Não abandones a tua leitura espiritual.
A leitura tem feito muitos santos.
(S. josemaria, Caminho 116)
Está aconselhada a leitura espiritual diária de mais ou menos 15 minutos. Além da leitura do novo testamento, (seguiu-se o esquema usado por P. M. Martinez em “NOVO TESTAMENTO” Editorial A. O. - Braga) devem usar-se textos devidamente aprovados. Não deve ser leitura apressada, para “cumprir horário”, mas com vagar, meditando, para que o que lemos seja alimento para a nossa alma.
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Evangelho: Jo 4, 1-18
1 Quando Jesus soube que os fariseus
tinham ouvido que Ele fazia mais discípulos e baptizava mais que João, 2
(todavia, não era Jesus que baptizava mas os Seus discípulos), 3
deixou a Judeia e foi outra vez para a Galileia. 4 Devia, por isso,
passar pela Samaria. 5 Chegou, pois, a uma cidade da Samaria chamada
Sicar, junto da herdade que Jacob deu a seu filho José. 6 Estava lá
o poço de Jacob. Fatigado da viagem, Jesus sentou-Se sobre a borda do poço. Era
quase a hora sexta. 7 Veio uma mulher da Samaria tirar água. Jesus
disse-lhe: «Dá-Me de beber». 8 Os Seus discípulos tinham ido à
cidade comprar mantimentos. 9 Disse-Lhe, então, a mulher: «Como,
sendo Tu judeu, me pedes de beber a mim, que sou samaritana?». Com efeito, os
judeus não se dão com os samaritanos. 10 Jesus respondeu: «Se tu
conhecesses o dom de Deus, e Quem é que te diz: “Dá-Me de beber”, certamente
Lhe pedirias e Ele te daria de uma água viva». 11 A mulher
disse-Lhe: «Senhor, Tu não tens com que a tirar e o poço é fundo; donde tens,
pois, essa água viva? 12 És Tu, porventura, maior do que o nosso pai
Jacob que nos deu este poço, do qual ele mesmo bebeu, e os seus filhos e os
seus gados?». 13 Jesus respondeu: «Todo aquele que bebe desta água
tornará a ter sede, 14 mas aquele que beber da água que Eu lhe der,
jamais terá sede: a água que Eu lhe der virá a ser nele uma fonte de água que
jorra para a vida eterna». 15 A mulher disse-Lhe: «Senhor, dá-me
dessa água, para eu não ter mais sede, nem ter de vir aqui tirá-la». 16
Jesus disse-lhe: «Vai, chama o teu marido e vem cá». 17 A mulher
respondeu-Lhe: «Não tenho marido». Jesus replicou: «Disseste bem: não tenho
marido; 18 porque tiveste cinco maridos e o que agora tens, não é o
teu marido; isto disseste com verdade».
CARTA
ENCÍCLICA
PACEM IN TERRIS
DO
SUMO PONTÍFICE PAPA JOÃO XXIII
AOS
VENERÁVEIS IRMÃOS PATRIARCAS, PRIMAZES,
ARCEBISPOS,
BISPOS E OUTROS ORDINÁRIOS DO LUGAR
EM
PAZ E COMUNHÃO COM A SÉ APOSTÓLICA
AO
CLERO E FIÉIS DE TODO O ORBE,
BEM
COMO A TODAS AS PESSOAS DE BOA VONTADE
A
PAZ DE TODOS OS POVOS NA BASE DA VERDADE,
JUSTIÇA,
CARIDADE E LIBERDADE
IVª
PARTE
RELAÇÕES
ENTRE OS SERES HUMANOS
E
AS COMUNIDADES POLÍTICAS COM A COMUNIDADE MUNDIAL
…/5
Deficiência da actual organização
da autoridade pública em relação ao bem comum universal
131.
A unidade universal do convívio humano é um fato perene. É que o convívio
humano tem por membros seres humanos que são todos iguais por dignidade
natural. Por conseguinte, é também perene a exigência natural de realização, em
grau suficiente, do bem comum universal, isto é, do bem comum de toda a família
humana.
132.
Outrora podia pensar-se com razão que os poderes públicos das diferentes
comunidades políticas estavam em condições de obter o bem comum universal, quer
através das vias diplomáticas normais, quer mediante encontros e conferências
de cúpula, com o emprego de instrumentos jurídicos tais como as convenções e
tratados, instrumentos jurídicos esses sugeridos pelo direito natural, pelo direito
das gentes e pelo direito internacional.
133.
Hoje em dia, como consequência das profundas transformações que se verificaram
nas relações da convivência humana o bem comum universal suscita problemas
complexos, muito graves, extremamente urgentes, sobretudo em matéria de
segurança e paz mundial. Ao mesmo tempo os poderes públicos de cada comunidade
política, postos como estão em pé de igualdade jurídica entre si, mesmo que
multipliquem conferências e afinem o próprio engenho para a elaboração de novos
instrumentos jurídicos, não estão mais em condições de enfrentar e resolver
adequadamente estes problemas, não por falta de vontade ou de iniciativa, mas
por motivo de uma deficiência estrutural, por uma carência de autoridade.
134.
Pode, portanto, afirmar-se que na presente conjuntura histórica não se verifica
uma correspondência satisfatória entre a estrutura política dos Estados com o
respectivo funcionamento da autoridade pública no plano mundial, e as
exigências objectivas do bem comum universal.
Relação entre o conteúdo
histórico do bem comum e a configuração e funcionamento dos poderes públicos
135.
Existe evidentemente uma relação intrínseca entre o conteúdo histórico do bem
comum e a configuração e funcionamento dos poderes públicos. Porquanto, assim
como a ordem moral requer uma autoridade pública para a obtenção do bem comum
na convivência humana, postula também, consequentemente, que esta autoridade
seja capaz de conseguir o fim proposto. Comporta isto que os órgãos em que a
autoridade se encarna, opera e demanda o seu fim, sejam estruturados e actuem
de tal modo que possam adequadamente traduzir em realidade os conteúdos novos
que o bem comum venha assumindo na evolução histórica.
136.
O bem comum universal levanta hoje problemas de dimensão mundial que não podem
ser enfrentados e resolvidos adequadamente senão por poderes públicos que
possuam autoridade, estruturas e meios de idênticas proporções, isto é, de
poderes públicos que estejam em condições de agir de modo eficiente no plano
mundial. Portanto, é a própria ordem moral que exige a instituição de alguma
autoridade pública universal.
Poderes públicos
instituídos de comum acordo e não impostos pela força
137.
Esses poderes públicos dotados de autoridade no plano mundial e de meios idóneos
para alcançar com eficácia os objectivos que constituem os conteúdos concretos
do bem comum universal, devem ser instituídos de comum acordo entre todos os
povos e não com a imposição pela força. É que tais poderes devem estar em
condições de operar eficazmente e, portanto, a sua atuação deve inspirar-se de
equitativa e efectiva imparcialidade, tendente à concretização das exigências
objectivas do bem comum universal. De contrário dever-se-ia temer que poderes
públicos supra-nacionais ou mundiais, impostos à força pelas comunidades
políticas mais poderosas, se tornassem instrumentos de interesses
particularistas. Mesmo que tal não se verificasse, seria muito difícil evitar,
nesta hipótese, qualquer suspeita de parcialidade, o que comprometeria a
eficácia da sua acção. Embora as nações muito se diferenciem pelo grau de desenvolvimento
económico e pelo poderio militar, são todavia muito ciosas em resguardar a
igualdade jurídica e a própria dignidade moral. Por este motivo, com razão, não
se dobram a uma autoridade que lhes é imposta à força ou para cuja instituição
não contribuíram ou a que não aderiram espontaneamente.
O bem comum universal e os
direitos da pessoa humana
138.
Como o bem comum de cada comunidade política assim também o bem comum universal
não pode ser determinado senão tendo em conta a pessoa humana. Por isso, com
maior razão, os poderes públicos da comunidade mundial devem considerar objectivo
fundamental o reconhecimento, o respeito, a tutela e a promoção dos diretos da
pessoa humana, com acção directa, quando for o caso, ou criando, no plano
mundial, condições em que se torne mais viável aos poderes públicos de cada
comunidade política exercer as próprias funções específicas.
Princípio de
subsidiariedade
139.
Como as relações entre os indivíduos, famílias, organizações intermédias e os
poderes públicos das respectivas comunidades políticas devem estar reguladas e
moderadas, no plano nacional, segundo o princípio de subsidiariedade, assim
também, à luz do mesmo princípio, devem disciplinar-se as relações dos poderes
públicos de cada comunidade política com os poderes públicos da comunidade
mundial. Isto significa que os problemas de conteúdo económico, social,
político ou cultural, a serem enfrentados e resolvidos pelos poderes públicos
da comunidade mundial hão-de ser da alçada do bem comum universal, isto é serão
problemas que pela sua amplidão, complexidade e urgência os poderes públicos de
cada comunidade política não estejam em condições de afrontar com esperança de
solução positiva.
140.
Os poderes públicos da comunidade mundial não têm como fim limitar a esfera de acção
dos poderes públicos de cada comunidade política e nem sequer de substituir-se
a eles. Ao invés, devem procurar contribuir para a criação, em plano mundial,
de um ambiente em que tanto os poderes públicos de cada comunidade política,
como os respectivos cidadãos e grupos intermédios, com maior segurança, possam
desempenhar as próprias funções, cumprir os seus deveres e fazer valer os seus
direitos. [1]
Sinais dos tempos
141.
Como todos sabem, a 26 de Junho de 1945, foi constituída a Organização das
Nações Unidas (ONU). A ela se juntaram depois organizações de âmbito
especializado, compostas de membros nomeados pela autoridade pública das
diversas nações. A estas instituições estão confiadas atribuições
internacionais de grande importância no campo económico, social, cultural,
educacional e sanitário. As Nações Unidas propuseram-se como fim primordial
manter e consolidar a paz entre os povos, desenvolvendo entre si relações amistosas,
fundadas nos princípios de igualdade, de respeito mútuo, de cooperação
multiforme em todos os sectores da actividade humana.
142.
Um acto de altíssima relevância efectuado pelas Nações Unidas foi a Declaração
Universal dos Direitos do Homem, aprovada em assembleia geral, a 10 de Dezembro
de 1948. No preâmbulo desta Declaração proclama-se, como ideal a ser demandado
por todos os povos e por todas as nações, o efectivo reconhecimento e salvaguarda
daqueles direitos e das respectivas liberdades.
143.
Contra alguns pontos particulares da Declaração foram feitas objeções e
reservas fundadas. Não há dúvida, porém, que o documento assinala um passo
importante no caminho para a organização jurídico-política da comunidade
mundial. De facto, na forma mais solene, nele se reconhece a dignidade de
pessoa a todos os seres humanos, proclama-se como direito fundamental da pessoa
o de mover-se livremente na procura da verdade, na realização do bem moral e da
justiça, o direito a uma vida digna, e defendem-se outros direitos conexos com
estes.
144.
Fazemos, pois, ardentes votos que a Organização das Nações Unidas, nas suas
estruturas e meios, se conforme cada vez mais à vastidão e nobreza de suas finalidades,
e chegue o dia em que cada ser humano encontre nela uma protecção eficaz dos
direitos que promanam imediatamente de sua dignidade de pessoa e que são, por
isso mesmo, direitos universais, invioláveis, inalienáveis. Tanto mais que
hoje, participando as pessoas cada vez mais activamente na vida pública das
próprias comunidades políticas, denotam um interesse crescente pelas
vicissitudes de todos os povos e maior consciência de serem membros vivos de
uma comunidade mundial.
Vª
PARTE
DIRETRIZES
PASTORAIS
Dever de participação na
vida pública
145.
Ainda uma vez exortamos nossos filhos ao dever de participarem activamente da
vida pública e de contribuírem para a obtenção do bem comum de todo o género
humano e da própria comunidade política, e de esforçarem-se portanto, à luz da
fé cristã e com a força do amor, para que as instituições de finalidade económica,
social, cultural e política sejam tais que não criem obstáculos, mas antes
facilitem às pessoas o próprio melhoramento, tanto na vida natural como na
sobrenatural.
Competência científica,
capacidade técnica, perícia profissional
146.
Para impregnarem uma civilização de normas rectas e princípios cristãos, não
basta gozar da luz da fé e arder no desejo do bem. É necessário para tanto inserir-se
nas suas instituições e trabalhá-las eficientemente por dentro.
147.
A cultura actual salienta-se sobretudo por sua índole científica e técnica.
Assim ninguém pode penetrar nas suas instituições se não for cientificamente
competente, tecnicamente capaz, profissionalmente perito.
A acção, como síntese dos
elementos científico-técnico-profissionais e dos valores espirituais
148.
Entretanto, não se julgue que a competência científica, a capacidade técnica e
a experiência profissional bastam para tornar as relações de convivência
genuinamente humanas, isto é, fundadas na verdade, comedidas na justiça,
corroboradas no mútuo amor, realizadas na liberdade.
149.
Para tanto requer-se, sim, que as pessoas desempenhem as suas actividades de
cunho temporal obedecendo às leis imanentes a essas actividades e seguindo
métodos correspondentes à sua natureza. Mas requer-se, ao mesmo tempo, que
desempenhem essas actividades no âmbito da ordem moral, como exercício de um
direito e cumprimento de um dever, como resposta positiva a um mandamento de
Deus, colaboração à sua acção salvífica, e contribuição pessoal à realização de
seus desígnios providenciais na história. Numa palavra, requer-se que as
pessoas vivam, no próprio íntimo, o seu agir de cunho temporal como uma síntese
dos elementos científico-técnico-profissionais e dos valores espirituais.
Harmonização nos cristãos
entre a fé religiosa e a atividade temporal
150.
Nos países de tradição cristã florescem hoje, com o progresso
técnico-científico, as instituições de ordem temporal e revelam-se altamente
eficientes na consecução dos respectivos fins. Entretanto, carecem não raro de fundamentação
e inspiração cristã.
151.
Por outro lado, na criação dessas instituições contribuíram não pouco e
continuam a contribuir pessoas que têm o nome de cristãos, que, pelo menos em
parte, ajustam a sua vida às normas evangélicas. Como se explica tal fenómeno?
Cremos que a explicação está na ruptura entre a fé e a actividade temporal. É,
portanto, necessário que se restaure neles a unidade interior, e que na sua actividade
humana domine a luz orientadora da fé e a força vivificante do amor.
Desenvolvimento integral
dos seres humanos em formação
152.
Julgamos também que nos cristãos a ruptura entre fé religiosa e acção temporal
resulta, pelo menos em parte, da falta de uma sólida formação cristã. Acontece
de facto, demasiadas vezes, em muitos ambientes que não haja proporção entre a
instrução científica e a instrução religiosa: a científica estende-se até aos
graus superiores do ensino, enquanto a religiosa permanece em grau elementar.
Torna-se indispensável, pois, que a educação da mocidade seja integral e ininterrupta,
que o conhecimento da religião e a formação do critério moral progridam
gradualmente com a assimilação contínua e cada vez mais rica de elementos
técnico-científicos. É ainda indispensável que se proporcione aos jovens
adequada iniciação no desempenho concreto da própria actividade profissional. [2]
Empenho constante
153.
Será oportuno lembrar como é difícil captar com suficiente objectividade a
correspondência entre as situações concretas e as exigências da justiça,
indicando claramente os graus e formas segundo os quais os princípios e as
diretrizes doutrinais devem traduzir-se na presente realidade social.
154.
Essa identificação de graus e formas torna-se mais difícil nesta nossa época,
caracterizada por acentuado dinamismo; época, aliás, que de cada um reclama uma
parcela de contribuição para o bem comum universal. Daí, não ser, jamais
definitiva, a solução do problema da adaptação da realidade social às
exigências objectivas da justiça. Os nossos filhos devem, pois, prestar atenção
de não se deixarem ficar na satisfação de resultados já obtidos.
155.
Para todos os seres humanos constitui quase um dever pensar que o que já se tiver
realizado é sempre pouco, em comparação com o que resta por fazer, a fim de
reajustar os organismos produtivos, as associações sindicais, as organizações
profissionais, os sistemas previdenciais, as instituições jurídicas, os regimes
políticos, as organizações culturais, sanitárias, desportivas etc., às
dimensões próprias da era do átomo e das conquistas espaciais: era, na qual a
humanidade, já entrou encetando esta sua nova jornada com perspectivas de
infinda amplidão.
Relações dos católicos com
os não-católicos no campo económico-social político
156.
As linhas doutrinais aqui traçadas brotam da própria natureza das coisas e, as
mais das vezes, pertencem à esfera do direito natural. A aplicação delas
oferece, por conseguinte, aos católicos vasto campo de colaboração tanto com
cristãos separados desta sé apostólica, como com pessoas sem nenhuma fé cristã,
nas quais, no entanto, está presente a luz da razão e operante a honradez
natural. "Em tais circunstâncias, procedam com atenção os católicos, de
modo a serem coerentes consigo mesmos e não descerem a compromissos em matéria
de religião e de moral. Mas, ao mesmo tempo, mostrem espírito de compreensão
desinteresse e disposição a colaborar lealmente na consecução de objectivos
bons por natureza, ou que, pelo menos, se possam encaminhar para o bem". [3]
157.
Não se deverá jamais confundir o erro com a pessoa que erra, embora se trate de
erro ou inadequado conhecimento em matéria religiosa ou moral. A pessoa que
erra não deixa de ser uma pessoa, nem perde nunca a dignidade do ser humano, e
portanto merece sempre estima. Ademais, nunca se extingue na pessoa humana a
capacidade natural de abandonar o erro e abrir-se ao conhecimento da verdade.
Nem lhe faltam nunca neste intuito os auxílios da divina Providência. Quem, num
certo momento de sua vida, se encontre privado da luz da fé ou tenha aderido a
opiniões erróneas, pode, depois de iluminado pela luz divina, abraçar a
verdade. Os encontros em vários sectores de ordem temporal entre católicos e
pessoas que não têm fé em Cristo ou a têm de modo erróneo, podem ser para estes
ocasião ou estímulo para chegarem à verdade.
158.
Além disso, cumpre não identificar falsas ideias filosóficas sobre a natureza,
a origem e o fim do universo e do homem com movimentos históricos de finalidade
económica, social, cultural ou política, embora tais movimentos encontrem
nessas ideias filosóficas a sua origem e inspiração. A doutrina, uma vez
formulada, é aquilo que é, mas um movimento, mergulhado como está em situações
históricas em contínuo devir, não pode deixar de lhes sofrer o influxo e, portanto,
é susceptível de alterações profundas. De resto, quem ousará negar que nesses
movimentos, na medida em que concordam com as normas da recta razão e
interpretam as justas aspirações humanas, não possa haver elementos positivos
dignos de aprovação?
159.
Pode, por conseguinte, acontecer que encontros de ordem prática, considerados
até agora inúteis para ambos os lados, sejam hoje ou possam vir a ser amanhã,
verdadeiramente frutuosos. Decidir se já chegou tal momento ou não, e
estabelecer em que modos e graus se hão-de conjugar esforços na demanda de objectivos
económicos, sociais, culturais, políticos, que se revelem desejáveis e úteis
para o bem comum, são problemas que só a virtude da prudência, moderadora de
todas as virtudes que regem a vida individual e social pode resolver. No que se
refere aos católicos, compete tal decisão, em primeiro lugar, aos que revestem
cargos de responsabilidade nos sectores específicos da convivência em que tais
problemas ocorrem, sempre, contudo, de acordo com os princípios do direito
natural, com a doutrina social da Igreja e as directrizes da autoridade
eclesiástica. Pois ninguém deve esquecer que compete à Igreja o direito e o
dever não só de salvaguardar os princípios de ordem ética e religiosa, mas
ainda de intervir com autoridade junto de seus filhos na esfera da ordem
temporal, quando se trata de julgar da aplicação desses princípios aos casos concretos.
[4]
Progresso gradual
160.
Não faltam almas dotadas de particular generosidade que, ao enfrentar situações
pouco ou nada conformes com as exigências da justiça, se sentem arder no desejo
de tudo renovar, deixando-se arrebatar por tal ímpeto, que até parecem
propender para uma espécie de revolução.
161.
Lembrem-se, porém, de que, por necessidade vital, tudo cresce gradualmente.
Também nas instituições humanas nada se pode renovar, senão agindo de dentro,
passo por passo. Já o nosso predecessor, de feliz memória, Pio XII o proclamava
com estas palavras: "Não é na revolução que reside a salvação e a justiça,
mas sim na evolução bem orientada. A violência só e sempre destrói, nada
constrói; só excita paixões, nunca as aplaca; só acumula ódio e ruínas e não a
fraternidade e a reconciliação. A revolução sempre precipitou homens e partidos
na dura necessidade de terem que reconstruir lentamente, após dolorosos
transes, por sobre os escombros da discórdia". [5]
Tarefa imensa
162.
A todos os homens de boa vontade incumbe a imensa tarefa de restaurar as
relações de convivência humana na base da verdade, justiça, amor e liberdade:
as relações das pessoas entre si, as relações das pessoas com as suas
respectivas comunidades políticas, e as dessas comunidades entre si, bem como o
relacionamento de pessoas, famílias, organismos intermédios e comunidades
políticas com a comunidade mundial. Tarefa nobilíssima, a de realizar
verdadeira paz, segundo a ordem estabelecida por Deus.
163.
Bem poucos são na verdade, em comparação com a urgência da tarefa, os
beneméritos que se consagram a esta restauração da vida social conforme os
critérios aqui apontados. A eles chegue o nosso público apreço, o nosso férvido
convite a perseverarem em sua obra com renovado ardor. Conforta-nos ao mesmo
tempo a esperança de que a eles se aliem muitos outros, especialmente dentre os
cristãos. É um imperativo do dever, é uma exigência do amor. Cada cristão deve
ser na sociedade humana uma centelha de luz, um foco de amor, um fermento para toda
a massa. Tanto mais o será, quanto mais na intimidade de si mesmo viver unido
com Deus.
164.
Em última análise, só haverá paz na sociedade humana, se esse estiver presente
em cada um dos membros, se em cada um se instaurar a ordem querida por Deus.
Assim interroga Santo Agostinho ao homem: "Quer a tua alma vencer tuas
paixões? Submeta-se a quem está no alto e vencerá o que está em baixo. E haverá
paz em ti, paz verdadeira, segura, ordenadíssima. Qual é a ordem dessa paz?
Deus comandando a alma, a alma comandando o corpo. Nada mais ordenado". [6]
O Príncipe da paz
165.
Estas nossas palavras sobre questões que tanto preocupam actualmente a família
humana e cuja solução condiciona o progresso da sociedade, foram-nos inspiradas
pelo profundo anseio que sabemos ser comum a todos os homens de boa vontade: a consolidação
da paz na terra.
166.
Como representante – ainda que indigno – daquele que o anúncio profético chamou
o "Príncipe da Paz" (cf. Is 9,6), julgamos nosso dever
consagrar os nossos pensamentos, preocupações e energias à consolidação deste
bem comum. Mas a paz permanece palavra vazia de sentido, se não se funda na
ordem que, com confiante esperança, esboçamos nesta nossa carta encíclica:
ordem fundada na verdade, construída segundo a justiça, alimentada e consumada
na caridade, realizada sob os auspícios da liberdade.
167.
Este intento é tão nobre e elevado, que homem algum, embora louvavelmente
animado de toda boa vontade, o poderá levar a efeito só com as próprias forças.
Para que a sociedade humana seja espelho o mais fiel possível do Reino de Deus,
é grandemente necessário o auxílio do alto.
168.
É natural, pois, que nestes dias sagrados, elevemos suplicante prece a quem com
sua dolorosa paixão e morte venceu o pecado, factor de dissensões, misérias e
desequilíbrios, e no seu sangue reconciliou a humanidade com o Pai celeste,
trazendo à terra os dons da paz: "Porque ele é a nossa paz: de ambos os
povos fez um só... Veio e anunciou paz a vós que estáveis longe, e a paz aos
que estavam perto" (Ef 2,14-17).
169.
Nos ritos litúrgicos [7]
destes dias ressoa a mesma mensagem: nosso Senhor Jesus Cristo ressurgido, de
pé no meio dos seus discípulos, disse: "Deixo-vos a paz, a minha paz vos
dou; não vo-la dou como o mundo dá" (Jo 14,27).
170.
Esta paz, peçamo-la com ardentes preces ao Redentor divino que no-la trouxe.
Afaste ele dos corações dos homens quanto pode pôr em perigo a paz e os
transforme a todos em testemunhas da verdade, da justiça e do amor fraterno.
Ilumine com sua luz a mente dos responsáveis dos povos, para que, junto com o
justo bem-estar dos próprios concidadãos, lhes garantam o belíssimo dom da paz.
Inflame Cristo a vontade de todos os seres humanos para abaterem barreiras que
dividem, para corroborarem os vínculos da caridade mútua, para compreenderem os
outros, para perdoarem aos que tiverem injuriado. Sob a inspiração da sua
graça, tornem-se todos os povos irmãos e floresça neles e reine para sempre
essa tão suspirada paz.
171.
Em penhor desta paz e fazendo votos, veneráveis irmãos, para que ela se irradie
sobre as comunidades cristãs que vos estão confiadas e sirva de auxílio e
defesa especialmente dos mais humildes e necessitados, concedemos de coração a
bênção apostólica a vós, aos sacerdotes seculares e regulares, aos religiosos e
religiosas e aos fiéis das vossas dioceses, particularmente àqueles que se
esforçarão para pôr em prática estas nossas exortações. Enfim, para todos os
homens de boa vontade, a quem também se destina esta nossa encíclica,
imploramos de Deus Altíssimo saúde e prosperidade.
Dado em Roma, junto de São Pedro, na
Solenidade da Ceia de nosso Senhor, a 11 de Abril do ano de 1963, quinto do
nosso Pontificado.
JOÃO PP. XXIII
Nota:
Revisão da tradução portuguesa por ama
[1] Cf. Pio XII,
Discurso aos jovens da Ação Católica das dioceses da Itália reunidos em Roma,
no dia 12 de Setembro de 1948, AAS 40 (1948), p. 412.
[2] Cf. João XXIII,
Carta Encicl. Mater et Magistra, AAS 53 (1961), p. 454.
[3] Ibid., pp. 456.
[4] Ibid., pp. 456-457;
cf. Leão XIII, Carta Encicl. Immortale Dei, acta Leonis XIII, V,1885, p.128;
Pio XI, Carta Encicl. Ubi Arcano, AAS 14(1922), p. 698; Pio XII, Discurso às
Delegadas da União Internacional das mulheres católicas reunidas em Roma, no
dia 11 de Setembro de 1947, AAS 39(1947), p. 486.
[5] Cf. Discurso aos operários das dioceses da Itália
reunidos em Roma, na festa de Pentecostes, no dia 13 de Junho de 1943, AAS
35(1943), p.195.
[6] Miscellanea
Augustiniana... S. Augustini Sermones post Maurinos reperti, Roma 1930, p. 633.
[7] Responsório, nas
Mat. da VI féria dentro da oitava da Páscoa.
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