Capítulo
3:
O segundo fruto que se há-de colher da consideração da primeira Palavra dita
por Cristo na Cruz 8
Mas, omitindo estas
considerações, passemos revista aos muitos e grandes inconvenientes que sofrem
aqueles homens que, apenas para escapar de uma sombra de desonra diante dos
homens, estão obstinados a se vingar daqueles que lhes fizeram qualquer mal. Em
primeiro lugar, agem como estultos ao preferir um mal maior a um menor. Pois é
um princípio considerado certo em toda parte, e que nos foi declarado pelo
Apóstolo nestas palavras: "Não façamos o mal para que venha o bem" 13.
Segue-se que, por consequência, um mal maior não há de ser cometido para que se
possa obter alguma compensação por um menor. Aquele que recebe a injúria,
recebe o que é chamado de mal da injúria: aquele que se vinga de uma injúria, é
culpável do que se chama de mal do crime. Ora, sem dúvida, a desgraça de
cometer um crime é maior que a desgraça de ter de suportar a injúria, pois,
ainda que a ofensa possa tornar um homem miserável, não necessariamente o torna
mau. Um crime, no entanto, o faz, a um tempo, miserável e malvado. A injúria
priva o homem do bem temporal, o crime o priva tanto do bem temporal como do
eterno. Assim, um homem que remedia o mal de uma injúria cometendo um crime, é
como um homem que corta uma parte dos seus pés para calçar sapatos menores, o
que é um ato de total loucura. Ninguém comete tal insensatez em suas
preocupações temporais, mas, no entanto, há alguns homens tão cegos a seus
interesses reais, que não temem ofender mortalmente a Deus para escapar daquilo
que tem aparência de desgraça, e para manter um semblante de honra aos olhos
dos homens. Caem, pois, sob o desagrado e a ira de Deus, e, a menos que se
corrijam a tempo e façam penitência, terão que suportar a desgraça e o tormento
eterno, e perderão a honra sem fim de habitarem no céu. Acrescente-se a isto
que realizam um ato dos mais agradáveis ao diabo e seus anjos, que urgem a este
homem fazer algo de injusto a aquele outro, com o propósito de semear a
discórdia e a inimizade no mundo. E cada um deve refletir com calma quão
desgraçado não é quem agrada o inimigo mais feroz da raça humana e desagrada o
Cristo. Ademais, se sucede que o homem injuriado que ambiciona vingança fira
mortalmente a seu inimigo, e o mate, é ele ignominiosamente executado por
assassinato, e toda a sua propriedade é confiscada pelo Estado, ou, ao menos, é
forçado ao exílio, e tanto ele como sua família viverão uma existência
miserável. Assim é como o diabo joga e como se ri daqueles que escolhem antes
se aprisionar com as ataduras da falsa honra, que se fazerem servos e amigos de
Cristo, o melhor dos Reis, e serem reconhecidos como herdeiros de reino mais
vasto e mais durável. Por isso, posto que o homem insensato, apesar do
mandamento de Cristo, se nega a reconciliar-se com seus inimigos, e se expõe ao
desastre total, todos os que são sábios escutarão a doutrina que Cristo, o
Senhor de tudo, nos ensinou no Evangelho com suas palavras, e na Cruz com suas
obras.
são
roberto belarmino
(Tradução:
Permanência, revisão ama).
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Notas:
13.
Rm 3,8.
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