01/09/2014

Evang., Coment. Leit. Espiritual (Instr. Libertatis Conscientia)

Tempo comum XXII Semana

Evangelho: Lc 4, 16-30

16 Foi a Nazaré, onde Se tinha criado, entrou na sinagoga, segundo o Seu costume, em dia de sábado, e levantou-Se para fazer a leitura. 17 Foi-Lhe dado o livro do profeta Isaías. Quando desenrolou o livro, encontrou o lugar onde estava escrito: 18 “O Espírito do Senhor repousou sobre Mim; pelo que Me ungiu para anunciar a boa nova aos pobres; Me enviou para anunciar a redenção aos cativos, e a recuperação da vista aos cegos, a pôr em liberdade os oprimidos, 19 a pregar um ano de graça da parte do Senhor”. 20 Tendo enrolado o livro, deu-o ao encarregado, e sentou-Se. Os olhos de todos os que se encontravam na sinagoga estavam fixos n'Ele. 21 Começou a dizer-lhes: «Hoje cumpriu-se este passo da Escritura que acabais de ouvir». 22 E todos davam testemunho em Seu favor, e admiravam-se das palavras de graça que saíam da Sua boca, e diziam: «Não é este o filho de José?». 23 Então disse-lhes: «Sem dúvida que vós Me aplicareis este provérbio: “Médico, cura-te a ti mesmo”. Todas aquelas grandes coisas que ouvimos dizer que fizeste em Cafarnaum, fá-las também aqui na Tua terra». 24 Depois acrescentou: «Em verdade vos digo que nenhum profeta é bem recebido na sua terra. 25 Em verdade vos digo que muitas viúvas havia em Israel no tempo de Elias, quando foi fechado o céu durante três anos e seis meses e houve uma grande fome por toda a terra; 26 e a nenhuma delas foi mandado Elias, senão a uma mulher viúva de Sarepta, do território de Sidónia. 27 Muitos leprosos havia em Israel no tempo do profeta Eliseu; e nenhum deles foi curado, senão o sírio Naaman». 28 Todos os que estavam na sinagoga, ouvindo isto, encheram-se de ira. 29 Levantaram-se, lançaram-n'O fora da cidade, e conduziram-n'O até ao cume do monte sobre o qual estava edificada a cidade, para O precipitarem. 30 Mas, passando no meio deles, retirou-Se.

Comentário:

O preconceito é um dos mais terríveis defeitos que se podem ter. O preconceituoso tem o entendimento como que cerrado a qualquer outra coisa que não seja o que se “encaixa” perfeitamente no seu modo de ver e avaliar as coisas.
Por vezes, atinge tal dimensão que impede ver e ouvir e, não ouvindo nem vendo não pode entender e, se não entende, como poderá aceitar?

(ama, comentário sobre Lc 4, 16-30, 2014.05.30)

Leitura espiritual


Documentos do Magistério

CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ

INSTRUÇÃO
LIBERTATIS CONSCIENTIA
SOBRE A LIBERDADE CRISTÃ E A LIBERTAÇÃO
CAPÍTULO IV

A MISSÃO LIBERTADORA DA IGREJA

II. O amor preferencial pelos pobres

Jesus e a pobreza

66. Cristo Jesus, sendo rico, fez-se pobre para nos enriquecer por meio da sua pobreza. 95 São Paulo fala, aqui, do mistério da Encarnação do Filho eterno, que veio assumir a natureza humana mortal para salvar o homem da miséria na qual o pecado o tinha mergulhado.
Mais ainda, na condição humana, Cristo escolheu um estado de pobreza e de despojamento, 96 a fim de mostrar em que consiste a verdadeira riqueza a ser buscada, a da comunhão de vida com Deus. Ele ensinou o desapego das riquezas da terra para que se deseje as riquezas do céu. 97
Os Apóstolos que escolheu também tiveram que abandonar tudo e participar do seu despojamento. 98
Anunciado pelo Profeta como o Messias dos pobres, 99 é entre eles, os humildes, os «pobres de Javé» sedentos da justiça do Reino, que ele encontrou corações capazes de acolhê-lo.
Mas quis também estar perto daqueles que, mesmo ricos dos bens deste mundo, eram excluídos da comunidade, como «publicanos e pecadores», pois ele tinha vindo chamá-los à conversão. 100
É uma tal pobreza, feita de desapego, de confiança em Deus, de sobriedade, da disposição à partilha, que Jesus declarou bem-aventurada.

Jesus e os pobres

67. Mas Jesus não trouxe apenas a graça e a paz de Deus; também curou inúmeros enfermos; teve compaixão da multidão que não tinha o que comer, alimentando-a; com os discípulos que o seguiam, praticou a esmola. 101.
A Bem-aventurança da pobreza que proclamou não significa, pois, absolutamente, que os cristãos podem desinteressar-se dos pobres desprovidos do necessário à vida humana neste mundo. Fruto e consequência do pecado dos homens e da sua fragilidade natural, essa miséria é um mal de que é preciso, tanto quanto possível, libertar os seres humanos.

O amor preferencial pelos pobres
68. Sob as suas múltiplas formas – extrema privação material, opressão injusta, enfermidades físicas e psíquicas e, por fim, a morte – a miséria humana é o sinal manifesto da condição nativa de fraqueza na qual o homem se encontra após o primeiro pecado e da necessidade de uma salvação.
É por isso que ela atrai a compaixão de Cristo Salvador, que quis assumi-la sobre si, 102 identificando-se com os «mais pequeninos entre os seus irmãos» (Mt 25, 40. 45).
É também por isso que todos aqueles que ela atinge são objecto de um amor preferencial por parte da Igreja que, desde as suas origens, apesar das falhas de muitos dos seus membros, não deixou nunca de se esforçar por aliviá-los, defendê-los e libertá-los. Ela fá-lo através de inúmeras obras de beneficência, que continuam a ser, sempre e por toda a parte, indispensáveis. 103
Depois, através da sua doutrina social que se esforça por aplicar, procurou promover mudanças estruturais na sociedade, a fim de se alcançar condições de vida dignas da pessoa humana.
Pelo desapego das riquezas, que possibilita a partilha e abre ao Reino, 104 os discípulos de Jesus testemunham; através do amor aos pobres e aos infelizes, o próprio amor do Pai, que se manifestou no Salvador.
Esse amor vem de Deus e leva a Deus.
Os discípulos de Cristo sempre reconheceram nos dons depositados sobre o altar um dom oferecido ao próprio Deus.
Amando os pobres, enfim, a Igreja testemunha a dignidade do homem. Ela afirma claramente que este vale mais pelo que é do que pelo que possui. Ela testemunha que essa dignidade não pode ser destruída, seja qual for a situação de miséria, de desprezo, de rejeição e de impotência a que o homem foi reduzido.
Mostra-se solidária com aqueles que não contam para uma sociedade da qual se veem espiritual e às vezes até mesmo fisicamente rejeitados.
 De modo particular, a Igreja volta-se com afecto materno para os filhos que, por causa da maldade humana, nunca virão à luz, como também para as pessoas idosas, sós ou abandonadas.
A opção privilegiada pelos pobres, longe de ser um sinal de particularismo ou de sectarismo, manifesta a universalidade do ser e da missão da Igreja. Tal opção não é exclusiva nem excludente.

É por essa razão que a Igreja não pode exprimi-la com a ajuda de categorias sociológicas e ideológicas redutoras, que fariam de tal preferência uma opção partidária e de natureza conflituosa.

Comunidades de base e movimentos eclesiais
69. As novas comunidades de base e outros grupos de cristãos, formados para serem testemunhas deste amor evangélico, são um motivo de grande esperança para a Igreja.
Se viverem verdadeiramente em unidade com a Igreja local e a Igreja universal, serão uma autêntica expressão da comunhão e um meio de se construir uma comunhão mais profunda. 105
Serão fiéis à sua missão na medida em que tiverem o cuidado de educar os seus membros na integralidade da fé cristã, pela escuta da Palavra de Deus, pela fidelidade ao ensinamento do Magistério, à ordem hierárquica da Igreja e à vida sacramental.
Sob tais condições, a sua experiência, radicada num empenho pela libertação integral do homem, torna-se uma riqueza para a Igreja inteira.

A reflexão teológica
70. De maneira semelhante, uma reflexão teológica desenvolvida a partir de uma experiência particular pode constituir uma contribuição muito positiva, já que permite pôr em evidência aspectos da Palavra de Deus cuja riqueza total ainda não tinha sido plenamente percebida.
Mas para que tal reflexão seja verdadeiramente uma leitura da Escritura e não uma projecção sobre a Palavra de Deus de um sentido que ela não contém, o teólogo estará atento a interpretar a experiência, da qual ele parte, à luz da tradição e da experiência da própria Igreja. Essa experiência da Igreja brilha, com uma luminosidade singular e em toda a sua pureza, na vida dos santos.
Compete aos Pastores da Igreja, em comunhão com o Sucessor de Pedro, discernir a autenticidade de tais experiências.

CAPÍTULO V

A DOUTRINA SOCIAL DA IGREJA: POR UMA PRAXIS CRISTÃ DA LIBERTAÇÃO

A praxis cristã da libertação

71. A dimensão soteriológica da libertação não pode ser reduzida à dimensão socio-ética, que é uma consequência sua. Restituindo ao homem a verdadeira liberdade, a libertação radical realizada por Cristo atribui ao mesmo homem uma tarefa: a praxis cristã, que é a execução do grande mandamento do amor.
Este último é o princípio supremo da moral social cristã, fundada sobre o Evangelho e sobre toda a tradição desde os tempos apostólicos e a época dos Padres da Igreja até às recentes intervenções do Magistério.
Os consideráveis desafios de nossa época constituem um apelo urgente para se pôr em prática esta doutrina de acção.

I. Natureza da doutrina social da Igreja
Mensagem evangélica e vida social
72. O ensinamento social da Igreja nasceu do encontro da mensagem evangélica e de suas exigências, resumidas no mandamento supremo do amor, 106 com os problemas que emanam da vida da sociedade. Ele constituiu-se como uma doutrina, usando os recursos da sabedoria e das ciências humanas, diz respeito ao aspecto ético desta vida e leva em consideração os aspectos técnicos dos problemas, mas sempre para julgarmos do ponto de vista moral.
Essencialmente orientado para a acção, esse ensinamento desenvolve-se em função das circunstâncias mutáveis da história.
É por essa razão que, com princípios sempre válidos, ele comporta também juízos contingentes.
Longe de constituir um sistema fechado, permanece constantemente aberto às questões novas que não cessam de se apresentar; requer a contribuição de todos os carismas, experiências e competências.
Perita em humanidade, a Igreja oferece, na sua doutrina social, um conjunto de princípios de reflexão, de critérios de julgamento, 107 como também de directrizes de acção, 108 para que sejam realizadas as mudanças profundas que as situações de miséria e de injustiça estão a exigir e isso de uma maneira que sirva ao verdadeiro bem dos homens.

Princípios fundamentais
73, O mandamento supremo do amor conduz ao pleno reconhecimento da dignidade de cada homem, criado à imagem de Deus. Dessa dignidade decorrem direitos e deveres naturais.
À luz da imagem de Deus, a liberdade, prerrogativa essencial de pessoa humana, manifesta-se em toda a sua profundidade. As pessoas são o sujeito activo e responsável da vida social. 109
Ao fundamento, que é a dignidade do homem, estão intimamente ligados o princípio de solidariedade e o princípio de subsidiariedade.
Em virtude do primeiro, o homem deve contribuir, com os seus semelhantes, para o bem comum da sociedade, em todos os seus níveis. 110 Sob este ângulo, a doutrina da Igreja opõe-se a todas as formas de individualismo social ou político.
Em virtude do segundo, nem o Estado, nem sociedade alguma, jamais devem substituir-se à iniciativa e à responsabilidade das pessoas e das comunidades intermediárias, no nível em que essas possam agir, nem destruir o espaço necessário à liberdade das mesmas. 111
Por este lado, a doutrina social da Igreja opõe-se a todas as formas de colectivismo.

(cont)

(Revisão da versão portuguesa por ama)
____________________________________
Notas:
95 Cfr. 2 Cor 8, 9.
96 Cfr. Lc 2, 7; 9, 58.
97 Cfr. Mt 6, 19-20. 24-34; 19-21.
98 Cfr. Lc 5, 11. 28; Mt 19, 27.
99 Cfr. Is 11, 4; 61, 1; Lc 4, 18.
100 Cfr. Mc 2, 13-17; Lc 19, 1-10.
101 Cfr. Mt 8, 16; 14, 13-21; Jo 13, 29.
102 Cfr. Mt 8, 17.
103 Cfr. Paulo VI, Enc. Populorum Progressio, nn. 12. 46: AAS 59 (1967), 262-263. 280; Documento da 3a Conferência do Episcopado latino-americano em Puebla, n. 476.
104 Cfr. At 2, 44-45.
105 Cfr. 2o Sínodo Extraordinário, Relatio finalis, II, C, 6: L’Osservatore Romano, 10 de dezembro de 1985, 7; Paulo VI, Exort. apost. Evangelii Nuntiandi, n. 58: AAS 68 (1976), 46-49; João Paulo II, Mensagem às Comunidades de Base, entregue em Manaus, 10 de julho de 1980.
106 Cfr. Mt 22, 37-40; Rm 13, 8-10.
107 Cfr. Paulo VI, Carta apost. Octogesima Adveniens, n. 4: AAS 63 (1971), 403-404; João Paulo II, Discurso inaugural de Puebla, III, 7: AAS 71 (1979), 203.
108 Cfr. João XXIII, Enc. Mater et Magistra, n. 235: AAS 53 (1961), 461.
109 Cfr. Const. past.Gaudium et Spes, n. 25.
110 Cfr. João XXIII, Enc. Mater et Magistra, nn. 132-133: AAS 53 (1961), 437.
111 Cfr. Pio XI, Enc. Quadragesimo Anno, nn. 79-80: AAS 23 (1931), 203; João XXIII, Enc. Mater et Magistra, n. 138: AAS 53 (1961), 439; Enc. Pacem in Terris, n. 74: AAS 55 (1963), 294-295.



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