18/11/2012

Tratado sobre a conservação e o governo das coisas 57



Questão 115: Da acção da criatura corpórea.


Art. 3 — Se os corpos celestes são a causa do que é feito neste mundo, nos corpos inferiores.



(II Sent., dist. XV, q. 1, a. 2, III Cont. Gent., cap. LXXXII, De Verit., q. 5, a. 9, Compend. Theol., cap. CXXVII).

O terceiro discute-se assim. — Parece que os corpos celestes não são a causa do que é feito, neste mundo, nos corpos inferiores.


1. Pois, diz Damasceno: Nós porém dizemos que eles, ou seja, os corpos celestes, não são a causa de nada que é feito, nem da corrupção do que se corrompe, são porém, sobretudo, os sinais das chuvas e da transmutação do ar.

2. Demais. — O agente e a matéria bastam para produzir uma coisa. Ora, há nos corpos inferiores deste mundo a matéria paciente e também agentes contrários, como o calor, o frio e outros semelhantes. Logo, não é necessário, atribuir a causalidade do que é feito, nas coisas inferiores sobreditas, aos corpos celestes.

3. Demais. — O agente age semelhantemente a si. Ora, vemos que tudo, neste mundo é causado pelo calor e pelo frio, pela humidade e pela secura, e alterações qualitativas semelhantes, que não se dão nos corpos celestes. Logo, estes não são a causa do que é feito nas coisas deste mundo.

4. Demais. — Como diz Agostinho, nada é mais corpóreo do que o sexo. Ora, o sexo não é causado pelos corpos celestes, e a prova é que, de dois gêmeos, nascidos sob a mesma constelação, um é masculino e outro, feminino. Logo, os corpos celestes não são causa das coisas corpóreas realizadas neste mundo.

Mas, em contrário, diz Agostinho: os corpos mais grosseiros e inferiores são regidos, numa certa ordem, pelos mais subtis e poderosos. E Dionísio diz: a luz do sol contribui para a geração dos corpos sensíveis, gera a própria vida, nutre, faz crescer e leva ao termo.

Considerando que toda multidão procede da unidade, que o imóvel se conserva do mesmo modo, e o movido tem aspectos multiformes, deve concluir-se que em toda a natureza, qualquer movimento procede do que é imóvel. Por onde, quanto mais um ser é imóvel, tanto mais é causa do que é móvel. Ora, os corpos celestes são os mais imóveis de todos os corpos, pois só têm movimento local. E portanto os movimentos vários e multiformes dos corpos inferiores deste mundo dependem do movimento dos corpos celestes, como de causa.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — O dito de Damasceno deve entender-se como exprimindo que os corpos celestes não são a causa primeira da geração e da corrupção das coisas, que se operam neste mundo, como dizem os que os consideram como deuses.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Como princípios activos, os corpos inferiores deste mundo têm só as qualidades activas dos elementos, a saber, o calor, o frio e outros. E se as formas substanciais dos corpos inferiores só se diversificassem por esses acidentes, cujos princípios os antigos fisiólogos diziam ser a rarefacção e a condensação, não seria necessária a existência de nenhum princípio activo superior a esses corpos, mas eles agiriam por si mesmos. Os que pensarem bem, pois, concordarão que esses acidentes comportam-se como disposições materiais para as formas substanciais dos corpos naturais. Ora, a matéria não podendo agir por si mesma, é necessário admitir-se algum princípio activo superior a essas disposições materiais. Daí o terem os Platónicos admitido as espécies separadas, pela participação das quais os corpos inferiores alcançam as suas formas substanciais. Estas porém não bastam, porque, tais espécies sendo consideradas como imóveis, daí resultaria que os corpos inferiores não teriam nenhuma variação, quanto à geração e à corrupção, o que é falso. Por onde, segundo o Filósofo, necessário é admitir-se algum princípio activo móvel, causa, pela sua presença e ausência, da variedade dos corpos inferiores, quanto à geração e à corrupção, e tais são os corpos celestes. E por isso, tudo o que, nos corpos inferiores deste mundo, gera e especifica, é como que instrumento do corpo celeste, o que permite dizer que o homem e o sol geram o homem.

RESPOSTA À TERCEIRA. — Os corpos celestes não são semelhantes aos corpos inferiores, por semelhança específica, mas porque contêm em sua virtude universal tudo o que nos inferiores é gerado. E desse modo dizemos também que todas as coisas são semelhantes a Deus.

RESPOSTA À QUARTA. — As acções dos corpos celestes são recebidas diversamente pelos corpos inferiores, conforme à disposição diversa da matéria deles. Assim, acontece às vezes que a matéria da concepção humana não está totalmente disposta para o sexo masculino e, por isso forma em parte· o masculino e em parte o feminino. E disto se serve Agostinho para repelir a adivinhação por meio dos astros, porque os efeitos destes variam, mesmo em relação às coisas corpóreas, segundo as disposições diversas da matéria.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama

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