3. Fazer da confiança em Deus uma
farsa
A
principal característica deste demónio do apostolado é, obviamente, esquecer
que a desconfiança na gente mesmo, acompanhada por uma total confiança em Deus,
é a essência da espiritualidade do apóstolo. A tentação é pôr a confiança em
Deus num segundo plano, como um recurso em caso de necessidade e de emergência,
esquecendo de fazê-lo presente nos apostolados ordinários e quotidianos. Ao não
colocar a confiança em Deus, com toda a convicção da alma, está-se pondo a
confiança em nós mesmos, ainda que se diga o contrário. Quando se trata dos resultados
profundos e teológicos da evangelização (o Reino da graça) e não de resultados
psicológicos ou de pura influência humana, é preciso confiança absoluta no
Senhor e desconfiança absoluta em nós mesmos. No apostolado, as duas confianças
não podem fazer-se presentes simultaneamente: ou se confia realmente em Deus e
se desconfia de nós, ou se confia em nós e se desconfia de Deus.
Desconfiança
ou confiança em nós mesmos é aqui uma qualidade teológica e não psicológica.
Isto é, não se trata de ser inseguro, com complexo de inferioridade, não
reconhecer dons e condições humanas e de vida cristã que Deus nos deu,
certamente em abundância. A confiança humana e psicológica é necessária ao
apóstolo. A desconfiança de que estamos falando está num outro nível, no âmbito
dos frutos do Espírito. E paradoxalmente, uma autêntica confiança no Deus do
apostolado comunica ao apóstolo a confiança psicológica que lhe pode faltar
diante da evidência de suas limitações humanas.
O
evangelizador que colocou a sua confiança nele p0róprio e não no Senhor, como
atitude habitual e profunda (tão profunda que muitas vezes nem se apercebe mais
que Deus está presente, tornando-se cego na sua auto-suficiência), reforça esta
tentação com certos tipos de êxito proporcionados pelas suas qualidades humanas
e a sua influência. Ora, as actividades apostólicas seguem as leis da eficácia
humana, que é sempre exitosa num primeiro momento, mas que nem sempre está
ligada à graça e à obra permanente de Deus. Todos conhecemos evangelizadores
inteligentes, preparados e com muitas qualidades, que exerciam grande atracção
e influência. Talvez por esta razão, colocavam a sua confiança apostólica em si
mesmos, mais do que em Deus. Evangelizadores estes, que durante alguns anos brilharam
no apostolado. Eram convidados para pregar retiros e dar conferências,
suscitaram vocações sacerdotais e tiveram muitos seguidores. Num determinado
momento, surgiram algumas contradições e fracassos e, quase da noite para o
dia, apagaram-se. E mais, muitos de seus jovens seguidores, com o tempo, distanciaram-se
da Igreja. Os grupos e comunidades que tinham formado não perseveraram e as vocações
que haviam suscitado foram-se retirando do seminário… O que aconteceu? Deus
deu-lhes a entender “Eu não estou contigo”. Deus deixou este apóstolo sozinho,
revertendo a sua promessa de “estarei convosco até o final dos tempos” [1]. Apenas lhes concedeu os resultados de sua
auto-suficiência.
O
colocar a confiança primeiramente em Deus e não em nós próprios, tem uma caricatura:
recorrer à confiança em Deus nas ocasiões em que a gente não fez o que devia
fazer na actividade apostólica, ou em momentos que nos comportámos de maneira
irresponsável ou não nos preparámos como devíamos. Estas confianças
oportunistas são uma manipulação da verdadeira confiança em Deus. Ora, a
confiança, para que seja autêntica, supõe que o apóstolo se tenha preparado e
trabalhado como se tudo dependesse dele e que, uma vez feito tudo o que estava
ao seu alcance, às vezes até ao heroísmo, não põe a sua confiança no seu
trabalho e na sua preparação, mas no poder de Deus.
Fonte:
prebíteros
(revisão
da versão portuguesa por ama)
Este
texto é um extracto do livro do teólogo chileno segundo
galilea, Tentación y
Discernimiento, Narcea, Madrid 1991, p. 29-67.
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