Santo
Ambrósio – Doutor da Igreja
Evangelho: Mc 1 1-8
1 Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus. 2
Conforme está escrito na profecia de Isaías: “Eis que envio o Meu mensageiro
diante de Ti, o qual preparará o Teu caminho”. 3 Voz do que brada no
deserto: “Preparai o caminho do Senhor, endireitai as Suas veredas”. 4
Apareceu João Baptista no deserto, pregando o baptismo de penitência para
remissão dos pecados. 5 E ia ter com ele toda a região da Judeia e
todos os habitantes de Jerusalém, e eram baptizados por ele no rio Jordão,
confessando os seus pecados. 6 Andava João vestido de pêlo de
camelo, trazia um cinto de couro atado à volta dos rins e alimentava-se de
gafanhotos e mel silvestre. 7 E pregava, dizendo: «Depois de mim vem
Quem é mais forte do que eu, a Quem eu não sou digno de me inclinar para Lhe
desatar as correias das sandálias. 8 Eu tenho-vos baptizado em água,
Ele, porém, baptizar-vos-á no Espírito Santo».
Comentário:
São Lucas diz expressamente que os que se baptizavam
confessavam os seus pecados.
Isto quer dizer exactamente que os “convertidos”
por João Baptista estavam realmente dispostos a mudar de vida e a seguir um
novo caminho como preparação para a vinda do Messias.
Não se tratava, portanto, de um mero acto simbólico
mas de uma verdadeira reconvenção de vida.
(ama, comentário sobre Mc 1, 1-8,
2014.11.19)
Leitura espiritual
São Josemaria Escrivá
Amigos de Deus 1 a 13
1
Há
muitos anos, íamos por uma estrada de Castela e vimos ao longe, no campo, uma
cena que me impressionou e me serviu para fazer oração em muitas ocasiões:
vários homens fixavam com força na terra as estacas que depois utilizaram para
segurar verticalmente uma rede e formar o redil. Mais tarde, chegaram àquele
lugar os pastores com as ovelhas, com os cordeiros; chamavam-nos pelo nome e
entravam um a um no aprisco, para estarem todos juntos, em segurança.
E
hoje, meu Senhor, lembro-me de modo particular desses pastores e desse redil,
porque todos os que nos encontramos aqui reunidos para conversar contigo - e
muitos outros no mundo inteiro -, sabemo-nos metidos no teu rebanho. Tu próprio
disseste: Eu sou o Bom Pastor, conheço as minhas ovelhas e as minhas ovelhas
conhecem-me. Conheces-nos bem; sabes que queremos ouvir, estar sempre atentos
aos teus assobios de Bom Pastor e corresponder-lhes porque a vida eterna é
esta: Que te conheçam a ti como um só Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem
enviaste.
Gosto
tanto da imagem de Cristo rodeado à direita e à esquerda pelas suas ovelhas,
que mandei colocá-la no oratório onde habitualmente celebro a Santa Missa; e
fiz gravar noutros lugares, como despertador da presença de Deus, as palavras
de Jesus: cognosco oves meas et cognoscunt me meae, para considerarmos a toda a
hora que Ele nos repreende ou nos instrui e nos ensina como o pastor faz com a
sua grei. Vem, pois, muito a propósito esta recordação de terras de Castela.
2
Deus quer-nos santos
Todos
os que aqui estamos fazemos parte da família de Cristo, porque Ele mesmo nos
escolheu antes da criação do mundo, por amor, para sermos santos e imaculados
diante dele, o qual nos predestinou para sermos seus filhos adoptivos por meio
de Jesus Cristo para sua glória, por sua livre vontade. Esta escolha gratuita
de que Nosso Senhor nos fez objecto, marca-nos um fim bem determinado: a santidade
pessoal, como S. Paulo nos repete insistentemente: haec est voluntas Dei:
sanctificatio vestra , esta é a vontade de Deus: a vossa santificação.
Portanto, não nos esqueçamos: estamos no redil do Mestre, para alcançar esse
fim.
3
Não
se apaga da minha memória uma ocasião - já passou muito tempo - em que fui
rezar à Catedral de Valência e passei defronte da sepultura do Venerável
Ridaura. Contaram-me então que perguntavam a este sacerdote, quando já era
muito idoso: quantos anos tem? Ele, muito convencido, respondia-lhes em
valenciano: poquets, pouquinhos! os que passei a servir a Deus. Para muitos de
vocês ainda se contam pelos dedos de uma mão os anos que passaram desde que se
decidiram a ter mais intimidade com Nosso Senhor, a servi-lo no meio do mundo,
no próprio ambiente e através da própria profissão ou ofício. Este pormenor não
tem muita importância; pelo contrário, interessa gravarmos a fogo na alma que o
convite à santidade, feito por Jesus Cristo a todos os homens sem excepção,
exige que cada um de nós cultive a vida interior, exercite diariamente as
virtudes cristãs; e não de uma maneira qualquer, nem acima do normal, nem
sequer de um modo excelente: devemos esforçar-nos até ao heroísmo, no sentido
mais forte e radical da expressão.
4
A
meta que proponho - ou melhor, a que Deus indica a todos - não é uma miragem ou
um ideal inatingível: podia contar-vos tantos exemplos concretos de mulheres e
de homens correntes, como vocês e como eu, que encontraram Jesus que passa
quasi in occulto pelas encruzilhadas aparentemente mais vulgares e decidiram
segui-lo, abraçando com amor a cruz de cada dia. Nesta época de desmoronamento
geral, de concessões e de desânimos, ou de libertinagem e de anarquia,
parece-me ainda mais actual aquela convicção simples e profunda que, no
princípio da minha actividade sacerdotal e sempre, me consumiu em desejos de
comunicar à humanidade inteira: estas crises mundiais são crises de santos.
5
Vida
interior: é uma exigência do chamamento que o Mestre fez à alma de todos. Temos
de ser santos - di-lo-ei com uma expressão castiça - da cabeça aos pés:
cristãos de verdade, autênticos, canonizáveis; se não, fracassámos como
discípulos do único Mestre. Pensem também que Deus, ao reparar em nós, ao
conceder-nos a sua graça para lutarmos por alcançar a santidade no meio do
mundo, nos impõe também a obrigação do apostolado. Compreendam que, até humanamente,
como comenta um Padre da Igreja, a preocupação pelas almas brota como uma
consequência lógica dessa escolha: quando descobris que algo vos foi
proveitoso, tentais atrair os outros. Tendes pois que desejar que outros vos
acompanhem pelos caminhos de Nosso Senhor. Se ides ao foro ou aos banhos e
deparais com alguém que esteja desocupado, convidai-lo para que vos acompanhe.
Aplicai ao espiritual este costume terreno e, quando fordes a Deus, não o
façais sós.
Se
não queremos desperdiçar o tempo inutilmente - nem sequer com falsas desculpas
das dificuldades exteriores do ambiente, que nunca faltaram desde o princípio
do cristianismo - devemos ter muito presente que, de um modo normal, Jesus
Cristo vinculou à vida interior a eficácia da nossa acção para arrastar os que
nos rodeiam. Cristo pôs a santidade como condição para a eficácia da acção
apostólica; corrijo-me, o esforço da nossa fidelidade, porque na terra nunca
seremos santos. Parece inacreditável, mas Deus e os homens precisam que, da
nossa parte, haja uma fidelidade sem condições, sem eufemismos, que chegue até
às últimas consequências, sem mediocridade ou concessões, em plenitude de
vocação cristã assumida e praticada com delicadeza.
6
Talvez
entre vocês algum esteja a pensar que me refiro exclusivamente a um sector de
pessoas selectas. Não se deixem enganar tão facilmente, movidos pela cobardia
ou pelo comodismo. Pelo contrário, que cada um sinta a urgência divina de ser
outro Cristo, ipse Christus, o próprio Cristo; em poucas palavras, a urgência
de que a nossa conduta seja coerente com as normas da fé, pois a nossa
santidade - a que temos de aspirar - não é uma santidade de segunda categoria,
que não existe. E o principal requisito que nos é pedido - bem conforme com a
nossa natureza - consiste em amar: a caridade é o vínculo da perfeição;
caridade que devemos praticar de acordo com as orientações explícitas que o
próprio Senhor estabelece: amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com
toda a tua alma, com toda a tua mente, sem reservarmos nada para nós. A
santidade consiste nisto.
7
É
bem certo que se trata de um objectivo elevado e árduo. Mas não se esqueçam de
que o santo não nasce: forja-se no jogo contínuo da graça divina e da
correspondência humana. Um dos escritores cristãos dos primeiros séculos
adverte, referindo-se à união com Deus: Tudo o que se desenvolve começa por ser
pequeno. Ao alimentar-se gradualmente, com constantes progressos, é que chega a
ser grande. Por isso te digo que, se quiseres portar-te como um cristão
coerente - sei que estás disposto a isso, embora te custe tantas vezes
vencer-te ou puxar por esse pobre corpo - deves ter muito cuidado com os mais
pequenos pormenores, porque a santidade que Nosso Senhor te exige atinge-se
realizando com amor de Deus o trabalho e as obrigações de cada dia, que se
compõem quase sempre de pequenas realidades.
8
Coisas pequenas e vida de
infância
Pensando
naqueles que, à medida que o tempo passa, ainda se dedicam a sonhar -em sonhos
vãos e pueris, como Tartarin de Tarascon - com caçar leões nos corredores de
casa, onde se calhar só há ratos e pouco mais, pensando neles, insisto, lembro
a grandeza de actuar com espírito divino no cumprimento fiel das obrigações habituais
de cada dia, com essas lutas que enchem Nosso Senhor de alegria e que só Ele e
cada um de nós conhece.
Convençam-se
de que normalmente não vão encontrar ocasiões para grandes façanhas, entre
outros motivos porque não é habitual que surjam essas oportunidades. Pelo
contrário, não faltam ocasiões de demonstrar o amor a Jesus Cristo, através do
que é pequeno, do normal. A grandeza da alma também se demonstra nas coisas diminutas,
comenta S. Jerónimo. Não admiramos o Criador apenas no céu e na terra, no sol e
no oceano, nos elefantes, camelos, bois, cavalos, leopardos, ursos e leões; mas
também nos animais minúsculos como formigas, mosquitos, moscas, vermes e outros
animais semelhantes, que distinguimos melhor pelos corpos do que pelos nomes:
admiramos a mesma mestria tanto nos grandes como nos pequenos. Assim, a alma
que se dá a Deus dedica às coisas menores o mesmo fervor que às maiores.
9
Ao
meditar as palavras de Nosso Senhor: Por amor deles santifico-me a mim mesmo,
para que eles também sejam santificados na verdade, percebemos claramente o
nosso único fim: a santificação, isto é, que temos de ser santos para
santificar. Simultaneamente, como tentação subtil, talvez nos assalte o
pensamento de que muito poucos estamos decididos a responder a esse convite
divino, além de nos vermos como instrumentos de muito fraca categoria. É
verdade, somos poucos, em comparação com o resto da humanidade e pessoalmente
não valemos nada; mas a afirmação do Mestre ressoa com autoridade: o cristão é
luz, sal, fermento do mundo e um pouco de fermento faz levedar toda a massa.
Precisamente por isso, tenho pregado sempre que nos interessam todas as almas -
as cem que há num cento - sem nenhuma espécie de discriminações, com a certeza
de que Jesus Cristo nos redimiu a todos e quer servir-se de alguns de nós,
apesar da nossa nulidade pessoal, para darmos a conhecer esta salvação.
Um
discípulo de Jesus nunca trata ninguém mal; chama erro ao erro, mas deve
corrigir com afecto o que erra: se não, não pode ajudá-lo, não pode
santificá-lo. Temos que conviver, temos que compreender, temos que desculpar,
temos que ser fraternos; e, como aconselhava S. João da Cruz, temos que pôr
amor, onde não há amor, para tirar amor, sempre, mesmo nas circunstâncias
aparentemente intranscendentes que o trabalho profissional e as relações
familiares e sociais nos proporcionam. Portanto, tu e eu vamos aproveitar até
as oportunidades mais banais que se apresentarem à nossa volta, para santificá-las,
para nos santificarmos e para santificar os que compartilham connosco os mesmos
afãs quotidianos, sentindo nas nossas vidas o peso doce e sugestivo da
co-redenção.
10
Vou
continuar esta conversa diante de Nosso Senhor, com uma nota que utilizei há
uns anos e que mantém a actualidade. Recolhi então umas considerações de Teresa
de Ávila: tudo o que se acaba e não contenta Deus, é nada e menos que nada.
Compreendem porque é que uma alma deixa de saborear a paz e a serenidade quando
se afasta do seu fim, quando se esquece de que Deus a criou para a santidade?
Esforcem-se por nunca perder este ponto de mira sobrenatural, nem sequer nos
momentos de diversão ou de descanso, tão necessários como o trabalho na vida de
cada um.
Bem
podem chegar ao cume da vossa actividade profissional, alcançar os triunfos
mais retumbantes, como fruto da livre iniciativa com que exercem as actividades
temporais; mas se abandonarem o sentido sobrenatural que tem de presidir todo o
nosso trabalho humano, enganaram-se lamentavelmente no caminho.
11
Permitam-me
uma pequena digressão que vem muito a propósito. Nunca perguntei a opinião
política a nenhum dos que vêm ter comigo: não me interessa! Com esta minha
norma de conduta, manifesto uma realidade que está muito metida no âmago do
Opus Dei, ao qual me dediquei completamente, com a graça e a misericórdia
divina, para servir a Santa Igreja. Não me interessa esse tema porque os
cristãos gozam da mais completa liberdade, com a consequente responsabilidade
pessoal, para intervir como lhes parecer melhor em questões de índole política,
social, cultural, etc., sem outros limites além dos que o Magistério da Igreja
indica. Só ficaria preocupado - pelo bem dessas almas - se não respeitassem
tais marcas, porque teriam criado uma vincada oposição entre a fé que afirmam
professar e as obras: e, nessa altura, teria que lhes chamar a atenção com clareza.
Este sacrossanto respeito pelas vossas opções, desde que elas não afastem da
lei de Deus, não se entende. Não o entende quem ignora o verdadeiro conceito da
liberdade que Cristo nos ganhou na Cruz, qua libertate Christus nos liberavit,
quem for sectário de um e de outro extremo, quem pretender impor as suas
opiniões temporais como dogmas. Também não o entende quem degrada o homem, ao
negar o valor da fé, colocando-a à mercê dos erros mais brutais.
12
Mas
voltemos ao nosso tema. Dizia-lhes que bem podem alcançar os êxitos mais
espectaculares no terreno profissional, na actuação pública, nos afazeres
profissionais, mas se se descuidarem interiormente e se afastarem de Nosso
Senhor, o fim será um fracasso rotundo. Perante Deus, que é o que conta em
última análise, quem luta por comportar-se como um cristão autêntico, é que
consegue a vitória: não existe uma solução intermédia. Por isso vocês conhecem
tantas pessoas que deviam sentir-se muito felizes, ao julgar a sua situação de
um ponto de vista humano e, no entanto, arrastam uma existência inquieta,
azeda; parece que vendem alegria a granel, mas aprofunda-se um pouco nas suas
almas e fica a descoberto um sabor acre, mais amargo que o fel. Isto não há-de
acontecer a nenhum de nós, se deveras tratarmos de cumprir constantemente a
Vontade de Deus, de dar-lhe glória, de louvá-lo e de espalhar o seu reinado
entre todas as criaturas.
(cont)
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