Questão 118: Da geração da
alma humana.
Art. 2 — Se a alma
intelectiva é causada pelo sémen.
(Supra. q. 90, a. 2, II Sent.,
dist. XVIII, q. 2, a. I, II Cont. Gent., cap. LXXXVI, LXXXVIII, LXXXIX, De
Pot., q. 3, a. 9, Quodl. XI, q. 5, ad I, 4, XII, q. 7, a . 2, Compend. Theol.,
cap. XCIII,
Ad Rom., cap. V. Iect. III).
O
segundo discute-se assim. — Parece que a alma intelectiva é causada pelo sémen.
1. — Pois, diz a Escritura: Todas as pessoas que tinham saído da coxa de Jacob eram ao todo sessenta e seis. Ora tudo o que é gerado do homem o é pelo sémen. Logo, também a alma intelectiva.
2.
Demais. — Como já se demonstrou, o homem tem uma mesma alma substancial
intelectiva, sensitiva e nutritiva. Ora, a alma sensitiva do homem, bem como a
dos animais, é gerada do sémen, donde, diz o Filósofo, que o animal não é feito
simultaneamente com o homem, mas antes, é feito o animal, com alma sensitiva.
Logo, também a alma intelectiva é causada pelo sémen.
3.
Demais. — É de um e mesmo agente a acção que termina na forma e na matéria, do
contrário a matéria e a forma não constituiriam, em si, uma unidade. Ora, a
alma intelectiva é forma do corpo humano, constituído por virtude do sémen.
Logo, também a alma intelectiva é causada por essa mesma virtude.
4.
Demais. — O homem gera o seu especificamente semelhante. Ora, a espécie humana
é constituída pela alma racional. Logo, esta provém do gerador.
5.
Demais. — É inadmissível dizer que Deus coopera com os pecadores. Ora, se as almas
racionais fossem criadas por Deus, ele às vezes cooperaria com os adúlteros,
cujo coito ilícito pode ser fecundo. Logo, as almas racionais não são criadas
por Deus.
Mas,
em contrário, diz um autor: as almas racionais não são geradas pelo coito.
É impossível a virtude activa, existente na matéria, estender a sua acção até
a produção de um efeito imaterial. Ora, é manifesto que o princípio intelectivo
do homem, transcende a matéria, pois, tem uma operação sem nada de comum com o
corpo. E portanto, é impossível que a virtude do sémen produza esse princípio.
Também, semelhantemente, porque a dita virtude age pela alma do gerador, a qual
é um acto do corpo, que usa deste, para operar. Ora, pela operação do
intelecto, a alma nada tem de comum com o corpo. Por onde, a virtude do
princípio intelectivo, como tal, não pode provir do sémen. E por isso, diz o
Filósofo: Conclui-se que o intelecto só pode vir de fora. E semelhante mente, a
alma intelectiva, cuja operação vital é independente do corpo, é subsistente,
como já se estabeleceu, e portanto, deve ter existência e ser feita. Mas, como
é uma substância imaterial, não pode ser causada por geração, mas só por
criação de Deus. Ensinar, pois, que a alma intelectiva é gerada, é considerá-la
não subsistente, e por consequência, como havendo de corromper-se com o corpo.
Por onde, é herético dizer que a alma intelectiva é gerada do sémen.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — O passo citado emprega, por sinédoque, a
parte pelo todo, i. é, a alma, por todo o homem.
RESPOSTA
À SEGUNDA. — Alguns disseram, que as operações vitais, do embrião não provêm da
alma deste, mas da alma da mãe, ou da virtude do sémen. — Mas, é tudo falso.
Pois, as operações vitais, como sentir, nutrir-se e crescer, não podem provir
de princípio extrínseco. Por onde, deve-se dizer, que a alma preexiste no
embrião, sendo, a princípio, nutritiva, depois, sensitiva e, enfim, intelectiva.
Dizem
porém alguns, que à alma vegetativa, existente a princípio, sobrevém a sensitiva,
a esta, a intelectiva. E assim, há no homem três almas, sendo uma potencial em
relação à outra. — O que já se refutou antes.
Por
onde, dizem outros, que a mesma alma, a princípio somente vegetativa, em
seguida, por acção da virtude do sémen, transforma-se em sensitiva, e por fim,
transforma-se em intelectiva, não por virtude activa do sémen, mas pela de um
agente superior, Deus, que ilumina de fora. Sendo por isso que o Filósofo diz
que o intelecto vem de fora. — Mas esta opinião pode subsistir. — Porque
nenhuma forma substancial é susceptível de aumento nem de diminuição, mas a
super-adição de uma perfeição maior produz outra espécie, assim como adição da
unidade causa outra espécie numérica. Ora, não é possível que uma mesma forma
pertença a diversas espécies. — Segundo, porque havia de se seguir que a
geração do animal é um movimento contínuo, procedendo, paulatinamente, do
imperfeito para o perfeito, como acontece na alteração. — Terceiro, porque resultaria
que a geração do homem ou do animal não é em si geração, por ser o sujeito dela
um ser actual. Se, pois, desde o princípio há na matéria da geração uma alma
vegetal, que depois é paulatinamente levada até à perfeição, haverá sempre a
adição de uma perfeição superveniente, sem corrupção da precedente, o que vai
contra a essência da geração, em si mesma. — Quarto, porque o causado pela acção
de Deus é algo de subsistente — e então, há-de ser diferente, necessária e
essencialmente, da forma preexistente, que não era subsistente, voltando, por consequência,
a opinião dos que admitem várias almas no corpo, ou não é nada de subsistente,
mas uma perfeição da alma pre-existente — e então, necessariamente se segue que
a alma intelectiva há de corromper-se uma vez corrupto o corpo, o que é
impossível.
Há
ainda outra opinião: a daqueles que dizem que todos têm um só intelecto. E esta
já foi refutada antes.
Por
onde, deve dizer-se que, sendo a geração de um ser a corrupção de outro,
necessário é admitir que, tanto no homem como nos animais, advindo uma mais
perfeita forma, corrompe-se a anterior, de modo que a forma consequente tem
tudo o que tinha a antecedente, e ainda mais. E assim, depois de muitas gerações
e corrupções, é que vem a existir a última forma substancial, tanto no homem
como nos animais. O que aparece sensivelmente nos animais gerados da putrefacção.
Por onde, deve dizer-se que a alma intelectiva é criada por Deus, no último
termo da geração humana, e é simultaneamente sensitiva e nutritiva, uma vez corruptas
as formas preexistentes.
RESPOSTA
À TERCEIRA. — A OBJECÇÃO colhe relativamente aos diversos agentes não ordenados
entre si. Mas se forem muitos os agentes ordenados, nada impede que a virtude
do agente superior alcance até a última forma, alcançando as virtudes dos
agentes inferiores só alguma disposição da matéria. Assim, ao passo que a virtude
do sémen dispõe a matéria, a da alma dá a forma, na geração do animal. Ora, é
manifesto, pelo que já ficou estabelecido, que toda a natureza corpórea age
como instrumento da virtude espiritual, e sobretudo de Deus. Por onde, nada
impede que a formação corpo resulte de alguma virtude corpórea, sendo a alma
intelectiva produzida só por Deus.
RESPOSTA
À QUARTA. — O homem gera o seu semelhante, dispondo, pela virtude do seu sémen,
a matéria, a receber tal forma determinada.
RESPOSTA
À QUINTA. — Na acção dos adúlteros, com o que é da natureza, e portanto bom,
Deus coopera. Com o que porém é proveniente da volúpia desordenada, e portanto
mau, Deus não coopera.
Nota:
Revisão da tradução portuguesa por ama.
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