23/04/2012

Tratado dos Anjos 19

Questão 54: Do conhecimento angélico.

Art. 4 — Se no anjo há os intelectos agente e possível.

(II Cont. Gent., cap. XCVI)

O quarto discute-se assim. – Parece que no anjo há os intelectos agente e possível.

1. — Pois, o Filósofo diz que, assim como em toda a natureza há um princípio que é a causa de todas as coisas serem feitas, e outro que as faz a todas, assim também o mesmo se dá com a alma 1. Ora, o anjo é uma natureza de certa espécie. Logo, há nele os intelectos agente e possível.

2. Demais. — Receber é próprio do intelecto possível; iluminar, porém, é próprio do intelecto agente, como se vê em Aristóteles 2. Ora, um anjo recebe iluminação de outro que lhe é superior e ilumina o inferior. Logo, há nele os intelectos agente e possível.

Mas, em contrário, os intelectos agente e possível, em nós supõem relação com os fantasmas, que estão para o intelecto possível, como as cores para a visão; e, para o intelecto agente, como as cores para a luz, segundo se vê em Aristóteles 3. Ora, tal não se dá com o anjo. Logo, neste não há os intelectos agente e possível.

A necessidade de supor, em nós, um intelecto possível, foi porque, de facto, ora, inteligimos em potência e não em acto. Donde ser necessário existir uma virtude potencial em relação aos inteligíveis, antes do acto mesmo de inteligir mas que se atualize, em relação a eles, quando adquire a ciência e, depois, quando raciocina. E uma tal virtude se chama intelecto possível. Por outro lado, a necessidade de se supor um intelecto agente está em que as naturezas das coisas materiais, que nós inteligimos, não subsistem fora da alma como imateriais e inteligíveis em acto, mas são somente, como tais, inteligíveis em potência. Donde ser forçoso existir alguma virtude que torne tais naturezas inteligíveis em acto, e tal virtude, em nós, se chama intelecto agente.

Ora, ambas essas necessidades não existem nos anjos porque estes não são, nunca, inteligentes somente em potência, em relação às coisas que naturalmente inteligem; nem os inteligíveis deles são potenciais, mas atuais; pois, inteligem, primária e principalmente, as coisas imateriais, como a seguir se verá 4. E, portanto, não pode haver neles os intelectos agentes e possível, senão equivocamente.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — O Filósofo admite a existência desses dois princípios em todos os seres susceptíveis de geracção e vir-a-ser, como as suas próprias palavras o demonstram. Porém, nos anjos, a ciência não é gerada, mas existe naturalmente. Por isso não se lhes deve atribuir a agência e a possibilidade.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Ao intelecto agente é próprio o iluminar, não, por certo, outro ser inteligente, mas os inteligíveis, atualizando-os, pela abstracção. Porém, ao intelecto possível é próprio o ser potencial em relação aos cognoscíveis naturais; e, por vezes, atualizar-se. Donde, o facto de um anjo iluminar outro não pertence à essência do intelecto agente; nem à do intelecto possível pertence o de ser iluminado quanto aos mistérios sobrenaturais, em relação a cujo conhecimento esse intelecto está, por vezes, em potência. Se, contudo, alguém quiser chamar a tais factos intelectos agente e possível, fa-lo-á equivocamente; nem nos devemos importar com as denominações.

(Nota: Revisão da tradução para português por AMA)
S.TOMÁS DE AQUINO, Suma Teológica,

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Notas :
1. III De anima (lect. X).
2. III De anima (lect. VIII, X).
3. III De anima (lect. X, XII).
4. Q. 56.

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