15/04/2013

Tratado dos actos humanos 91


Questão 20: Da bondade e da malícia dos actos humanos exteriores.



Art. 6 ― Se um mesmo acto pode ser bom e mau.

(II Sent., dist. XL, a . 4).

O sexto discute-se assim. ― Parece que um mesmo acto pode ser bom e mau.



1. ― Pois, é uno o movimento contínuo, como diz Aristóteles 1. Ora, o mesmo movimento contínuo pode ser bom e mau, p. ex., se alguém vai à igreja continuamente, antes por vanglória, que para servir a Deus. Logo, o mesmo acto pode ser bom e mau.

2. Demais. ― Segundo o Filósofo, acção e paixão constituem um mesmo acto 2. Ora aquela pode ser boa, como a de Cristo, e esta, má, como a dos Judeus. Logo, um mesmo acto pode se bom e mau.

3. Demais. ― Sendo o servo quase instrumento do senhor, o acto daquele é acto deste, como o acto do instrumento o é do artífice. Ora, pode dar-se que a acção do servo seja boa, por proceder da vontade boa do senhor, e má, por proceder da sua vontade má. Logo, o mesmo acto pode ser bom e mau.

Mas, em contrário. ― Os contrários não podem coexistir no mesmo sujeito. Ora, o bem e o mal são contrários, Logo, um mesmo acto não pode ser bom e mau.

Nada impede seja uma realidade una, pertencendo a um género, e múltipla, pertencendo a outro, assim, a superfície contínua é una, considerada no género da quantidade, sendo contudo múltipla, considerada no género da cor, se, em parte, for branca e, em parte, negra. E deste modo, nada impede seja um acto uno, referido ao género da natureza, e não o seja, referido ao género da moralidade, e inversamente, como já se disse 3. Assim, o andar contínuo, acto uno no género da natureza, pode vir a ser múltiplo, no da moralidade, mudada que seja à vontade de quem anda, a qual é o princípio dos actos morais. ― Donde, considerado no género da moralidade, é impossível o mesmo acto ser moralmente bom e mau, pode sê-lo entretanto, se tiver a unidade da natureza e não, a da moralidade.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. ― O movimento contínuo procedente de intenções diversas, embora naturalmente uno, não o é moralmente.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― Acção e paixão pertencem ao género da moralidade, na medida em que são voluntárias. Donde, segundo a diversidade das vontades que os inspiram, constituem moralmente dois actos e, portanto, um pode ser bom e o outro, mau.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― O acto do servo, enquanto procedente da sua vontade, não é acto do senhor, mas só quando procede da ordem deste, e assim, a má vontade do servo não torna mau o acto do senhor.
Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.

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Notas:
1. V Phys., lect. VII.
2. III Phys., lect. IV.
3. Q. 20, a. 3 ad 1, q. 18 a. 7 ad 1.

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