Art.
3 — Se Cristo, no primeiro instante da sua concepção, podia merecer.
O terceiro discute-se assim. — Parece que
Cristo, no primeiro instante da sua concepção, não podia merecer.
1. — Pois, o livre arbítrio tanto é
principio de mérito como de demérito. Ora, o diabo, no primeiro instante da sua
criação não podia pecar, como se estabeleceu na Primeira Parte. Logo, nem a
alma de Cristo, no primeiro instante da sua criação, que foi o primeiro
instante da sua concepção, podia merecer.
2. Demais. — O que o homem tem, desde
o primeiro instante da sua concepção, é-lhe natural; pois, é o termo da sua
geração natural. Ora, nós não podemos merecer pelo que nos é natural, como se
colige do dito na Segunda Parte. Logo, o uso do livre arbítrio, que Cristo
teve, como homem, desde o primeiro instante da sua concepção, não era
meritório.
3. Demais. — O que uma vez o merecemos
já se tornou nosso de certo modo e assim, parece que não podemos de novo
merecê-la, pois, ninguém merece o que já tem. Se, pois, Cristo mereceu, no
primeiro instante da sua concepção, por consequência nada mais mereceu depois.
O que é evidentemente falso. Logo, Cristo não mereceu no primeiro instante da
sua concepção.
Mas, em contrário, diz Agostinho: Cristo não tinha absolutamente nada que
progredir, quanto ao mérito da sua alma. Ora, poderia progredir no mérito,
se não tivesse merecido no primeiro instante da sua concepção.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— O livre arbítrio não se comporta do mesmo modo em relação ao bem e ao mal.
Pois, aplica-se ao bem naturalmente e por si mesmo; mas só por deficiência e
contrariamente à sua natureza é que quer o mal. Ora, como diz o Filósofo, o oposto à natureza é posterior ao natural;
porque o oposto à natureza é um como corte feito no natural. Donde, o livre
arbítrio da criatura pode, no primeiro instante da sua criação, buscar o bem,
pelo mérito; não porém o mal, pelo pecado, dado que a natureza seja íntegra.
RESPOSTA À SEGUNDA. — O que o homem
tem no princípio da sua criação, conforme ao curso comum da natureza, é-lhe
natural. Nada porém impede uma criatura de receber, no princípio da sua
criação, um benefício da graça de Deus. E deste modo a alma de Cristo, no
princípio da sua criação, recebeu a graça pela qual pudesse merecer. E, por
essa razão, dessa graça, por uma certa semelhança, dizemos que foi natural ao
homem Cristo, como está claro em Agostinho.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Nada impede uma
mesma coisa pertencer a alguém por diferentes causas. E assim, Cristo podia
merecer a glória da imortalidade, que mereceu no primeiro instante da sua
concepção, também por actos e sofrimentos posteriores. Não, certamente, que
tivesse assim mais direitos a essa glória, mas por ela lhe ter sido devida a
vários títulos.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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