12/12/2010

Pensar na Morte

PENSAR NA MORTE

Acontece que pensamos nos mortos, nos outros, mas talvez seja um exercício interessante pensarmos em nós, os que hoje ou num amanhã mais ou menos próximo, vão morrer. Porque é um facto, o único certo: vamos morrer!
O meu colega Eduardo Barroso, com a sua irreverência, define a vida como uma doença mortal, sexualmente transmissível. E tem razão.
O pensar na morte levanta dois problemas, senão mistérios. O primeiro é o da nossa finitude: desapareceremos completamente quando morrermos? Ou a morte é apenas um “mudar de casa”, em feliz expressão de São Josemaría Escrivá? Por mais que se façam afirmações públicas de que tudo acaba com a morte, a realidade é que cada homem, cada mulher, tem bem dentro de si o sentido da perenidade. Por alguma razão, os antropólogos consideram a existência do culto dos mortos nos seres primitivos como sinal da existência de cultura humana. Aquilo que a Fé cristã nos ensina acerca da imortalidade da alma humana, e da ressurreição, é algo que está já dentro de cada ser humano, como ânsia de perpetuidade.
O segundo mistério vem como consequência do primeiro: que há para além da morte? A resposta cristã resume-se em duas palavras: Céu ou Inferno.
 Mas o Inferno está em crise: como poderia um Deus misericordioso condenar pessoas à infelicidade eterna? A resposta é simples: imaginemos um pai bom, que ama o seu filho acima de tudo. Imaginemos que esse filho, consciente e livremente, odeia viver com o pai. Acharíamos bem que o pai o obrigasse a uma convivência odiosa para o filho? Claro que não.
 Pois isso é o Inferno. Se o Céu é estar eternamente junto de Deus, Deus não pode obrigar aqueles que o rejeitam a estar com Ele. Como bem disse João Paulo II, o Inferno é um estado, o estado de separação eterna do Deus que se rejeitou. Para falar com propriedade, Deus não condena ao Inferno; o homem é que escolhe o Inferno.
Acontece que o Inferno está em crise porque o Céu também o está. Imersos no materialismo prático, os homens e as mulheres de hoje têm dificuldade em apreciar os bens espirituais. Vêm o Céu como estar sentados eternamente numa nuvem a ouvir música celestial, e, de facto, isso seria uma seca eterna.
 Acontece que estar no Céu é ver Deus e Deus é a Suprema Beleza Infinita. A imagem mais correcta do Céu é a de uma pessoa estar em viagem permanente, engolfando-se de paisagem em paisagem, de belo em belo, sem repetição, sem monotonia, pois o seu espírito limitado nunca conseguirá esgotar a Beleza de Deus.
Claro que só pode ter esta visão do Céu quem o começa a usufruir na terra. A cada acção meritória, a cada sofrimento aceite à luz de Cristo, a cada serviço prestado ao próximo, corresponde um assomo de felicidade. E, na hora da morte, esses múltiplos assomos de felicidade explodem na felicidade infinita. Isto é de tal modo assim que podemos dizer que não alcançará a felicidade do Céu quem não aprendeu a ser feliz na terra. Mas esta aprendizagem exige esforço. Por isso, Marx não tinha razão: quem está entorpecido pelo ópio deste mundo, nunca alcançará o Céu. Pelo contrário, o Céu é dos violentos, e são os violentos – os que lutam para serem felizes – que o arrebatam, como nos ensinou Cristo.

 ( com os agradecimentos a Vítor Costa Lima)

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