Moisés
constrói uma arca que não é para ele; por isso é o profeta maior de todos: «Nunca mais voltou a aparecer no povo de
Israel um profeta como Moisés, com quem o Senhor tratava pessoalmente»[i].
Na
morte de Moisés encontra-se também um paradigma da fé bíblica. Deus não se vê,
não pode ser representado.
É
uma voz que chega até nós através da voz dos profetas.
No
entanto, com o tempo, a fronteira entre a voz que fala ao profeta e a voz do
profeta torna-se cada vez mais ténue, mais subtil, quase desaparece; e para o
povo acabam por tornar-se uma só voz.
O
profeta distingue-se do falso profeta porque certo dia sabe pôr-se de lado,
desaparecer, apagar-se, dizendo: "eu
não sou Elohim para vós".
Se
Moisés foi o maior de todos, então a fé bíblica não é posse.
A
fé é saber habitar a "margem" entre a promessa e o fim do deserto,
saber manter-se no vau sem deixar-se arrastar pela corrente do rio.
É
esta margem que permite que a fé se não torne idolatria, adoração de ídolos, de
outras pessoas, de si mesmos.
Na
morte de Moisés, por fim, encontramos ainda uma maravilhosa lição sobre a
condição humana.
Não
existe terra prometida que possa ser alcançada: a vida é caminho, peregrinação,
êxodo.
Chegará
o momento – quase sempre antes da última volta do carrocel – no qual nos damos
conta de que as promessas da vida não se realizaram.
Mesmo
quando a vida foi estupenda, mesmo quando vimos Deus "face a face",
os silvados a arder, o maná descer do céu, a nuvem poisar sobre a nossa tenda,
sentimos que a promessa era outra, a que está além do Jordão.
(cont)
luigino bruni, In "Avvenire",
(Revisão da verão portuguesa por ama)
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