Art.
5 — Se os contingentes naturais estão sujeitos à lei eterna.
O quinto discute-se assim. — Parece
que os contingentes naturais não estão sujeitos à lei eterna.
1. — Pois, a promulgação é da essência
da lei, como já se disse (q. 90, a. 4). Ora, a promulgação não pode ser feita
senão para criaturas racionais, a que alguma coisa pode ser anunciada. Logo, só
as criaturas racionais estão sujeitas à lei eterna, e portanto os contingentes
naturais não o estão.
2. Demais. — O que obedece à razão
participa dela, de certo modo, como diz Aristóteles. Ora, a lei eterna é a
razão suma, como já se disse (a. 1). Logo, como os contingentes naturais não
participam de nenhum modo da razão, mas ao contrário, são irracionais, parece
que não estão sujeitos à lei eterna.
3. Demais. — A lei eterna é
eficacíssima. Ora os contingentes naturais são susceptíveis de deficiências.
Logo, não estão sujeitos à lei eterna.
Mas, em contrário, diz a Escritura (Pr
8, 29): Quando circunscrevia ao mar o seu termo, e punha lei às águas para que
não passassem os seus limites.
O que se diz da lei humana
não é o mesmo que o dito da lei eterna, que é a lei de Deus. Pois, a lei humana
estende-se somente às criaturas racionais sujeitas ao homem. E a razão é que a
lei é directiva dos actos próprios dos súbditos de um governo, por isso,
ninguém, propriamente falando, impõe lei aos próprios actos. Ora, tudo o que o
homem faz, usando dos seres irracionais, que lhe estão sujeitos, fá-lo por um acto
próprio que move tais seres. Pois, essas criaturas irracionais não agem por si
mesmas, mas são levadas por outras, como já se disse (q. 1, a. 2). Donde, o
homem não pode impor lei aos seres irracionais, embora lhe estejam sujeitos.
Mas pode-o para os seres racionais, que lhe estão sujeitos, imprimindo-lhes no
espírito, por um preceito ou um anúncio qualquer, uma certa regra, que é o
princípio do agir.
Ora, assim como o homem, por um
enunciado, imprime um princípio interior aos actos de quem lhe está sujeito,
assim também Deus imprime a toda a natureza os princípios dos actos próprios
dela. E assim sendo, dizemos que Deus põe preceito para toda a natureza, conforme
a Escritura (Sl 148, 6): Preceito pôs e não se quebrantará. E por esta mesma
razão, todos os movimentos e acções de toda a natureza estão sujeitos à lei
eterna. Donde, é de outro modo que as criaturas irracionais estão sujeitas à
lei eterna: enquanto movidas pela Divina Providência e não, pela inteligência
do preceito divino, como as criaturas racionais.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— A impressão activa de um princípio intrínseco está para as coisas naturais,
assim como a promulgação da lei está para os homens. Porque a promulgação da
lei imprime nos homens um princípio directivo dos seus actos, como já se disse.
RESPOSTA À SEGUNDA. — As criaturas
irracionais não participam da razão humana, nem lhe obedecem, participam porém,
a modo de obediência, da razão divina. Pois, o poder da razão divina tem maior
extensão que o da razão humana. E assim como os membros do corpo humano se movem
pelo império da razão, mas dela não participam, porque não têm nenhuma
apreensão ordenada para a razão, assim também as criaturas irracionais são
movidas por Deus, sem por isso virem a ser racionais.
RESPOSTA À TERCEIRA. — As deficiências
ocorrentes nos seres naturais, embora estejam fora da ordem das causas
particulares, não escapam contudo, à das causas universais. E principalmente
não escapam à ordem da causa primeira, que é Deus, a cuja Providência nada pode
fugir, como dissemos na Primeira Parte (q. 22, a. 2). E sendo a lei eterna a
razão da Divina Providência, como já dissemos (a. 1), as deficiências dos seres
naturais estão sujeitas à lei eterna.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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