11/04/2016

Evangelho, comentário, L. espiritual


Páscoa

Evangelho: Jo 6, 22-29

22 No dia seguinte, a multidão, que tinha ficado do outro lado do mar, advertiu que não havia ali mais que uma barca e que Jesus não tinha entrado nela com os Seus discípulos, mas que os Seus discípulos tinham partido sós. 23 Entretanto, arribaram de Tiberíades outras barcas perto do lugar onde haviam comido o pão, depois de o Senhor ter dado graças. 24 Tendo, pois, a multidão visto que lá não estava nem Jesus nem os Seus discípulos, entrou naquelas barcas e foi a Cafarnaum em busca de Jesus. 25 Tendo-O encontrado do outro lado do mar, disseram-lhe: «Mestre, quando chegaste aqui?». 26 Jesus respondeu-lhes: «Em verdade, em verdade vos digo: Vós buscais-Me não porque vistes os milagres, mas porque comestes dos pães e ficastes saciados. 27 Trabalhai não pela comida que perece, mas pela que dura até à vida eterna, e que o Filho do Homem vos dará. Porque n'Ele imprimiu Deus Pai o Seu selo». 28 Eles, então, disseram-Lhe: «Que devemos fazer para praticar as obras de Deus?». 29 Jesus respondeu: «A obra de Deus é esta: Que acrediteis n'Aquele que Ele enviou».

Comentário:

Jesus Cristo dá-nos uma informação preciosa: Qual é a Vontade de Deus!

A cada passo deparamo-nos com essa dúvida ou, pelo menos, interrogação: devo fazer isto… ou não? Está certo ou errado? Será que Deus o quer?

Nestes momentos não há que hesitar, basta dizer com todas as veras da nossa alma:

‘Senhor, eu creio em Ti, mas aumenta a minha fé.’

(ama comentário sobre Jo 6, 22-29, 2013.04.15)


Leitura espiritual



SANTO AGOSTINHO – CONFISSÕES

LIVRO DÉCIMO

CAPÍTULO XI

Ideias inatas

Por isso descobrimos que adquirir tais noções – cujas imagens não atingimos por meio dos sentidos mas que percebemos em nós, sem o auxílio de imagens, tais como são em si mesmas, nada mais é do que coligir com o pensamento os elementos esparsos na memória e, pela reflexão, obrigá-los a estarem sempre disponíveis na memória, onde antes se ocultavam em desordem e abandono, de modo que se apresentem sem dificuldade ao chamado do nosso espírito. E quantas noções deste tipo a minha memória não encerra, já descobertas e, como disse, postas como que à mão; eis o que chamamos de “aprender” e “saber”. Se porém deixo de as recordar por uns tempos, de tal modo submergem e se dispersam nos seus profundos esconderijos, que é preciso reuni-las uma segunda vez, como se fossem novas (cogente) – pois não têm outra habitação – e juntá-las de novo para que possam ser objecto do saber; isto é: preciso tirá-las de sua condicção de dispersão e juntá-las novamente. Daí a palavra cogitare, porque cogo e cogito são como ajo e agito, e facio, facito. Contudo, a inteligência reivindicou essa palavra (cogito) para si, de modo que essa operação de coligir, de reunir no espírito, e não noutra parte, é propriamente o que se chama pensar (cogitare).

CAPÍTULO XII

A memória e as matemáticas

A memória guarda também as relações e inumeráveis leis dos números e dimensões, sendo que nenhuma dessas ideias foi impressa em nós pelos sentidos do corpo, porque não têm cor, nem som, nem têm cheiro, nem gosto, nem são tangíveis. Ouço, quando delas se fala, os sons das palavras que as exprimem; mas uma coisa são os sons, e outra bem diferente são as ideias que elas significam. As palavras soam de modo diferente em grego e em latim; mas as ideias nem são gregas, nem latinas, nem de nenhuma outra língua.

Vi linhas traçadas por artistas, finas como um fio de aranha. Mas as linhas materiais não são a imagem das que vi com meus olhos carnais. Para reconhecê-las não há necessidade alguma de se pensar num corpo qualquer, pois, é no espírito que as reconhecemos.

Também conheci os números mediante os sentidos do corpo: mas a ideia de número é bem diferente: não são imagens dos primeiros, possuindo por isso mesmo um ser muito mais real.

Ria-se de mim quem não compreender o que disse; eu terei compaixão do seu riso.

CAPÍTULO XIII

A memória da memória

Tudo isso guardo na minha memória, assim como o modo pelo qual o aprendi.

Também guardo na memória as muitas argumentações infundadas que ouvi contra essas verdades. Essas objecções sem dúvida são falsas, mas não é falso recordá-las. E lembro de ter sabido distinguir entre essas verdades e os erros que se lhe opunham. Vejo agora que uma coisa é essa distinção, que faço hoje, e outra o recordar ter feito muitas vezes tal distinção, ao considerá-las. Lembro-me, portanto, de ter muitas vezes compreendido isso, e confio à memória o acto actual de distingui-las e compreendê-las, para me lembrar, mais tarde, de que hoje as compreendi. Lembro-me então de que me lembrei; e se mais tarde lembrar de que agora pude recordar essas coisas, será ainda por força da memória.

CAPÍTULO XIV

A lembrança dos sentimentos

Essa mesma memória conserva também os afectos da alma, não do modo como os sente a alma quando da vivência, mas de modo muito diverso, segundo o exige a força da memória.

Lembro-me de ter estado alegre, ainda que não o esteja agora; recordo a minha tristeza passada, sem estar triste; lembro-me de ter sentido medo, sem senti-lo de novo; lembro-me de antigo desejo, sem que o mesmo sinta agora. Outras vezes, pelo contrário, lembro-me com alegria a tristeza passada, e com tristeza uma alegria passada. Isto não tem nada para admirar quando se trata de emoções corporais, porque uma coisa é a alma e, outra, o corpo; e assim não é maravilha que me lembre com alegria de um sofrimento físico já passado.

Porém, aqui o espírito é a própria memória. Quando confiamos uma tarefa a alguém, dizemos: “Não o guardei no espírito”, “fugiu-me do espírito”. É, portanto, a memória que chamamos espírito. Sendo assim, por que ao evocar com alegria uma tristeza passada, o meu espírito sente alegria e a minha memória, tristeza? Se o meu espírito se alegra com a alegria que tem em si, por que a memória não se entristece com a tristeza, que também tem em si? Seria a memória estranha ao espírito? Quem ousará afirmá-lo? Sem dúvida a memória é como o estômago da alma, e a alegria e a tristeza são como alimentos, doce ou amargo; quando tais emoções são confiadas à memória, depois de passarem, digamos, por esse estômago, podem ali ser guardadas, mas já perderam o sabor. Seria ridículo comparar emoções e alimento como semelhantes. Contudo, elas não são totalmente diferentes.

É ainda da memória que tiro a distinção entre as quatro emoções da alma: o desejo, a alegria, o medo e a tristeza. Assim, todo o raciocínio que eu teça, dividindo cada uma delas nas espécies de seus géneros, definindo-as, é na memória que encontro o que tenho a dizer, e de lá tiro tudo o que digo. Contudo, ao recordar essas emoções, não me perturbo com nenhuma delas.

E antes mesmo que eu as recordasse para discuti-las, elas ali estavam, e por isso puderam ser tiradas da memória mediante a lembrança. Talvez a lembrança tire da memória essas emoções como o acto de ruminar tira do estômago os alimentos. Mas então, por que aquele que rumina sobre tais paixões não sente na boca do pensamento a doçura da alegria ou a amargura da tristeza? Estará justamente nisto a diferença entre tais factos? De facto, quem gostaria de falar dessas emoções se, todas as vezes que falássemos do medo ou da tristeza, nos víssemos tristes ou temerosos?

Contudo, certamente não poderíamos falar deles se não encontrássemos na memória não só os sons dessas palavras, segundo a imagem gravada em nós pelos sentidos, mas ainda as noções que elas exprimem. Essas noções, nós não as recebemos por nenhuma porta da carne, mas a própria alma, sentindo-as pela experiência das próprias emoções, confiou-as à memória; ou então a própria memória as reteve, sem que ninguém lhas confiasse.

CAPÍTULO XV

A memória das coisas ausentes

Mas quem poderá explicar se a recordação se faz por meio de imagens ou não?

Por exemplo: se digo pedra, ou digo sol, sem que tais objectos estejam presentes nos meus sentidos, certamente tenho as suas imagens na memória, à minha disposição.

Evoco uma dor do corpo, que está ausente de mim, já que nada me dói. Contudo, se a imagem da dor não estivesse na minha memória, não saberia o que dizia, e ao raciocinar não a distinguiria do prazer.

Falo de saúde do corpo, estando são; neste caso, está em mim o próprio objecto. No entanto, se a sua imagem não estivesse na minha memória, de modo algum lembraria o significado dessa palavra. Os doentes, ouvindo falar de saúde, não saberiam do que se trata, não fosse o poder da memória conservar a imagem da ausência da realidade.

Falo dos números com que calculamos, e eles apresentam-se na memória, não as suas imagens, mas os próprios números.

Evoco a imagem do sol, e esta apresenta-se à minha memória; e não evoco a imagem de uma imagem, mas a própria imagem, disponível à recordação.

Falo em memória, e reconheço o que falo, mas de onde o sei, senão da própria memória?

Estará ela presente a si própria pela sua imagem, e não por si mesma?

(Revisão de versão portuguesa por ama)


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