22/01/2013

Tratado dos actos humanos 10


Questão 7: Das circunstâncias dos actos humanos.


Em seguida devemos tratar das circunstâncias dos actos humanos.

E sobre esta Questão quatro artigos se discutem:

Art. 1 ― Se a circunstância é acidente do acto humano.
Art. 2 ― Se as circunstâncias dos actos humanos devem ser consideradas pelo teólogo.
Art. 3 ― Se as circunstâncias estão convenientemente enumeradas no terceiro livro das Éticas de Aristóteles.
Art. 4 ― Se são circunstâncias principais a causa por que se age e o em que se realiza a operação.


Art. 1 ― Se a circunstância é acidente do acto humano.

(Infra. q. 18, a . 3, IV Sent., dist. XVI, q. a . 1, q ª 1).

O primeiro discute-se assim. ― Parece que a circunstância não é um acidente do acto humano.

1. ― Pois, como diz Túlio, é pela circunstância que a oração dá autoridade e firmeza à argumentação 1. Ora, a oração dá firmeza à argumentação, sobretudo pelo que é substancial, como a definição, o género, a espécie e coisas semelhantes, com as quais, ensina ainda Túlio 2, o orador deve argumentar. Logo, a circunstância não é acidente do acto humano.

2. Demais. ― É próprio do acidente existir no ser. Ora, tal não se dá como o que circunsta, que é antes exterior. Logo, as circunstâncias não são acidentes dos actos humanos.

3. Demais. ― Não há acidente de acidente. Ora, os actos humanos já são acidentes. Logo, as circunstâncias não são acidentes dos actos.

Mas, em contrário. ― As condições particulares de uma coisa singular chamam-se acidentes, que a individuam. Ora, o Filósofo diz que as circunstâncias são particulares 3, i. é, condições particulares dos actos singulares. Logo, elas são acidentes individuais dos actos humanos.

Sendo os nomes, segundo o Filósofo 4, sinais das coisas inteligidas, necessariamente, o processo de denominar há-de ser correlativo ao do conhecimento intelectivo. Ora, o nosso conhecimento intelectual procede do mais para o menos conhecido, e por isso aplicamos os nomes das coisas mais conhecidas a significarem as menos conhecidas. Donde vem que, como diz Aristóteles 5, das coisas situadas num lugar derivou o nome de distância para todos os contrários, e semelhantemente, usamos dos nomes relativos ao movimento local para significar outros movimentos, porque os corpos, circunscritos pelo lugar são os que mais conhecemos. Donde resulta ter-se derivado o nome de circunstância, das coisas situadas num lugar, para os actos humanos.

Ora, diz-se que circunstância, localmente, o que embora extrínseco a uma coisa, com ela tem contacto ou dela se aproxima, localmente. Donde, todas as condições exteriores à substância do acto e que, contudo, respeitam de algum modo o acto humano, chamam-se circunstâncias. Ora, o que é exterior à substância de uma coisa, mas que pertence à própria coisa, chama-se acidente. Donde, se denominarem acidentes dos actos humanos, as circunstâncias.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — A oração dá, certamente, firmeza à argumentação, primeiro, pela substância do acto, e secundariamente, pelas circunstâncias dele. Assim, primeiro, torna-se acusável quem perpetrou um homicídio, secundariamente, porque o perpetrou com dolo, com fito de lucro, em tempo ou lugar sagrado, ou de modos semelhantes. E por isso diz Túlio, significativamente, que pela circunstância e como secundariamente, a oração acrescenta a firmeza à argumentação.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― De modo duplo se atribui o acidente a um ser. Porque neste existe como quando se diz que branco é acidente de Sócrates. Ou porque existem ambos, simultaneamente, no mesmo sujeito, assim, considera-se o branco como acidental ao músico, por convirem ambos e de certa maneira se tocarem, num mesmo sujeito. E deste modo é que as circunstancias se chamam acidentes dos actos.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― Como já se disse, considera-se um acidente como pertencente a outro, pela conveniência de ambos, num mesmo sujeito, o que se pode dar de dois modos. Ou por se fundarem eles nesse sujeito, sem nenhuma ordem ― assim branco e músico, em Sócrates ― ou, numa certa ordem, como quando o sujeito recebe um acidente mediante outro — assim, o corpo recebe a cor, mediante a superfície. Ora, de ambos modos, as circunstâncias se referem aos actos. Pois, umas, ordenadas para o acto, dizem respeito ao agente, sem mediação de nenhum outro acto, p. ex., o lugar e a condição da pessoa. Outras porem mediante o próprio acto, assim, o modo de agir.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por AMA.
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Notas:
1. Rhetoricis, lib. 1.
2. In topicis ad Trebat.
3. III Ethic, lect. IV.
4. Lib. I Perith., lect. II.
5. X Metaphys., lect. V.

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