presente em todos os ambientes da sociedade.
A
missão de dar doutrina, de ajudar a penetrar nas exigências pessoais e sociais
do Evangelho, de levar a discernir os sinais dos tempos é e será sempre uma das
funções fundamentais do sacerdote. Mas todo o TRABALHO sacerdotal deve ser
realizado dentro do maior respeito pela legítima liberdade das consciências:
cada homem deve responder livremente a Deus.
Quanto
ao resto, todos os católicos, além dessa ajuda do sacerdote, têm também luzes
próprias que recebem de Deus, graça de estado para levar a cabo a missão
específica que, como homens e como cristãos, receberam.
Quem
pensa que, para que a voz de Cristo se faça ouvir no mundo de hoje, é
necessário que o clero fale ou se faça sempre presente, ainda não compreendeu
bem a dignidade da vocação divina de todos e de cada um dos fiéis cristãos.
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pergunta:
Nestas
circunstâncias, qual a função que o Opus Dei desempenhou e desempenha?
Que
relações de colaboração mantêm os sócios com outras organizações que trabalham
neste campo?
resposta:
Não
me pertence a mim fazer um juízo histórico sobre o que, pela graça de Deus, o
Opus Dei tem feito.
Devo
apenas afirmar que a finalidade a que o Opus Dei aspira é favorecer a procura
da santidade e o exercício do apostolado por parte dos cristãos que vivem no
meio do mundo, qualquer que seja o seu estado ou condição.
A
Obra nasceu para contribuir para que esses cristãos, inseridos no tecido da
sociedade civil - com a sua família, os seus amigos, o seu trabalho
profissional, as suas aspirações nobres - compreendam que a sua vida, tal como
é, pode ser ocasião de um encontro com Cristo: quer dizer, que é um caminho de
santidade e de apostolado.
Cristo
está presente em qualquer actividade humana honesta: a vida de um cristão
corrente - que talvez a alguns pareça vulgar e mesquinha - pode e deve ser uma
vida santa e santificante.
Por
outras palavras: para seguir Cristo, para servir a Igreja, para ajudar os
outros homens a reconhecerem o seu destino eterno, não é indispensável
abandonar o mundo ou afastar-se dele, nem sequer é preciso dedicar-se a uma
actividade eclesiástica; a condição necessária e suficiente é cumprir a missão
que Deus encomendou a cada um, no lugar e no ambiente queridos pela sua
Providência.
E
como a maior parte dos cristãos recebe de Deus a missão de santificar o mundo a
partir de dentro, permanecendo no meio das estruturas temporais, o Opus Dei
dedica-se a fazer-lhes descobrir essa missão divina, mostrando-lhes que a
vocação humana - a vocação profissional, familiar e social - não se opõe à
vocação sobrenatural: antes pelo contrário, forma parte integrante dela.
O
Opus Dei tem como missão específica e exclusiva a difusão desta mensagem - que
é uma mensagem evangélica - entre todas as pessoas que vivem e trabalham no
mundo, em qualquer ambiente ou profissão.
E
àqueles que entendem este ideal de santidade a Obra proporciona os meios
espirituais e a formação doutrinal, ascética e apostólica, necessários para o
realizar na própria vida.
Os
sócios do Opus Dei não actuam em grupo; actuam individualmente, com liberdade e
responsabilidade pessoais.
Por
isso, o Opus Dei não é uma organização fechada, ou que de algum modo reúna os
seus sócios para os isolar dos outros homens. As actividades corporativas, que
são as únicas que a Obra dirige, estão abertas a toda a espécie de pessoas, sem
discriminação de espécie alguma: nem social, nem cultural, nem religiosa.
E
os sócios, precisamente porque devem santificar-se no mundo, colaboram sempre
com todas as pessoas com quem estão em relação pelo seu trabalho e pela sua
participação na vida cívica.
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Faz
parte essencial do espírito cristão não só viver em união com a Hierarquia
ordinária - o Romano Pontífice e o Episcopado - como também sentir a unidade
com os outros irmãos na fé.
Há
muito tempo que penso que um dos maiores males da Igreja nestes tempos é o
desconhecimento que muitos católicos têm do que fazem e pensam os católicos de
outros países ou de outros ambientes sociais.
É
necessário actualizar essa fraternidade que os primeiros cristãos viviam tão
profundamente.
Assim
nos sentiremos unidos, amando ao mesmo tempo a variedade das vocações pessoais,
evitando-se não poucos juízos injustos e ofensivos, que determinados pequenos
grupos propagam - em nome do catolicismo - contra os seus irmãos na fé, que na
realidade actuam rectamente e com sacrifício, dadas as circunstâncias
particulares do seu país.
É
importante que cada um procure ser fiel à sua vocação divina, de tal maneira
que não deixe de trazer à Igreja aquilo que leva consigo o carisma recebido de
Deus.
O
que é próprio dos sócios do Opus Dei - cristãos correntes - é santificar o
mundo a partir de dentro, participando nas mais diversas actividades humanas.
Como
o facto de pertencerem à Obra não altera em nada a sua posição no mundo,
colaboram, da maneira adequada em cada caso, nas celebrações religiosas colectivas,
na vida paroquial, etc.
Também
neste sentido são cidadãos correntes, que querem ser bons católicos.
Todavia,
os sócios do Opus Dei não se costumam dedicar, geralmente, a trabalhar em
actividades confessionais.
Só
em casos excepcionais, quando a Hierarquia expressamente o pede, algum membro
da Obra colabora em actividades eclesiásticas. Nessa atitude não há qualquer
desejo de se singularizar, e menos ainda de desconsideração pelas actividades
confessionais, mas tão somente a decisão de se ocupar do que é próprio da
vocação para o Opus Dei.
Há
já muitos religiosos e clérigos, e também muitos leigos cheios de zelo, que
levam para a frente essas actividades, dedicando-lhes os seus melhores
esforços.
O
que é próprio dos sócios da Obra, a tarefa a que se sabem chamados por Deus, é
outra.
Dentro
da chamada universal à santidade, o sócio do Opus Dei recebe, além disso, uma
chamada especial para se dedicar, livre e responsavelmente, a procurar a
santidade e a fazer o apostolado no meio do mundo, comprometendo-se a viver um
espírito específico e a receber, ao longo de toda a sua vida, uma formação
peculiar.
Se
descurassem o seu trabalho no mundo, para se ocuparem das actividades
eclesiásticas, tornariam ineficazes os dons divinos recebidos, e pelo entusiasmo
de uma eficácia pastoral imediata, causariam um real dano à Igreja: porque não
haveria tantos cristãos dedicados a santificarem-se em todas as profissões e
ofícios da sociedade civil, no campo imenso do trabalho secular.
Além
disso, a exigente necessidade da contínua formação profissional e da formação
religiosa, juntamente com o tempo dedicado pessoalmente à piedade, à oração e
ao cumprimento sacrificado dos deveres de estado, consome toda a vida: não há
horas livres.
Entrevista realizada por Enrico Zuppi e
António Fugardi, publicada em L'Osservatore della Domenica (Cidade do Vaticano)
nos dias 19 e 26 de Maio e 2 de Junho de 1968
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